Eduardo M Fagundes

Artigos

Coletânea de artigos técnicos e reflexões de Eduardo M. Fagundes publicados entre 2011 e 2017

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Tag: smart grid

  • As cidades inteligentes exigem novos modelos de gestão municipal

    Um fenômeno global é a baixa confiança dos cidadãos com seus governos e as finanças públicas sob stress.  Isso resulta em um abismo entre as expectativas dos cidadãos e a capacidade dos governos de identificar e implementar programas para a população. Reforço que o problema atinge vários países, incluindo os Estados Unidos e vários países europeus. No Brasil, esse abismo pode ser maior devido as nossas características culturais e corrupção. Muitos buscam uma resposta dos governos federais, porém a solução está mais próxima do que se pensa, nas prefeituras. Entretanto, os prefeitos devem transformar o modelo tradicional de gestão para atender as novas expectativas dos cidadãos que exigem mais transparência do governo, mobilidade, segurança, saúde, educação e lazer, resultando em melhor qualidade de vida para as pessoas. A proposta é transformar os governos municipais em facilitadores em vez de provedores de soluções, transformando as cidades tradicionais em cidades inteligentes.

    Ainda discutimos se os governos devem assumir o comando da infraestrutura e dos serviços ou se devem deixar para a iniciativa privada ou se os próprios cidadãos devem assumir o controle. Parece que a crise econômica e o baixo crescimento das economias estão forçando uma profunda revisão dos modelos de gestão do governo. Os governos municipais são os mais afetados, pois são eles que interagem diretamente com os cidadãos.

    Mesmo em mundo ideal sem corrupção, as finanças públicas não conseguirão atender as expectativas crescentes dos cidadãos. A solução é os governos assumirem o papel de facilitadores na criação de plataformas de serviços e tecnológicas para serem exploradas pela iniciativa privada. A demora na adoção desse novo modelo de gestão pública traz prejuízos para os cidadãos, empresas e governo.

    Um exemplo é a falta de atuação dos governos municipais na estratégia de redes inteligentes de energia elétrica, o chamado Smart Grid. No Brasil, o modelo de concessões na distribuição de energia permite que as concessionárias definam a tecnologia da infraestrutura de telecomunicações. Desta forma, cada empresa está criando uma infraestrutura própria sem planos de compartilhamento com outros serviços.

    Por outro lado, muitos municípios estão implantando projetos de Internet para escolas, bibliotecas, prédios públicos e para os cidadãos, criando plataformas de telecomunicações próprias. Uma alternativa seria que a prefeitura assumisse o papel de facilitador e definisse uma plataforma comum de telecomunicações para compartilhar com todos os serviços, oferecendo esses serviços para as concessionárias de energia, água e gás. Isso permitiria que os investimentos redundantes fossem canalizados para outros projetos para os cidadãos, além de gerar receita adicional aos cofres municipais.

    Poderíamos pensar que o papel de definir esse modelo de compartilhamento de telecomunicações, no nosso exemplo, seria das agências reguladoras, ANATEL e ANEEL, ou das agências estaduais, no caso de São Paulo, a ARSESP, Agência Reguladora de Saneamento e Energia do Estado de São Paulo. Infelizmente, essas agências estão, provavelmente, com desafios maiores e sem tempo para se dedicar ao assunto. Entretanto, essa falta de definição afeta, diretamente, as prefeituras em suas estratégias de cidades inteligentes.

    Resumindo, acredito que os prefeitos e as câmaras municipais deveriam assumir seu papel de liderança e defesa dos interesses dos cidadãos e definir suas políticas e projetos para transformar suas cidades em cidades inteligentes, transformando o modelo de provedor de serviços para um modelo de facilitador de serviços.

  • Medição inteligente multisserviços de energia, água e gás

    Precisamos adotar novos conceitos de gestão para viabilizar o crescimento da economia brasileira. Continuar usando modelos de gestão e regulamentação de mercado criados no passado já não atendem mais aos desafios dos complexos modelos de negócios globais. A crise energética e hídrica que estamos atravessando deve ser o gatilho para uma profunda revisão dos modelos de negócios e normas regulatórias.

    No setor elétrico, os desafios são aumentar a capacidade de geração de energia, diversificar a matriz energética e adotar medidas para o controle da demanda. O aumento da capacidade de geração e diversificação da matriz energética exige planejamento, capital intensivo, avaliação de impactos ambientais e capacidade de execução. O controle da demanda exige a adoção de equipamentos mais eficientes, conscientização dos consumidores e uma tecnologia de medição inteligente (smart metering). O crescimento da autoprodução de energia pelos consumidores e seu acoplamento nas redes de distribuição de energia adicionará uma maior complexidade na medição. Neste contexto, devemos incluir o uso de gás natural na geração de energia e a substituição alguns equipamentos que utilizam eletricidade e nos meios de transporte.

    No abastecimento de água, os desafios são aumentar os reservatórios que abastecem as cidades, ampliar a capacidade de tratamento de água, aumentar o reuso e evitar o desperdício de água. As ações necessárias são análogas ao do setor elétrico, incluindo a melhoria do controle da demanda.

    A solução é adoção em larga escala de redes inteligentes no setor elétrico e sistemas de monitoração e controles mais inteligentes na distribuição de gás e água.

    Apesar dos enormes benefícios das redes inteligentes (Smart Grid), tanto para os usuários como para as concessionárias, os projetos avançam de forma tímida. Os medidores analógicos de energia não permitem a gestão da demanda pelos usuários e exigem a presença física do pessoal das concessionárias para cortes e religações. Os métodos analógicos de medição de consumo de água não são precisos e a falta de gestão remota dificulta o ajuste da pressão nas tubulações, podendo gerar rompimento dos tubos ou falta de água para os consumidores. A falta de inteligência dos pontos de consumo de gás podem resultar em risco de vida e aumenta o custo de manutenção do serviço.

    Os altos custos de implantação e o tempo de retorno dos investidores inibem o avanço rápido dos projetos de redes inteligentes. Como o mercado de energia, água e gás são regulados, onde as agências reguladoras monitoram investimentos e despesas para definir as tarifas dos serviços, os projetos, na maioria das vezes, não se viabilizam.

    Uma solução seria a adoção do conceito de multi-utilities, ou seja, um fornecedor passaria a oferecer vários serviços (energia, gás, água, etc.), obtendo sinergia na utilização de equipamentos, sistemas de monitoração e controle, e pessoal.

    Infelizmente, o modelo de concessões adotado no Brasil não permite que uma concessionária opere mais de um serviço.

    Entretanto, nada impede que várias concessionárias adotem uma infraestrutura única de medição de energia, água e gás – smart metering.  O resultado seria a melhoria dos serviços aos usuários, redução de custos de implantação e operação da infraestrutura de monitoração e controle e a viabilização de projetos de redes inteligentes.

    Os benefícios do smart metering através de uma empresa de serviços são muitos:

    • Automação da medição de vários serviços;
    • Aumento de receita das concessionárias pela melhoria da medição;
    • Aumento da satisfação dos usuários;
    • Aumento da receita das concessionárias pela introdução de novos serviços inteligentes;
    • Substituição de investimentos (CAPEX) por despesas (OPEX);
    • Comando remoto para corte e religa sem a necessidade de equipes de campo;
    • Integração dos serviços de medição com os sistemas de informação das concessionárias;
    • Possibilidade de regionalização dos serviços de medição de uma mesma concessionária, reduzindo os riscos de grandes e complexos sistemas e investimentos;
    • Descentralização dos investimentos (CAPEX) entre vários fornecedores de serviço de medição para aquisição de equipamentos e sistemas, mitigando o risco de um único fornecedor;
    • Compartilhamento da infraestrutura de medição (equipamentos de multi-medição, redes de comunicações, sistemas de informação, pessoal técnicos, etc.) com vários serviços;
    • Redução de custo dos serviços de medição devido ao compartilhamento da infraestrutura;
    • Abertura de oportunidades para pequenos fornecedores de serviços de medição em regiões de pequena densidade populacional;
    • Aceleração do desenvolvimento do mercado de equipamentos, software e consultoria de Smart Grid;
    • Criação de novos empregos especializados;
    • Redução da quantidade de chamadas nos serviços de atendimento ao consumidor;
    • Aumento de oportunidades de negócios para os fornecedores de serviços pela possibilidade de regionalização dos serviços;

    Um modelo de negócios de medição multisserviços é viável. Participei ativamente no projeto da ANFAVEA, Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores, na implantação do EDI (Electronic Data Exchange) para fornecedores, envolvendo a colaboração de todas as montadoras do país. Em 2000, estive envolvido nas operações da Covisint, uma empresa de B2B criada pela Ford Motor Co., General Motors, e DaimlerChrysler, para comprar em conjunto autopeças no mercado americano e internacional. A criação da Covisint teve o desafio de reunir fortes concorrentes do setor automobilístico, entretanto, se viabilizou pela necessidade de redução de custos para enfrentar a competição internacional.

    O desafio da Covisint não se aplica as concessionárias no Brasil, pois o regime de concessão garante a reserva de mercado. A questão é quem começa. Existe pouca interação entre as atuais concessionárias de serviços. A relação mais próxima é como fornecedor e usuário entre eles ou, em poucos casos, em projetos municipais que exigem a coordenação de obras de várias concessionárias.

    Uma opção é o governo tomar a iniciativa de convidar as concessionárias para uma discussão sobre o modelo de negócio e criar condições para viabilizar o negócio. Ou, as próprias concessionárias tomarem a iniciativa. Ou ainda, um grande fornecedor se estruturar para oferecer o serviço. Essa última opção, talvez seja a mais fácil, pois existem empresas multinacionais que já executam serviços similares em outros países.

    Coloco a disposição um fórum virtual de discussão no Efagundes.com para ampliar essa discussão e buscar formas de viabilizar essa iniciativa.