Eduardo M Fagundes

Tech & Energy Insights

Análises independentes sobre energia, tecnologias emergentes e modelos de negócios

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Quando a IA Parar de Viajar: Microdatacenters, Energia Local e o Início do Fim dos Megadatacenters como Padrão Dominante


Dois homens, um objeto e um sorriso contido.

À primeira vista, é apenas uma foto: Jensen Huang, CEO da NVIDIA, entrega uma pequena unidade DGX Spark nas mãos de Elon Musk. Nada espetacular. Apenas uma caixa preta do tamanho de um livro, sendo passada como se fosse um brinde corporativo.

Mas talvez essa imagem marque o início do colapso silencioso do modelo de datacenters de IA que hoje domina o planejamento energético e digital do mundo.

Durante anos, conselhos, agências e white papers — incluindo o White Paper da ANATEL 2025, que projeta bilhões em reforço de transmissão e energia para grandes polos de datacenters — repetiram a mesma lógica: “mais IA = mais megadatacenters = mais demanda concentrada de energia centralizada”.

Mas e se essa equação estiver prestes a se inverter?

E se a IA parar de viajar até os grandes centros de dados e começar a ser processada onde a energia nasce?


A ruptura silenciosa: quando o dado para de viajar e a inteligência se move para a borda

O DGX Spark é mais que um hardware. Ele é um sinal geopolítico e energético.

Com cerca de 0,8 kW de consumo contínuo, duas unidades consomem 1,6 kW — o equivalente a um micro-ondas ligado 24 horas. E ainda assim, conseguem processar até 400 bilhões de parâmetros de IA localmente, sem depender de datacenters de 50 MW refrigerados por torres industriais.

Com 1,6 kW, já é possível executar modelos de IA maiores que o GPT-3 original — sem nuvem e sem fibra óptica de longa distância.


Tabela 1 – Consumo de Energia vs Capacidade de Inteligência

InfraestruturaEnergia ConsumidaCapacidade de IAInfraestrutura Necessária
2 DGX Spark (Edge IA)1,6 kW (~38 kWh/dia)~400 bilhões de parâmetrosTomada industrial + PPA Solar local
Rack A100 em Datacenter40 kW (~960 kWh/dia)~500 bilhões de parâmetrosDatacenter, HVAC, subestação, fibra dedicada
Hiperscaler (100 MW)100.000 kW (~2,4 GWh/dia)1000+ GPUs, exaescala FP32/FP16Cluster industrial, linhas de transmissão, equipes 24/7

Microgrids + IA: um ExaOPS cabe dentro de uma usina solar de 5 MWp

Agora, troquemos a escala.

Imagine uma usina solar de 5 MWp com BESS — algo modesto no contexto do Brasil, onde projetos GD e autoprodução já operam com essa dimensão.

Energia útil diária após perdas: ~16 a 22 MWh/dia

DGX Spark consome ~19,2 kWh/dia cada.

Resultado: uma única usina de 5 MWp pode sustentar entre 550 e 1.150 supernós de IA operando 24h.

Ou seja: ~0,55 a 1,15 ExaOPS FP4 de processamento local distribuído.

Sem fila na transmissão, sem bandeira tarifária, sem esperar expansão de rede da ONS.


Tabela 2 – Capacidade de IA Sustentada por Microgrids

Usina Solar + BESSEnergia ÚtilDGX Spark Sustentados 24hCapacidade de IA Resultante
5 MWp + BESS (Brasil)16–22 MWh/dia550 – 1.150 unidades0,55 – 1,15 ExaOPS (FP4)
Equivalente em DatacentersNecessitaria de 50 MW dedicados + HVAC + transmissãoProjetos de CAPEX bilionário com payback incerto

Cloud Backlash: o retorno da IA para a borda por causa do TCO

Consultorias como A16z, Gartner e 451 Research já registram um fenômeno chamado Cloud Reversal ou Repatriamento de Carga.

Empresas que migraram tudo para a nuvem agora trazem IA de volta para o local devido ao custo explosivo de operação e tarifas de egress.

Enquanto white papers públicos projetam mais nuvem e megadatacenters, os CFOs já estão voltando para o on-premise — agora repaginado: Edge IA + Energia Local.


Tabela 3 – TCO: Cloud x Datacenter Tradicional x Edge IA com PPA

ModeloCusto VariávelSoberania EnergéticaLatênciaTCO em 5 Anos
Cloud IA (hiperscaler)Alto + tarifas de tráfegoNenhumaMédia/AltaMais alto
Datacenter tradicional on-premiseMédio (rede pública)ParcialMédiaIntermediário
Edge IA + PPA Solar + BESS localBaixo e previsívelTotalMínima (local)Mais baixo

O ponto que muitos conselhos ainda não viram

Enquanto se planeja infraestrutura para alimentar datacenters centralizados com 50 a 100 MWa nova fronteira da IA exige apenas 1 kW por nó e pode ser alimentada diretamente por PPAs locais com geração renovável distribuída.

Se a IA se deslocar para onde a energia nasce — e não o contrário — grande parte dos investimentos projetados hoje podem se tornar ativos subutilizados.

Conselhos de administração e comitês de energia precisam se perguntar:

“Estamos financiando o futuro da inteligência ou apenas reforçando infraestrutura pesada para um modelo que já começou a ser substituído?”


Conclusão: os datacenters não vão acabar — mas o seu monopólio vai

A próxima disputa estratégica não será por data centers maiores. Será por quem consegue posicionar inteligência onde a energia é mais barata, mais disponível e mais soberana.

A foto de Elon Musk recebendo um DGX Spark não é apenas um registro de cortesia. É a imagem simbólica do momento em que a IA começou a rejeitar a centralização.

E isso muda tudo.

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