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Tech & Energy Think Tank

Think tank independente com foco em energia, tecnologia e tendências globais. Análises para apoiar decisões estratégicas com visão de impacto.

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Autor: Eduardo Fagundes

  • Temos que tirar a Análise de Risco e o Compliance do papel

    Temos que tirar a Análise de Risco e o Compliance do papel

    Vivemos em uma época onde existem ferramentas sofisticadas para a gestão de empresas, livros e manuais de boas práticas de gestão, modelos sofisticados e abrangentes de governança corporativa e de tecnologia, organogramas com títulos bonitos, treinamentos de capacitação e legislação com penalidades duras para empresas e responsáveis por processos críticos nas organizações. Entretanto, tudo isto não garante fraudes espetaculares e desastres ambientais com vítimas e prejuízos materiais incalculáveis. Onde está o problema?

    Existem vários fatores que podem explicar as falhas nas tomadas de decisões e comportamento dos conselhos de administração e direção executiva das organizações. Irei destacar x, que considero importantes: (1) ignorar o código de ética e de conduta; (2) falta de especialização técnica de conselheiros e diretores executivos; (3) existência de conflitos de interesses; e, (4) falha nas auditorias internas e externas.

    Por mais ético que um diretor-presidente possa ser, a distribuição de dividendos para os acionistas é o seu objetivo principal. Afinal, ele foi eleito para o cargo para garantir a implementação das estratégias definidas pelo Conselho de Administração para crescimento e lucratividade da organização. Claro que, para mostrar que está executando a missão de forma competente e controlada, a direção executiva monitora e divulga indicativos de desempenho (KPIs) que, normalmente, estão dentro dos limites esperados. A questão é que muitos indicativos apresentados isoladamente, sem tendências históricas e sem correlação com outros indicadores não apresentam o cenário real da empresa.

    Veja o caso da Vale. O faturamento, depois de uma queda substancial de US$35 milhões (2014) para US$23 milhões (2015), houve uma recuperação, consistentemente, até 2018, onde registrou um faturamento de US$36 milhões. Entretanto, analisando outros dois indicativos, observamos que houveram reduções significativas: os investimento reduziram, gradualmente, de US$12 milhões em 2014 para US$3 milhões em 2018; os investimentos em execução de projetos caiu de US$7,9 milhões em 2014 para US$1 milhão em 2018; e, os investimentos em barragens caíram de US$474 milhões para US$191 milhões em 2018. Ou seja, não podemos atribuir a tragédia de Brumadinho apenas a uma fatalidade da natureza.

    Ainda no caso da Vale, o seu relatório de sustentabilidade empresarial era apresentado de forma magnifica, com todos os dados e auditado por auditorias internas e externas. Ou seja, cumpriram integralmente os princípios da governança corporativa, normas da CVM e da B3. Entretanto, não relacionaram os indicadores e revisaram o aumento dos riscos nas barragens.

    E o Compliance na Vale? Do ponto de vista da legislação e cumprimento das normas e aplicação das melhores práticas de gestão estava tudo certo.

    E o Conselho de Administração da Vale? Se olharmos a composição do Conselho vemos que a maioria tem forte qualificação em finanças e questões jurídicas. Neste universo, os votos técnicos podem ter menor peso.

    Como vimos, é possível estar em um ambiente de caos com tudo dentro da conformidade legal e normativa.

    É interessante observar o impacto na linha de comando do discurso da alta direção. No papel, a proteção a vida e ao meio ambiente são prioridades inquestionáveis. Entretanto, na prática, uma mensagem da alta direção de que a prioridade é recuperar a empresa e gerar mais lucro, faz com que as micro decisões ignorem ações mais efetivas de proteção a vida e meio ambiente. Gerentes de nível médio acabam assumindo riscos e apostando na sorte com o objetivo de atender a mensagem da alta direção. Muitas vezes, assumem que não existe dinheiro para pequenas melhorias e não informam seus superiores. Nos casos que informam, a regra vale para a hierarquia que pode assumir que não existe dinheiro e a comunicação do risco fica em alguma gaveta.

    E as auditorias internas e externas não identificam os riscos? Pois é, deveriam. Muitas vezes, os auditores utilizam métodos de analises baseado em entrevistas e na análise de alguns relatórios produzidos pela empresa auditada que podem mascarar os riscos. Por falta de tempo ou conhecimento dos auditores alguns riscos podem passar desapercebidos. O que intriga é a frequência e os casos que ocorrem. No caso da Petrobrás, foram anos de corrupção não detectados por nenhuma auditoria interna e externa.

    As falhas nas micro decisões e nas auditorias podem caracterizar conflitos de interesses, pois algumas decisões são tomadas para evitar outros tipos de conflitos pessoais que poderiam prejudicar a evolução da carreira na organização ou futuros negócios, no caso das auditorias externas.

    Como melhorar? A recomendação obvia é conscientizar os conselheiros e diretores executivos que os valores humanos e ambientais são mais importantes que a geração de lucro a qualquer preço e que devem passar esta mensagem, como prioritária, para toda a organização. Isto deve ser feito, porém duvido dos resultados.

    Minha sugestão, para as empresas de capital aberto, é criar uma base de dados aberta, com dados administrativos, financeiros e técnicos, acessível a todos. Isto criaria condições de analistas independentes possam fazer simulações de riscos e pressionar os conselheiros e diretores executivos nas assembleias de acionistas. Abriria a possibilidade de especialistas externos identificar riscos e comunicar as empresas, dentro de um programa estruturado e, obviamente, remunerado. Isto também se aplica a outras empresas, dentro do contexto de inovação aberta.

    Esta seria uma forma da sociedade em geral participar das ações das empresas, principalmente, daquelas que oferecem riscos para as comunidades e meio ambiente.

    Com dados abertos e uso de ferramentas avançadas de análise de dados, pesquisadores e alunos de Universidades, empreendedores e ONGs poderiam identificar riscos de forma transparente, sem conflitos de interesse e usando um rico conhecimento externo.

  • Estratégia de implantação de Inteligência Artificial em empresas que só pensam em reduzir custos

    Estratégia de implantação de Inteligência Artificial em empresas que só pensam em reduzir custos

    Em tempos de crises econômicas a palavra de ordem é reduzir custos. Levar propostas de investimentos para o conselho de administração ou para a direção executiva é quase um suicídio profissional. Imagine levar uma proposta de implantação de um sistema de Inteligência Artificial (IA), onde para muitas pessoas os resultados são tão enigmáticos como os primeiros episódios de American Gods. A boa noticia é que podemos reduzir custos substituindo algumas ferramentas de análise de dados caras por ferramentas e linguagens de programação de uso intuitivo de código aberto, ou seja, de graça.

    O MS-Excel é uma ótima ferramenta e já está na conta, porém, não dá conta de algumas análises estatísticas já configuradas em softwares mais sofisticados, como aqueles tradicionais para Six-Sigma.

    Sabemos que representações gráficas são poderosas para nós homo sapiens, onde mais facilmente conseguimos identificarmos tendências e termos insights a partir da plotagem dos dados. Existem softwares profissionais que de forma amigável e intuitiva geram gráficos fantásticos que ajudam muito nas análises de dados. Obviamente, por ofereceram muitos recursos são caros.

    A questão é qual o percentual dos recursos dos softwares que você e sua equipe, efetivamente, utilizam para suas análises? Provavelmente, menos de 10%. Não porque você não conheça as funcionalidades disponíveis no software, mas porque não existem dados disponíveis para as análises mais avançadas ou porque os desafios que você tem para solucionar precise de apenas algumas funções.

    O ideal seria se estes softwares pudessem ser cobrados por demanda, ou seja, você apenas paga quando e por quanto tempo ou recursos são utilizados. Isto já ocorre em ambientes de Cloud Computing, nos marketplaces dos provedores de computação em nuvem. Entretanto, para assinar um serviço de Cloud Computing precisa de autorização e budget para contratar, mas se o foco da empresa é reduzir custos, provavelmente, a solicitação será negada.

    Felizmente, existem softwares livre, como a Linguagem R e Python, que podem substituir as mais sofisticadas ferramentas pagas, construindo funcionalidades especificas para uso contínuo por várias pessoas, com análise em tempo real, sem pagamento de licenças de software.

    Algumas aplicações podem até executar em dispositivos pequenos, como o Raspberry Pi, para análises em campo.

    Se você conseguir desenvolver aplicações em R ou Python para as atividades de análises cotidianas, você abriu a porta de entrada para implementar aplicações de Inteligência Artificial na sua empresa.

    O Python, por exemplo, tem API – Application programming interface – para o Tensorflow e Keras, que torna mais amigável o uso das bibliotecas de funções de aprendizagem de máquina – Machine Learning – e, aprendizagem profunda de máquina – Deep Learning.

    O próximo passo é desenvolver os algoritmos para otimizar processos, treina-los, testa-los e colocar em produção para uso irrestrito na empresa.

    Existem vários processos que já, comprovadamente, se beneficiam com a IA. Um exemplo, é a IA reconhecer padrões de imperfeições após cinco imagens de um produto. Atualmente, várias pessoas em uma fábrica trabalham para detectar defeitos, uma tarefa, extremamente, cansativa. Um algoritmo de Deep Learning – leva meio segundo para inspecionar o produto e identificar defeitos, de forma mais precisa que os humanos.

    Instalando sensores remotos nas máquinas atuais, mesmos nas mais antigas, é possível monitorar e identificar, de forma preditiva, falhas nos equipamentos e programar manutenções preventivas, evitando paralisações na linha de produção, tornando o processo mais eficiente e reduzindo perdas de produção.

    Concluindo, as soluções para uso de Inteligência Artificial para aumentar a produtividade das empresas e reduzir custos operacionais estão disponíveis e mais baratas do que você imagina. O desafio é encontrar a estratégia correta para implementa-las nas organizacionais. Uma estratégia recomendada é começar a substituir os atuais softwares de análise de dados proprietários e caros por plataformas de software livre que implementam funcionalidades matemáticas e funções para aprendizado de máquina: Machine Learning e Deep Learning.

  • Eficiência energética, microgrids e geração distribuída para cidades com governança inteligente

    Eficiência energética, microgrids e geração distribuída para cidades com governança inteligente

    Ter energia disponível em uma cidade é fator de atração para novos investimentos industriais e comerciais. Uma alternativa para reduzir a dependência da concessionária de energia local é as cidades investirem em programas de eficiência energética para liberar a oferta de energia para novos empreendimentos. Outra alternativa é investir em programas de geração distribuída e criar micro redes (microgrid) de energia na cidade, aproveitando recursos locais, como energia solar, biomassa e eólica. A resolução normativa da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) nº 687/2015 permite a geração de energia renovável até 5MWp (megawatts de pico) e acoplamento na rede de distribuição de energia de por pessoa física ou jurídica. O amadurecimento do mercado e o aumento da produção das placas fotovoltaicas e equipamentos, reduziram os custos de aquisição e implementação e, consequentemente, o retorno do investimento (ROI). Além da economia financeira no médio e longo prazo, a solução tem a vantagem de reduzir riscos de falta de abastecimento de energia da concessionária, por falha ou racionamento por crises de geração, e pode contribuir na redução de impactos ambientais. Em alguns casos, a geração distribuída pode deixar de ser despesa e gerar receita. As cidades e polos industriais podem se beneficiar muito dos microgrids com geração de energia renovável.

    Dentre as perguntas chaves para a seleção de uma cidade para uma empresa investir em um novo empreendimento industrial e comercial está a disponibilidade e qualidade da energia. A maioria das cidades no país não têm controle sobre o planejamento da expansão da rede de energia que abastece sua localidade e, portanto, ficam dependentes das concessionárias de distribuição de energia para desenvolver seus planos de crescimento econômico e programas de atração de indústrias, centros de distribuição, empresas do setor de serviços e grandes lojas comerciais.

    Eficiência Energética

    Cidades com uma boa gestão de energia implementam programas de eficiência energética em seus prédios, iluminação pública e outros equipamentos públicos. Adicionalmente, incentivam e coordenam programas de eficiência energética com a comunidade, incluindo empresas, condomínios empresarias e residenciais. Os projetos municipais de eficiência energética reduzem o consumo de energia e liberam uma parcela de energia que atende a cidade para novos empreendimentos, sem a necessidade de investimentos da concessionária para ampliar a capacidade da infraestrutura da rede na cidade.

    Cada concessionária de serviços públicos de distribuição de energia elétrica deve aplicar, a partir de abril de 2016, 0,4% da sua receita operacional líquida anual no desenvolvimento de programas de eficiência energética, segundo disposto  o disposto na legislação federal, em especial a Lei n° 9.991, de 24 de julho de 2000, Lei n° 13.203, de 08 de dezembro de 2015, Lei n° 13.280, de 03 de maio de 2016. Os critérios para aplicação dos recursos e procedimentos necessários para apresentação do Programa à Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL estão estabelecidos em sua Resolução Normativa n° 556, de 02 de julho de 2013.

    O programa de eficiência energética da Aneel, de implementação obrigatória das concessionais de distribuição de energia elétrica, abre enormes oportunidades para o poder público, empresas e pessoas físicas de obter financiamento subsidiado para implementar projetos de eficiência energética. Um dos principais fatores para a seleção e aprovação dos projetos é a relação custo/benefício (RCB) do projeto. Quanto maior a economia de energia auferida versus o investimento aplicado, melhor a relação custo/benefício. Para atingir melhores relações melhores, algumas empresas aplicam investimento próprios. Para empresas com fins lucrativos é estabelecido um contrato de desempenho que deve garantir a redução do consumo de energia planejado ou o reembolso do investimento dentro de um determinado período. Para o Poder Público e empresas sem fins-lucrativo é firmado um Termo de Cooperação Técnica, sendo os investimentos a fundo perdido.

    Obviamente, não existe justificativa para empresas não tentarem, anualmente, obter estes financiamentos subsidiados para reduzir custos dentro de planos de melhoria contínua, estimulando a criatividade e inovação dos funcionários. Para as cidades, além da redução de custos, existe a vantagem de atrair novas empresas para utilizar a demanda evitada, sem a necessidade da concessionária investir na expansão da rede de energia elétrica.

    Microgrid

    Microgrids são sistemas de energia relativamente pequenos e controláveis ​​compostos de uma ou mais unidades de geração conectadas a usuários próximos que podem ser operados com ou de forma independente do sistema de transmissão da concessionária de energia local. Um Microgrid compreende um sistema de distribuição de baixa tensão, com recursos energéticos distribuídos (microturbinas, pequenos geradores nucleares, sistemas fotovoltaicos, sistemas eólicos, sistemas de biomassa, etc.), dispositivos de armazenamento (baterias, Flywheel) e sistemas de armazenamento de energia.

    Os sistemas de distribuição das concessionárias inteligentes e digitais (SmartGrid) podem configurar microgrids dinamicamente e utilizar unidades de geração locais para atender a diferentes situações, como falha do sistema principal (ataques cibernéticos, por exemplo) ou para melhor a eficiência do sistema.

    Em uma cidade, a configuração de microgrids depende de uma parceria com a concessionária local para isolar uma parte de sua infraestrutura de rede para ser atendida por uma fonte local, como por exemplo o atendimento da rede de hospitais da cidade. Isto evitaria que cada hospital tivesse um gerador de emergência.

    Geração Distribuída

    A geração distribuída é definida como uma fonte de geração de energia elétrica acoplada a uma rede de distribuída. A micro e mini geração de energia distribuída ganha força no Brasil a partir do estimulo do governo ao consumidor brasileiro (pessoa física e jurídica) para gerar sua própria energia elétrica usando fontes renováveis ou cogeração qualificada fornecendo o excedente para a rede de distribuição na área da concessionária. A micro e mini geração permite aliar economia financeira, consciência socioambiental e autossustentabilidade.

    A iniciativa do governo teve início em abril de 2012 com a entrada em vigor da Resolução Normativa nº 482/2012 da Aneel. Em março de 2015, entra em vigor a Resolução Normativa nº 687/2015, que revisa as RN nº 482/2012, permitindo o uso de qualquer fonte renovável, além da cogeração qualificada, denominando-se micro geração distribuída a central geradora com potência instalada até 75 quilowatts (KW) e mini geração distribuída aquela com potência acima de 75 kW e menor ou igual a 5 MW, conectadas na rede de distribuição por meio de instalações de unidades consumidoras.

    Com a nova resolução é possível implantar nas cidades ações de sustentabilidade buscando sinergia, como por exemplo, instalar usinas de biomassa em aterros sanitários. Projetos deste tipo, já em uso em São Paulo, permite utilizar o gás metano emitido pelos aterros sanitários para geração de energia e acoplar o sistema a um microgrid local.  

    Quando a quantidade de energia gerada em determinado mês for superior à energia consumida naquele período, o consumidor fica com créditos que podem ser utilizados para diminuir a fatura dos meses seguintes. Os créditos são validos por 60 meses e podem ser usados para abater o consumo de unidades consumidoras do mesmo titular situadas em outro local dentro da área de concessão da distribuidora de energia. Esse tipo de utilização dos créditos foi denominado “autoconsumo remoto”.

    Existe ainda a possibilidade de instalação de geração distribuída em condomínios (empreendimentos de múltiplas unidades consumidoras), onde a energia gerada pode ser repartida entre os condôminos em porcentagens definidas pelos próprios consumidores.

    A “geração compartilhada” possibilita que diversos interessados se unam em um consórcio ou em uma cooperativa para instalar a geração distribuída e utilizem a energia gerada para redução das faturas dos consorciados ou cooperados.

    A geração compartilha permite que munícipes de baixa renda possam se reunir em cooperativas para gerar energia, compartilhando equipamentos para reduzir custos de implantação, e se beneficiar da redução de custo de energia.

    Mesmo que os consumidores venham a gerar mais energia que consumirem, ainda será devido o pagamento referente ao custo de disponibilidade. Para consumidores em baixa tensão (grupo B) os pagamentos de valor em reais equivalente a 30 kWh (monofásico), 50 kWh (bifásico) ou 100 kWh (trifásico). Para consumidores conectados em alta tensão (grupo A), a parcela de consumo poderá ser zerada se a geração for igual ou maior que o consumo, porém ainda será devido o pagamento da demanda contratada.

    Conclusão

    Combinando eficiência energética, microgrids e geração distribuída as cidades podem, através de uma governança inteligente, podem construir um ambiente de geração e demanda de energia controlado, possibilitando atrair novos empreendimento e assegurando energia de qualidade para empresas e residências. É possível também criar sinergia entre ações de sustentabilidade ambiental e ações sociais de redução de custos dos munícipes com incentivos a geração distribuída.

  • Os desafios da coleta de dados em dispositivos IoT para Big Data/Analytics

    Os desafios da coleta de dados em dispositivos IoT para Big Data/Analytics

    Quem trabalha com Big Data/Analytics sabe que um dos maiores desafios é a coleta de dados. Sabemos que os sistemas legados, desenvolvidos anos atrás, não contem todas os dados que necessitamos para as análises, seja porque o histórico de dados foi deletado por economia de custo de armazenamento ou porque os sistemas foram desenvolvidos para resolver apenas questões operacionais. Felizmente, os novos sistemas já abordam dados necessários para análises mais completas e dados para sistemas de aprendizado de máquina – Machine Learning. Para coleta de dados de sensores remotos em tempo real a Internet of Things (IoT) é a tecnologia que se apresenta mais viável atualmente. Entretanto, temos dois grandes desafios: a escolha da tecnologia de comunicação e os custos dos serviços, incluindo os impostos.

    A expectativa é que tenhamos 125 milhões de dispositivos conectados até 2030. Imagine receber dados deste universo de sensores remotos! A questão hoje é qual das tecnologias de comunicação disponíveis é mais eficiente e de baixo custo para capturar estes dados.

    Tecnologias

    Entre muitas tecnologias de comunicação disponíveis, temos quatro que se destacam, baseadas em LPWAN: LTE-M (LTE -MTC [Machine Type Communication]), NB-IoT (Narrowband IoT), LoRa e o Sigfox. Redes de baixa potência para grandes áreas (LPWAN – low-power wide-area network) é um tipo de comunicação sem fios rede de área ampla concebido para permitir a comunicação de longo alcance a uma baixa taxa de bits entre coisas (objetos conectados), como sensores usando IoT. A taxa de dados da LPWAN varia de 0,3 kbps a ​​50 kbps por canal.

    Os principais atributos da tecnologia LPWAN são:

    • Longo alcance: A faixa de operação da tecnologia LPWAN varia de alguns quilômetros em áreas urbanas a mais de 10 km em áreas rurais. Ele também pode permitir a comunicação efetiva de dados em locais internos e subterrâneos anteriormente inviáveis.
    • Baixa potência: Otimizado para consumo de energia, os transceptores LPWAN podem funcionar com baterias pequenas e baratas por até 20 anos
    • Baixo custo: os protocolos simplificados e leves da LPWAN reduzem a complexidade no projeto de hardware e reduzem os custos com dispositivos. Seu longo alcance, combinado com uma topologia em estrela, reduz os dispendiosos requisitos de infraestrutura, e o uso de bandas licenciadas ou não licenciadas reduz os custos de rede.

    As tecnologias LTE-M e NB-IoT foram desenvolvidas pela 3GPP (3rd Generation Partnership Project), uma organização de tecnológica na área de telecomunicações que visa padronizar a criação, envio e reprodução de arquivos multimídia (vídeos) em telefones celulares e outros aparelhos wireless.

    1.    LTE-M

    O LTE-M (LTE -MTC [Machine Type Communication]), que inclui o eMTC (Enhanced Machine Type Communication), permite conexão com uma ampla gama de dispositivos celulares. e serviços (especificamente, para aplicativos máquina-para-máquina e IoT), ainda leva vantagem sobre o NB-IoT de ter taxa de dados comparativamente mais alta, mobilidade e voz na rede, mas requer mais largura de banda.

    Caraterísticas do LTE-M:

    • Barato: os dispositivos podem se conectar a redes 4G com chips de menor custo, porque são half-duplex e têm uma largura de banda mais estreita;
    • Longa vida útil da bateria: os dispositivos podem entrar em um modo de “sono profundo” chamado Modo de Economia de Energia (PSM) ou acordar apenas periodicamente enquanto estiverem conectados. Esse modo é chamado de recepção descontínua estendida (eDRX);
    • Menor custo de serviços: como a taxa máxima de dados dos dispositivos LTE-M é de apenas 100 kbps, eles não cobram muito da rede 4G. As operadoras podem oferecer planos de serviços mais próximos do antigo preço 2G M2M do que os preços 4G.

    Aplicações do LTE-M

    • Sensores de baixa densidade: para empresas ou OEMs que usam sensores como parte de seus negócios (Cold Chain Monitoring), elimina problemas de conexão via Wi-Fi ou através de gateway. A ideia é instalar os dispositivos com baterias de longa duração e evitar manutenções periódicas;
    • Leitura automatizada do medidor: com chips mais baratos é possível mais medidores e ampliar a monitoração, controle e análises de dados;
    • Rastreamento de ativos: as soluções de rastreamento de ativos híbridos que usam conexão de curto alcance, como Bluetooth, usando um backhaul via LTE-M é uma ótima solução técnica e econômica.

    2.    NB-IoT

    Como um padrão celular, o objetivo do NB-IoT é padronizar os dispositivos de IoT para serem interoperáveis ​​e mais confiáveis.

    Como o NB-IoT é uma tecnologia sem fio de nível celular que usa modulação OFDM, os chips são mais complexos, mas o custo dos links é menor. Isso significa que os usuários obtêm um alto nível de desempenho associado às conexões de celular, mas ao custo de mais complexidade e maior consumo de energia.

    O NB-IoT deve ser usado para enviar e receber pequenas quantidades de dados – algumas dezenas ou centenas de bytes por dia gerados por dispositivos de IoT de baixa produção de dados. Ele é baseado em mensagens, semelhante ao Sigfox e ao LoRa, mas com uma taxa de modulação muito mais rápida que pode manipular muito mais dados do que essas tecnologias. O NB-IoT não é um protocolo de comunicação baseado em IP e não pode ser utilizado em aplicações como de um smartphone comum. Ele foi desenvolvido para aplicativos IoT simples com baixo consumo de energia.

    A especificação 3GPP para NB-IoT tem duas variantes concorrentes: Huawei/Vodafone versus Ericsson/Nokia/Intel. O NB-IoT deve operar dentro de um espectro de frequência licenciado.

    Vantagens do NB-IoT:

    • Boa cobertura. Os dispositivos NB-IoT dependem da cobertura 4G, para que funcionem bem em ambientes internos e em áreas urbanas densas;
    • Rápidos tempos de resposta: são mais rápidos do que o LoRa e pode garantir uma melhor qualidade de serviço.

    Desvantagens do NB-IoT

    • É difícil implementar transferências via firmware via over-the-air (FOTA) ou arquivos. Algumas das especificações de projeto para o NB-IoT fazem com que seja difícil enviar grandes quantidades de dados para um dispositivo;
    • Os handoffs de rede e torre pode ser um problema, sendo, portanto, mais adequado para ativos basicamente estáticos, como medidores e sensores em um local fixo, em vez de ativos de roaming.

    3.    LoRa

    LoRa ( Lo ng Ra nge) é protocolo de comunicação sem fio de longo alcance patenteada pela Cycleo de Grenoble, França, e adquirida pela Semtech em 2012. O LoRa usa bandas de radiofrequência sub giga-hertz não licenciando na Europa e Estados Unidos. O LoRa permite transmissões de longo alcance (mais de 10 km em áreas rurais) com baixo consumo de energia. A tecnologia é apresentada em duas partes: LoRa, a camada física e LoRaWAN (Long Range Wide Area Network), as camadas superiores.

    O LoRa é um sistema de modulação proprietário vendido pela empresa Semtech, única fabricante de chipset e titular de licença para LoRa.

    Vantagens do LoRa:

    • Adequado para aplicações de propósito específico;
    • Funcionalidades para configurar e gerenciar sua própria rede;
    • O LoRa é uma boa opção para aplicações de bidirecionais, por exemplo, funcionalidade de comando e controle, usando links simétricos;
    • Os dispositivos LoRa funcionam bem quando estão em movimento, o que os torna úteis para rastrear ativos em movimento, como remessas de encomendas;
    • Os dispositivos LoRa têm uma duração de bateria mais longa que os dispositivos NB-IoT.

    Desvantagens do LoRa:

    • Tem taxas de dados mais baixas do que o NB-IoT;
    • Tem um tempo de latência maior que o NB-IoT.

    4.    Sigfox

    A tecnologia proprietária da Sigfox emprega o chaveamento binário diferencial de fase (DBPSK) e o chaveamento gaussiano de frequência (GFSK) que permite a comunicação usando a banda de rádio Industrial, Científica e Médica ISM que usa 868MHz na Europa e 902MHz nos EUA. Ele utiliza um sinal de longo alcance que passa livremente através de objetos sólidos, chamado de ” Ultra Narrowband ” e requer pouca energia. O padrão existente para comunicações Sigfox suporta até 140 mensagens de ligação ascendente por dia, cada uma das quais pode transportar uma carga útil de 12 octetos a uma taxa de dados de até 100 bytes por segundo.

    A tecnologia é de propriedade da Sigfox, uma operadora de rede global francesa fundada em 2009 que constrói redes sem fio para conectar objetos de baixa potência, como medidores de eletricidade e smartwatches, que precisam estar continuamente ligados e emitindo pequenas quantidades de dados. A Sigfox tem parceria com várias empresas do setor de LPWAN, como Texas Instruments, Silicon Labs e ON Semiconductor.

    Vantagens do Sigfox:

    • Consome uma baixa quantidade de energia;
    • Funciona bem em dispositivos simples que transmitem com baixa frequência, porque envia quantidades muito pequenas de dados;
    • Suporta uma ampla área de cobertura nas áreas em que está localizada.

    Desvantagens do Sigfox:

    • A operadora Sigfox e seus parceiros, como a WND no Brasil, não estão presentes em muitas localidades;
    • Melhor comunicação do ponto final para a estação base. O Sigfox é bidirecional, entretanto, podem existir restrições de envio de dados para os dispositivos remotos;

    Implementações no Brasil

    Todas as tecnologias e fornecedores internacionais estão presentes ou representados no Brasil. A WND Brasil, operadora do Sigfox, afirma que já possui uma cobertura de serviço para 106 milhões de pessoas no início de 2019 e prevê uma cobertura para mais de 150 milhões de pessoas até no fina de 2019.

    Em março de 2019, o BNDES elegeu três municípios – Santa Rita do Sapucaí (MG), Caxambu (MG) e Piraí (RJ) – para serem testes de dispositivos de IoT para aplicações de cidades inteligentes. O BNDES habilitou a Inatel para a execução do projeto piloto que será conduzido em parceria com a Prefeitura Municipal de Santa Rita do Sapucaí (MG), com as empresas Ericsson e Tim, e com as startups Pixel, Das Coisas, Fractum e Laager Inovações.

    A rede 4G, ativada comercialmente pela TIM em Santa Rita do Sapucaí, desde o ano de 2019, é a primeira no Brasil habilitada com a funcionalidade NB-IoT.

    A Vivo Empresas, área do segmento B2B da Telefônica Brasil, anunciou em março de 2019 o lançamento das redes NB-IoT e LTE-M, oferecendo opções de conexões para os clientes.

    Com isto o padrão da variante do NB-IoT formado pela Ericsson/Nokia/Intel leva vantagem no Brasil e pode ser tornar um padrão de fato.

    A America Tower, uma empresa global, afirmou, em fevereiro de 2019, que o Brasil é peça-chave da estratégia da empresa para seus serviços, que inclui redes baseadas em LoRa.

    Custos dos serviços e impostos

    Além das discussões técnicas sobre as tecnologias disponíveis, uma componente importante é o custo dos serviços. Cada operadora de serviços estabelece seus preços, normalmente, baseados em tráfego de dados e unidades conectadas, valendo reduções nos preços para grandes volumes.

    A avaliação que se deve fazer é o valor do dado coletado do ponto de vista do negócio. Só faz sentindo o investimento e despesas com os serviços se o valor do serviço for muito menor que o valor do dado para o negócio.

    Aqui entra outra questão: qual é o valor do dado coletado? Cada empresa tem que estabelecer critérios para avaliar os resultados esperados pelo projeto.

    Outra questão está discussão é o pagamento de impostos dos serviços para a conexão de dispositivos remotos usando tecnologia IoT. A regra hoje é que além do ICMS deve também incidir o FISTEL, a taxa de fiscalização dos serviços de telecomunicações.

    Conclusão

    A boa notícia é que as principais tecnologias de comunicação de dados para dispositivos de IoT estão presentes no Brasil e competindo para oferecer melhores serviços para os clientes. Cada tecnologia tem suas vantagens e desvantagens técnicas que terão analisadas juntamente com os níveis de serviços e preços oferecidos pelos fornecedores.

    A coleta de dados dever ser ajustada as necessidades do negócio, considerando que os custos dos serviços de coleta devem compensar o investimento e despesas mensais das aplicações de negócios.

    Coletar todos os dados disponíveis pode ser uma solução viável para sistemas internos e fechados, porém, quando houver necessidade de coleta de dados de sistemas externos, a relação custo/benefício deve ser muito bem estudada.

    A melhor estratégia é buscar independência das operadoras de serviços de comunicações. Entretanto, no caso de IoT é necessário implementar a tecnologia selecionada nos dispositivos remotos deixando pouca flexibilidade para substituição de tecnologia, principalmente, depois de implantações de larga escala.

    A exemplo das tecnologias dos celulares que acabaram se consolidando, deve acontecer o mesmo no futuro com as tecnologias para IoT. Ainda está na memória a rivalidade entre o padrão adotado pela Vivo/Telefônica, o CDMA, e o padrão das outras operadoras, o GSM. A Vivo/Telefônica teve que fazer um enorme esforço para a conversão da rede para o padrão que se consolidou, o GSM.

    Apostar na melhor tecnologia não garante a continuidade dos serviços. A decisão deve ser baseada seguindo os grandes grupos econômicos internacionais.

    A chegada da tecnologia 5G deve impactar as tecnologias para IoT. Como tudo, devemos acompanhar as tendências das novas tecnologias e criar alternativas de migração, se necessário, e formar de aumentar o desempenho e reduzir custos.