Eduardo M Fagundes

Tech & Energy Insights

Análises independentes sobre energia, tecnologias emergentes e modelos de negócios

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5G-Advanced, AI-RAN e Network Slicing: Sustentabilidade, Monetização e Geopolítica no Setor de Telecomunicações

Um panorama executivo sobre monetização, sustentabilidade e geopolítica digital

Sumário Executivo

O setor de telecomunicações em 2025 vive uma fase de consolidação com disrupção latente. Redes 4G e 5G já asseguram cobertura estável em boa parte do território, mas é o salto para o 5G-Advanced que redefine expectativas e pressiona operadoras, governos e reguladores a repensarem investimentos, modelos de negócio e políticas de longo prazo. Essa evolução não se limita a mais velocidade: ela inaugura um paradigma de redes programáveis, capazes de oferecer serviços sob medida para cada setor econômico.

O conceito de network slicing está no centro dessa transformação. Ao permitir a criação de “fatias” de rede virtuais, configuradas para atender requisitos específicos de latência, velocidade e confiabilidade, o slicing cria novos fluxos de receita. Já não se trata de vender dados como commodity, mas de comercializar serviços com garantia explícita de desempenho. Exemplos concretos demonstram o valor: na Indústria 4.0, uma fatia dedicada pode sustentar robôs em linhas de montagem automotiva; na Saúde, pode garantir conexões críticas para telecirurgias e monitoramento remoto de pacientes; no Agronegócio, pode integrar drones e sensores para irrigação e fertilização de precisão; em cidades inteligentes, pode conectar câmeras, semáforos e sensores de mobilidade em tempo real. Esse movimento reposiciona as operadoras, deslocando o setor da zona de comoditização para contratos premium e plurianuais.

Em paralelo, o AI-RAN emerge como ferramenta decisiva de sustentabilidade e eficiência. Estudos e casos práticos mostram reduções de 12% a 30% no consumo energético de redes móveis ao aplicar algoritmos que ajustam dinamicamente parâmetros de operação e desligam estações em horários de baixa demanda. Esse ganho não é apenas técnico: ele reduz OPEX, encurta o payback dos investimentos em infraestrutura e fortalece indicadores ESG, cada vez mais exigidos por investidores. Além disso, abre espaço para novos modelos de negócio, em que a própria eficiência energética pode ser oferecida como serviço para clientes corporativos.

No Brasil, a inclusão digital segue sendo um desafio estrutural, mas também uma oportunidade estratégica. O marco regulatório que exige a expansão do 5G para 30% dos municípios com até 30 mil habitantes até 2026 desloca para as operadoras regionais a liderança dessa agenda. Mais ágeis e próximas do cliente, essas empresas conseguem lançar pacotes híbridos de fibra e móvel, explorar nichos como o IoT no agronegócio e implantar soluções para cidades inteligentes de pequeno porte. Na prática, funcionam como laboratórios de inovação, testando modelos que depois podem ser escalados por grandes players ou replicados em políticas públicas.

O pano de fundo global é cada vez mais marcado pela geopolítica da conectividade. O debate sobre o 6G transcende tecnologia e torna-se questão de soberania digital e competitividade industrial. Países como a Índia já se posicionam como protagonistas nos fóruns de padronização, enquanto o Brasil precisa acelerar sua preparação para não se limitar ao papel de consumidor. Nesse cenário, o Open RAN desponta como vetor estratégico, ao permitir a diversificação de fornecedores, reduzir riscos de dependência tecnológica e criar espaço para o desenvolvimento de competências locais por meio de consórcios, parcerias com universidades e incentivos regulatórios.

Assim, o setor pode ser descrito como um campo de tensões produtivas: entre o legado e a inovação, entre custo e eficiência, entre cobertura nacional e geopolítica global. Para conselhos e executivos, a agenda de decisão é clara. O network slicing deve ser visto como mecanismo de monetização e diferenciação em setores críticos. O AI-RAN precisa ser incorporado como investimento de eficiência com impacto direto em ROI e ESG. As operadoras regionais devem ser apoiadas como catalisadoras de inclusão digital e inovação em escala local. E o país deve engajar-se ativamente em fóruns internacionais, aproveitando o Open RAN como base para construir soberania digital e protagonismo regional no 6G.

O futuro das telecomunicações será definido pela capacidade de alinhar robustez de infraestrutura, inteligência aplicada à eficiência e liderança estratégica em governança digital. As decisões tomadas hoje, nas salas de conselhos e nos comitês executivos, moldarão não apenas a competitividade das empresas, mas também o papel do Brasil no ecossistema global da conectividade.

Cenário Atual

O setor de telecomunicações entra em 2025 numa fase de consolidação com disrupção controlada. As redes 4G e 5G asseguram cobertura ampla e estabilidade de serviço, enquanto o salto para o 5G-Advanced reposiciona expectativas tecnológicas e exige novo ciclo de investimento em infraestrutura, algoritmos e modelos de negócio. A pauta operacional é clara: extrair eficiência em OPEX e CAPEX sem perder de vista a inclusão digital e as metas de sustentabilidade, compondo um equilíbrio fino entre crescimento e legitimidade social.  

No Brasil, a diretriz regulatória que determina cobertura de trinta por cento dos municípios até trinta mil habitantes por operadoras regionais até 2026 traz protagonismo às regionais e transforma a inclusão digital em oportunidade estratégica. A proximidade com o cliente final, a capilaridade em mercados menores e a agilidade para combinar fibra e acesso móvel permitem a essas empresas atender territórios historicamente subatendidos, testando pacotes integrados e soluções verticais com velocidade superior à das grandes operadoras.  

A equação financeira segue pressionada. As referências globais de mercado indicam crescimento de receita aquém das necessidades de modernização, o que exige reprecificar valor e alongar contratos. O network slicing desponta como instrumento de monetização baseado em desempenho garantido: em vez de vender “gigabytes”, a operadora comercializa uma fatia com SLA explícito de latência, disponibilidade e segurança. Na prática, esse modelo viabiliza ofertas premium em verticais críticas. Na Indústria 4.0, uma fatia dedicada sustenta células robóticas com latência ultrabaixa e estabilidade determinística; na Saúde, viabiliza telecirurgia e monitoramento remoto com qualidade clínica; no Agronegócio, conecta drones e sensores de grandes lavouras, otimizando irrigação, insumos e logística. Essa migração de “dados” para “serviços com garantia de desempenho” reabre espaço para pricing por valor e contratos plurianuais com governos e grandes contas.  

A sustentabilidade deixa de ser apêndice e entra no core econômico. A aplicação de IA no RAN (AI-RAN) já demonstra resultados de dois dígitos em eficiência energética e otimização de tráfego, com reduções reportadas por líderes do setor entre aproximadamente 12% e 30%, conforme cenário e localidade. Esses ganhos melhoram o perfil de OPEX, encurtam o payback de upgrades e tangibilizam o componente “E” do ESG com métricas auditáveis, conectando performance financeira, descarbonização e reputação corporativa.  

No plano internacional, o debate do 6G assume contornos decisórios. Países como a Índia se posicionam para influenciar padrões e governança, reforçando que a definição tecnológica é, também, alavanca de poder econômico e soberania digital. Para o Brasil, a preparação agora — com adoção progressiva do 5G-Advanced, roadmaps claros de slicing e AI-RAN, e testes de arquiteturas abertas — determinará sua inserção nas cadeias tecnológicas da próxima década. Nesse contexto, Open RAN emerge como vetor de resiliência e diversificação. A trajetória brasileira exigirá superar desafios de interoperabilidade, desenvolver competências locais e estruturar consórcios entre operadoras, universidades e startups, combinando incentivos regulatórios e financiamento para acelerar um ecossistema que reduza dependências e habilite exportação regional de soluções.  

Em síntese, o cenário é um campo de tensões produtivas: legado versus inovação, custo versus eficiência, cobertura nacional versus geopolítica global. Liderar exigirá conciliar infraestrutura robusta com modelos de negócio orientados a SLA e eficiência energética, além de uma estratégia industrial que una diversificação tecnológica, formação de capacidades e inserção ativa em fóruns de padronização. Quem fizer esse blend — operadoras, fornecedores e formuladores de política pública — definirá a curva de valor das telecomunicações na próxima década.  

Referencial Teórico e Tecnológico

5G-Advanced e Network Slicing

O avanço do 5G-Advanced, ou 5.5G, estabelece um novo patamar de conectividade no qual a latência ultrabaixa, a geolocalização de alta precisão e a integração de redes não-terrestres (NTN) — incluindo satélites e drones — permitem construir uma arquitetura de rede mais abrangente e resiliente. Conforme destacam Bikkasani e Yerabolu (2024), essa evolução não se resume a ganhos incrementais de velocidade ou cobertura, mas inaugura um paradigma de redes programáveis, em que cada aplicação pode ser atendida por parâmetros específicos de desempenho, transformando a rede em um ativo de valor estratégico.

Nesse contexto, o network slicing assume papel central. Trata-se da criação de “fatias” virtuais independentes da rede, com características customizadas de latência, velocidade e confiabilidade, alocadas de acordo com as necessidades de cada setor. Estudos como os de Phyu et al. (2023) demonstram que, ao aplicar algoritmos de aprendizado de máquina para ativar e desativar fatias conforme a demanda, é possível alcançar ganhos superiores a 10% em eficiência energética, mantendo a qualidade de serviço. Mas o impacto vai além da eficiência técnica: o slicing abre espaço para monetização diferenciada e contratos de longo prazo baseados em valor agregado.

Os casos de uso são claros e cada vez mais tangíveis. Na Indústria 4.0, uma fatia dedicada garante latência ultrabaixa e estabilidade determinística necessárias para o controle de robôs em linhas de montagem, reduzindo falhas e elevando a produtividade. No setor da Saúde, o slicing pode assegurar conexões de alta confiabilidade para telecirurgias, diagnósticos remotos e monitoramento contínuo de pacientes, em que interrupções mínimas são inaceitáveis. No Agronegócio, fatias específicas podem ser contratadas por cooperativas e grandes produtores para monitorar drones e sensores em lavouras extensas, otimizando irrigação, aplicação de insumos e logística. E nas cidades inteligentes, uma rede dedicada pode integrar câmeras, semáforos e sensores de mobilidade, viabilizando soluções de trânsito dinâmico e gestão urbana em tempo real.

Esse conjunto de aplicações redefine a lógica de receita do setor. O que antes se restringia à venda de “pacotes de dados” generalistas evolui para a comercialização de serviços com garantia explícita de desempenho (SLA), abrindo espaço para tarifas premium, maior fidelização e contratos plurianuais com governos e grandes clientes corporativos. Esse modelo contribui diretamente para aliviar a pressão financeira das operadoras, uma vez que desloca a oferta da zona de comoditização e possibilita capturar margens mais altas em setores críticos.

Assim, o 5G-Advanced e o network slicing não devem ser compreendidos apenas como uma evolução técnica, mas como um realinhamento estratégico do setor de telecomunicações. A rede deixa de ser vista como infraestrutura passiva e passa a ser entendida como plataforma de negócios, capaz de habilitar a digitalização de setores-chave da economia e de gerar novos fluxos de receita para as operadoras.

AI-RAN e Sustentabilidade

O Radio Access Network (RAN) é tradicionalmente responsável por parcela significativa do consumo energético nas telecomunicações, chegando a representar mais de 70% da energia total utilizada pelas operadoras em alguns mercados. Esse perfil de gasto transformou o RAN em alvo prioritário para políticas de sustentabilidade e para estratégias de redução de custos operacionais. Nesse contexto, a aplicação de inteligência artificial ao RAN (AI-RAN) não deve ser vista apenas como inovação incremental, mas como um divisor de águas. Ghag (2023) enfatiza que algoritmos de IA podem prever padrões de tráfego, ajustar dinamicamente parâmetros de operação e até mesmo desligar ou reconfigurar elementos da rede em horários de baixa demanda, sem comprometer a qualidade do serviço.

Os estudos de caso corroboram essa visão. A Ericsson reportou reduções anuais médias de aproximadamente 12% no consumo energético ao empregar sistemas de recomendação automatizados em estações rádio-base. A Samsung apresentou em 2024 a solução AI-ESM (Energy Saving Management), capaz de operar em nível de site de célula e entregar ganhos diários de eficiência entre 15% e 20%. A Vodafone, em testes realizados em localidades da Europa, alcançou reduções pontuais de até 30% em horários de baixo tráfego, provando que os benefícios podem escalar de acordo com o perfil de uso.

Além dos ganhos de eficiência, o AI-RAN contribui de maneira direta para a equação financeira das operadoras. As reduções de dois dígitos no consumo energético têm impacto imediato no OPEX, diminuindo a pressão sobre margens em um setor marcado por crescimento de receita modesto. Quando quantificados, esses ganhos podem encurtar de forma relevante o payback dos investimentos em modernização de rede, aproximando o retorno sobre o capital aplicado em infraestrutura de níveis aceitáveis para conselhos de administração e investidores institucionais. Em outras palavras, o AI-RAN atua como ponte entre inovação tecnológica e rentabilidade, ajudando a fechar a lacuna entre os elevados aportes de CAPEX e a estagnação do faturamento médio por usuário.

A discussão também se conecta a padrões e normativas internacionais. Kundu et al. (2024) destacam que a integração do AI-RAN com as especificações do 3GPP e as iniciativas da O-RAN Alliance cria uma arquitetura mais aberta, interoperável e resiliente. Essa evolução favorece não apenas a redução de custos, mas também a mitigação de riscos de dependência excessiva de fornecedores únicos, um tema que cruza sustentabilidade tecnológica com soberania digital.

Do ponto de vista estratégico, o AI-RAN assume papel duplo. Por um lado, reduz a pegada ambiental das operadoras, tornando-as mais competitivas em métricas ESG e mais atrativas para investidores globais cada vez mais atentos à sustentabilidade. Por outro, habilita a criação de novas ofertas comerciais: operadoras podem, por exemplo, oferecer slicing energético como serviço para clientes corporativos, cobrando pela otimização dinâmica de consumo em redes privadas ou em contratos de conectividade de missão crítica. Essa monetização transforma a eficiência interna em ativo de mercado, ampliando o portfólio de serviços e criando diferenciais competitivos tangíveis.

Em síntese, o AI-RAN não é apenas uma ferramenta de eficiência, mas uma plataforma estratégica que conecta tecnologia, finanças e governança. Ele materializa a possibilidade de redes mais inteligentes, sustentáveis e lucrativas, ao mesmo tempo em que posiciona as operadoras de telecomunicações no centro da agenda de inovação e responsabilidade socioambiental.

Inclusão Digital e Operadoras Regionais

A inclusão digital permanece como um dos desafios estruturais mais relevantes para o setor de telecomunicações. No Brasil, a regulação vigente estabelece que as operadoras regionais expandam o 5G para ao menos 30% dos municípios com até 30 mil habitantes até 2026. Essa diretriz desloca para as regionais a responsabilidade — e a oportunidade — de avançar sobre territórios onde os grandes players historicamente não direcionaram investimentos por conta da baixa atratividade econômica.

Essas empresas diferenciam-se pela proximidade com o cliente e pela capacidade de adaptação a mercados menores. Elas conseguem oferecer soluções customizadas que integram serviços de fibra óptica de alta velocidade, conectividade móvel e aplicações digitais de nicho. Enquanto as grandes corporações operam em lógica de escala, com estruturas pesadas e processos de decisão lentos, as regionais atuam com maior agilidade, lançando pacotes integrados e explorando setores verticais. No agronegócio, por exemplo, podem disponibilizar serviços de IoT para monitorar lavouras, irrigação e drones de pulverização. Em cidades inteligentes de pequeno porte, podem conectar sensores de iluminação, segurança pública e mobilidade, entregando soluções que unem infraestrutura e gestão urbana.

Esse movimento representa uma disrupção silenciosa no setor. Ao invés de competir apenas em preço, as operadoras regionais inovam no modelo de negócio, combinando telecomunicações com soluções digitais complementares — desde conectividade em escolas e hospitais até plataformas de gestão agrícola. Em muitos casos, oferecem pacotes híbridos que unem conectividade de última milha com serviços digitais de nuvem ou segurança cibernética adaptados ao perfil local. Isso cria vínculos mais fortes com a comunidade atendida, ampliando a fidelização e reduzindo a vulnerabilidade a pressões competitivas de grandes operadoras.

Do ponto de vista estratégico, essa dinâmica sugere que as regionais funcionam como laboratórios vivos de inovação, onde novos modelos podem ser testados com menor risco regulatório e menor exposição financeira. Muitas vezes, práticas bem-sucedidas nessas localidades servem de referência para políticas públicas ou até para posterior adoção em escala pelas grandes operadoras. Assim, as regionais tornam-se atores-chave na construção de um ecossistema digital inclusivo, que conecta a visão tradicional de infraestrutura robusta com a ousadia visionária de uma economia de proximidade e serviços sob medida.

Em síntese, a inclusão digital promovida pelas operadoras regionais não deve ser vista apenas como cumprimento de uma obrigação regulatória, mas como vetor estratégico de transformação. Ela abre espaço para inovação em modelos híbridos de negócio, acelera a digitalização em áreas rurais e urbanas de pequeno porte e posiciona o Brasil de maneira mais equilibrada no mapa da conectividade global.

Geopolítica do 6G e Papel do Brasil

Embora ainda em estágio inicial, o 6G já começa a ser delineado em fóruns de padronização, e sua dimensão geopolítica é evidente. A Índia, por exemplo, consolidou-se como ator relevante na definição de normas e regulamentos internacionais, aproveitando sua base industrial e seu capital humano em tecnologia para influenciar o debate global.

O Brasil encontra aqui uma oportunidade estratégica. A adoção precoce do 5G-Advanced e a preparação para o 6G podem posicionar o país como polo regional de inovação em telecomunicações, particularmente em áreas de relevância local como cobertura em florestas, monitoramento do agronegócio e soluções urbanas inteligentes. Essa experiência pode ser exportada para outros países da América Latina, elevando a influência brasileira em fóruns multilaterais.

Outro aspecto central é a segurança e soberania digital. A dependência excessiva de um único fornecedor de equipamentos pode expor vulnerabilidades críticas. A adoção de padrões abertos, como o Open RAN, e a diversificação de fornecedores são medidas estratégicas para mitigar riscos e assegurar maior controle nacional sobre a infraestrutura crítica de telecomunicações. Trata-se, portanto, de combinar a tradição de regulação firme com uma visão inovadora de segurança cibernética e independência tecnológica.

Agenda de Decisão e Recomendações

A transformação em curso no setor de telecomunicações não se limita a aspectos técnicos, mas se manifesta como uma agenda estratégica que impacta diretamente competitividade, sustentabilidade e soberania digital. O avanço do 5G-Advanced, o uso intensivo de inteligência artificial no RAN e a possibilidade de monetização via network slicing criam um ambiente em que operadoras, reguladores e governos precisam alinhar investimentos a uma visão de longo prazo.

Nesse contexto, o papel do Brasil ganha relevância. O país encontra-se em posição única: de um lado, deve garantir a inclusão digital em centenas de municípios menores, onde as operadoras regionais assumem protagonismo; de outro, precisa preparar sua infraestrutura para não apenas adotar, mas influenciar o debate sobre o 6G. Isso exige uma dupla capacidade estratégica: preservar a robustez da infraestrutura herdada e, simultaneamente, construir novos modelos de negócio baseados em inovação, IA e governança ambiental.

Para conselhos e alta gestão, o desafio está em separar o que é moda tecnológica do que constitui vetor real de vantagem competitiva. O 5G-Advanced com slicing dedicado, o AI-RAN aplicado à eficiência energética e a diversificação de fornecedores via Open RAN são exemplos claros de vetores que já oferecem resultados tangíveis. Por outro lado, a inércia das grandes operadoras, a concentração de fornecedores e os riscos geopolíticos podem comprometer a trajetória de longo prazo.

A seguir, apresenta-se uma análise SWOT executiva, que sintetiza forças, fraquezas, oportunidades e ameaças do atual panorama, servindo como guia para decisões de alto nível.

Quadro – Análise SWOT do Setor de Telecomunicações (2025)

ForçasFraquezas
• Expansão do 5G-Advanced com capacidades de baixa latência e NTN.• Dependência de altos níveis de CAPEX em um mercado de crescimento modesto.
• Potencial do network slicing como modelo de monetização diferenciada.• Inércia organizacional das grandes operadoras, com baixa velocidade de adaptação.
• AI-RAN comprovadamente reduz custos energéticos e apoia metas ESG.• Fragmentação regulatória e dificuldade em alinhar padrões nacionais ao ritmo global.
• Operadoras regionais ágeis, próximas ao cliente e com flexibilidade.• Escassez de mão de obra especializada em IA aplicada a telecomunicações.
OportunidadesAmeaças
• Liderança regional do Brasil em soluções para agronegócio, florestas e smart cities.• Concentração de fornecedores internacionais, gerando riscos de dependência estratégica.
• Exploração de network slicing para indústrias, jogos e cidades inteligentes.• Risco geopolítico no 6G, com disputa de padrões tecnológicos entre blocos globais.
• Uso de AI-RAN como diferencial competitivo, reduzindo custos e agregando valor ESG.• Ameaça de comoditização dos serviços, pressionando margens de lucro.
• Diversificação com Open RAN, ampliando soberania digital.• Velocidade da Índia e de outros países em influenciar padrões internacionais.

Recomendações Estratégicas

A partir da análise, emergem recomendações que devem nortear a agenda dos conselhos e da alta gestão:

  • Para Conselhos de Administração: incorporar soberania digital e diversificação de fornecedores como pauta prioritária. Avaliar a viabilidade de parcerias em Open RAN e exigir métricas claras de sustentabilidade ligadas ao desempenho financeiro.
  • Para Altos Executivos: estruturar estratégias de monetização do 5G-Advanced por meio de slicing, explorando setores verticais que demandam conectividade crítica. Alocar capital em projetos de AI-RAN, entendendo-os como investimentos que equilibram inovação tecnológica e ROI.
  • Para Especialistas e Gestores de Inovação: engajar ativamente em fóruns de padronização global e fomentar a formação de competências nacionais em IA aplicada a redes. Atuar como catalisadores de consórcios que unam operadoras regionais, universidades e startups, acelerando a criação de soluções adaptadas à realidade brasileira.

Conclusão Estratégica

O setor de telecomunicações encontra-se em uma encruzilhada em 2025. O avanço do 5G-Advanced, o uso de inteligência artificial no RAN e a capacidade de monetização do network slicing não são mais apostas de futuro, mas realidades que começam a remodelar fluxos de receita, estruturas de custos e a própria lógica de competição. Ao mesmo tempo, a discussão global em torno do 6G e a emergência de padrões abertos como o Open RAN adicionam uma dimensão geopolítica que vai muito além da engenharia de redes, influenciando soberania digital e autonomia estratégica dos países.

Para o Brasil, esse cenário é uma oportunidade e um risco em igual medida. A obrigação regulatória de levar conectividade a municípios de pequeno porte pode se tornar um motor de inovação se as operadoras regionais forem reconhecidas como parceiras estratégicas no desenho de novos modelos de negócio. Essas empresas, mais ágeis e próximas do cliente, já demonstram capacidade de transformar inclusão digital em vantagem competitiva, atuando como laboratórios de soluções que depois podem escalar para o restante do setor.

Do lado financeiro, a pressão é inescapável. O crescimento modesto da receita no setor contrasta com a necessidade contínua de investimentos em infraestrutura. Nesse ponto, a equação só fecha se a inovação tecnológica for convertida em valor econômico tangível. O network slicing deve ser entendido como alavanca para contratos premium de longo prazo em setores verticais, e o AI-RAN, como ferramenta direta de melhoria do ROI e de encurtamento do payback dos aportes em rede. Ambos são vetores estratégicos que podem mitigar a lacuna entre CAPEX elevado e receita estagnada.

No plano internacional, a posição do Brasil dependerá de escolhas feitas agora. A adoção progressiva do Open RAN, o engajamento em fóruns de padronização do 6G e a construção de parcerias entre operadoras, universidades e startups podem transformar o país de mero consumidor de tecnologia em protagonista regional de inovação. Esse movimento exige visão de Estado, mas também liderança empresarial capaz de articular interesses privados e públicos em torno de uma agenda comum.

Em síntese, a próxima década das telecomunicações será definida pela capacidade de conciliar três dimensões: robustez de infraestrutura, inteligência orientada a eficiência e soberania digital. Para conselhos, executivos e reguladores, o recado é claro: decisões tomadas hoje sobre investimentos, modelos de negócio e alianças internacionais moldarão não apenas a competitividade das empresas, mas também o papel do Brasil no ecossistema global de conectividade. O tempo de esperar passou; o momento de agir é agora.

Referências

BIKKASANI, Dileesh Chandra; YERABOLU, Malleswar Reddy. AI-Driven 5G Network Optimization: A Comprehensive Review of Resource Allocation, Traffic Management, and Dynamic Network Slicing. American Journal of Artificial Intelligence, v. 8, n. 2, 2024. DOI: 10.11648/j.ajai.20240802.14.

PHYU, Hnin Pann; et al. Towards Energy Efficiency in RAN Network Slicing. arXiv preprint, 2023. Disponível em: https://arxiv.org/abs/2307.07016. Acesso em: 22 ago. 2025.

GHAG, Omkar Manohar. Artificial Intelligence and Energy Efficiency of 5G Radio Access Network. ResearchGate preprint, 2023. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/377012518_Artificial_Intelligence_and_Energy_Efficiency_of_5G_Radio_Access_Network. Acesso em: 22 ago. 2025.

KUNDU, Lopamudra; et al. Towards Energy Efficient RAN: From Industry Standards to Trending Practice. arXiv preprint, 2024. Disponível em: https://arxiv.org/abs/2402.11993. Acesso em: 22 ago. 2025.

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MDPI. A Survey on Green Enablers: A Study on the Energy Efficiency of AI in 5G Networks. Sensors, v. 24, n. 14, p. 4609, 2023. Disponível em: https://www.mdpi.com/1424-8220/24/14/4609. Acesso em: 22 ago. 2025.

ERICSSON. AI-powered RAN energy efficiency. Ericsson Blog, 2023. Disponível em: https://www.ericsson.com/en/blog/2023/1/ai-powered-ran-energy-efficiency. Acesso em: 22 ago. 2025.

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IDC. IDC Forecasts Telecom Services Revenue in Europe to Top $300 Billion in 2025. IDC Press Release, 2025. Disponível em: https://my.idc.com/getdoc.jsp?containerId=prEUR253369525. Acesso em: 22 ago. 2025.

PwC. Perspectives from the Global Telecom Outlook 2024–2028. PricewaterhouseCoopers, 2024. Disponível em: https://www.pwc.com/gx/en/industries/tmt/assets/pwc-perspectives-from-the-global-telecom-outlook-2024-2028.pdf. Acesso em: 22 ago. 2025.

3GPP. Release 18 and 19 Specifications for 5G-Advanced. 3rd Generation Partnership Project, 2024. Disponível em: https://www.3gpp.org. Acesso em: 22 ago. 2025.

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