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Autor: Eduardo Fagundes

  • Briefing Executivo – Segundo Dia da X Semana de la Energía em Santiago do Chile

    Briefing Executivo – Segundo Dia da X Semana de la Energía em Santiago do Chile

    O segundo dia da X Semana de la Energía, em Santiago do Chile, foi marcado por uma sequência de debates intensos que colocaram o armazenamento energético, a integração regional e as dinâmicas geopolíticas no centro da discussão. Participei de quatro blocos temáticos se articularam como capítulos de uma mesma história: hidroenergia, geopolítica, a revolução do armazenamento e a perspectiva energética regional. Cada um trouxe visões complementares, formando um mosaico que ajuda a compreender para onde caminha a transição energética na América Latina e no Caribe.


    Hidroenergia: pilar histórico e ponte para o futuro

    A primeira sessão do dia, intitulada “Hidroenergía en evolución: retos y oportunidades en el siglo XXI”, foi dedicada a refletir sobre o papel da hidroenergia na transição energética . A mensagem foi clara: a hidroeletricidade continua a ser a espinha dorsal da matriz elétrica latino-americana, mas precisa ser modernizada para se tornar ainda mais resiliente diante das mudanças climáticas.

    O debate destacou como a digitalização, os sistemas de bombeamento reversível e a integração com novas tecnologias de armazenamento podem redefinir a função dos reservatórios hídricos. A ideia recorrente foi que as hidrelétricas, mais do que geradoras, devem ser vistas como reservatórios naturais de flexibilidade, capazes de acomodar a crescente intermitência da solar e da eólica. Essa sessão funcionou como uma ponte conceitual para os painéis seguintes: sem flexibilidade, não haverá transição segura.


    Claves geopolíticas: a transição como tema de política externa

    Na sequência, o painel “Claves geopolíticas de la transición global” trouxe para o palco personalidades de peso, incluindo o chanceler chileno Alberto van Klaveren, a diretora Dorotea López Giral (Universidad de Chile), a especialista Astrid Yanet Aguilera Cazalbón e o professor Jaime Baeza (FLACSO) .

    O tom da conversa foi geopolítico e diplomático. A transição energética deixou de ser apenas um desafio técnico ou ambiental: tornou-se um eixo central de política externa e de segurança internacional. Os painelistas ressaltaram que a América Latina, por dispor de uma matriz mais limpa que a média mundial e deter minerais críticos como lítio e cobre, ocupa um lugar privilegiado nas cadeias globais.

    Van Klaveren reforçou que energia é hoje assunto de Estado, não de governo. Estabilidade regulatória, confiança entre países e diplomacia energética são peças-chave para que a região consiga não apenas exportar commodities, mas também influenciar os rumos globais. O papel da integração regional – seja por interconexões elétricas, coordenação regulatória ou protocolos de resiliência – foi reiterado como condição indispensável para que os países latino-americanos deixem de ser ilhas isoladas e passem a atuar como bloco.

    Outro aspecto mencionado foi a inovação aplicada à infraestrutura crítica, incluindo inteligência artificial, e a necessidade de formar capital humano qualificado. Assim, o painel geopolítico preparou o terreno para os blocos seguintes, ao colocar a transição no patamar de estratégia internacional.


    Keynote: a revolução do armazenamento e a visão chilena

    A terceira sessão foi conduzida pelo Ministro de Energia do Chile, Diego Pardow, sob o título “La Revolución del Almacenamiento”. Sua fala teve o peso de um keynote, ao projetar a visão estratégica de um país que decidiu se posicionar na vanguarda do setor .

    Logo na abertura, Pardow ressaltou que o armazenamento deixou de ser um complemento e se tornou um pilar central da política energética. As fotos exibidas durante a palestra reforçaram esse simbolismo: em uma delas, Pardow aparece projetando a curva diária de oferta e demanda, mostrando como baterias e sistemas de flexibilidade achatam o custo marginal e estabilizam preços. Em outra, apresenta o número que chamou a atenção de todos: mais de US$ 8 bilhões já mobilizados em projetos de armazenamento no pipeline chileno.

    O ministro também fez uma referência incisiva à integração regional: lembrou que, no Brasil, a mera ameaça de importação de gás argentino já foi suficiente para derrubar preços no mercado. Esse exemplo concreto mostrou como os mecanismos de flexibilidade, incluindo o armazenamento, possuem efeitos diretos na segurança de suprimento e no equilíbrio de preços entre países.

    Pardow destacou que a revolução do armazenamento exige não apenas tecnologia, mas inovação regulatória. O Chile tem avançado na criação de marcos que permitem remunerar os serviços de estabilidade que baterias e hidrelétricas reversíveis oferecem ao sistema. Ele citou medidas de simplificação de licenciamento e autorizações, que aceleram investimentos sem comprometer critérios ambientais e técnicos.

    As metas nacionais foram reiteradas: alcançar 24 GWh de capacidade de armazenamento até 2030 e 46 GWh até 2050. Essa ambição, segundo Pardow, vai além do setor energético, pois gera empregos, aumenta a competitividade da indústria e garante inclusão social. A revolução do armazenamento é, portanto, um projeto de desenvolvimento.


    O painel de armazenamento: desafios práticos e visões regionais

    Logo após o keynote, iniciou-se o painel técnico com cinco participantes representando governos, instituições multilaterais e empresas. O debate girou em torno de quatro grandes temas: financiamento, efeitos de mercado, regulação/licenciamento e ordem de grandeza dos investimentos .

    O consenso foi que o financiamento segue como principal obstáculo. A estrutura de receitas ainda não captura adequadamente todos os serviços prestados pelos sistemas de armazenamento – desde a arbitragem de preços até os serviços ancilares como controle de frequência e reserva de potência. Isso limita a escala dos projetos.

    No entanto, os efeitos de mercado já são visíveis. No Chile, por exemplo, a entrada de baterias em grande escala reduziu os custos marginais intradiários, achatando a curva de preços e criando ganhos sistêmicos. A simplificação regulatória e de licenciamento foi apontada como acelerador essencial, capaz de destravar bilhões em investimentos.

    A OLADE complementou com informações institucionais: anunciou a transformação de uma nota técnica em livro sobre armazenamento, reunindo estado da arte tecnológico, estudos de caso e desafios regulatórios. Estimou que a região já possui cerca de 2,7 GW de capacidade de armazenamento, sendo 1,7 GW em baterias e 1,0 GW em hidrelétricas reversíveis. Citou também a projeção da IEA: para triplicar as renováveis até 2030, será preciso multiplicar por seis o armazenamento, chegando a um patamar de 18% de capacidade de armazenamento sobre a nova energia renovável instalada.


    Casos nacionais e empresariais

    Entre os casos nacionais discutidos, o Chile reafirmou sua liderança, com 21 projetos em diferentes fases e metas de 2 GW até 2030 e 6 GW até 2050. O Brasil destacou sua matriz de 88% renovável, fortemente hidrelétrica, mas ressaltou a necessidade de usar armazenamento para integrar a expansão solar e eólica. O México foi lembrado pelo código de rede que exige até 30% de armazenamento em novos projetos. Já a Argentina reportou o sucesso do leilão de 500 MW em Buenos Aires, com ofertas superiores a 600 MW.

    Casos menores, mas igualmente relevantes, vieram de Honduras, que realizou um leilão de 75 MW considerado inovador, e da República Dominicana, onde sistemas insulares vulneráveis a apagões veem no BESS a possibilidade de fornecer potência firme, desde que haja uma regulação clara para remunerar arbitragem e serviços ancilares.

    Do lado empresarial, a EDF Power Solutions apresentou um pipeline robusto no Chile, incluindo um projeto de 500 MW/4h em zona desértica, voltado a atender tanto contratos regulados quanto PPAs corporativos do setor minerador. A empresa destacou sua estratégia global de oferecer energia 100% renovável combinada a armazenamento, com projetos também na Europa, Estados Unidos e África do Sul.

    O painel encerrou enfatizando aspectos técnicos de operação do sistema: inversores grid-forming e máquinas síncronas virtuais, que simulam inércia e oferecem estabilidade às redes, foram apontados como tecnologias críticas. O consenso foi de que o armazenamento deve ser tratado não como “megawatts-hora armazenados”, mas como infraestrutura de confiabilidade sistêmica.


    Perspectiva energética regional: diversidade de realidades, convergência de desafios

    O último painel, “Perspectiva Energética Regional”, reuniu Lucía Spinelli (Banco Mundial, moderadora), Leandro Pereira (MME, Brasil), Erik Tejeda (Honduras), Ryan Cobb (Belize) e Mauricio Bejarano (Paraguai) .

    Spinelli abriu destacando a singularidade da região: matrizes elétricas limpas, porém pressionadas pelo crescimento da demanda e pela vulnerabilidade climática.

    Leandro Pereira ressaltou que o Brasil já possui 88% de sua matriz renovável e vê no armazenamento um instrumento indispensável para integrar solar e eólica. O grande gargalo, segundo ele, é a transmissão: conectar o Norte e o Nordeste, ricos em recursos, ao Sudeste, centro de consumo.

    De Honduras, Erik Tejeda trouxe a realidade de um país ainda sujeito a apagões e dependente de combustíveis fósseis importados. O armazenamento, disse ele, é vital para dar estabilidade, mas só avançará com apoio multilateral e financiamento externo.

    Ryan Cobb descreveu os desafios de Belize, onde setores como turismo e call centers impulsionam a demanda. Defendeu soluções descentralizadas e microrredes, ressaltando o peso do custo elevado da energia sobre a competitividade econômica.

    Por fim, Mauricio Bejarano, do Paraguai, destacou a oportunidade de transformar o excedente hidrelétrico em vetor de industrialização. O desafio, no entanto, é não se limitar à exportação, mas criar cadeias de valor internas.

    Apesar das diferenças de escala, todos concordaram em quatro pontos: a integração regional é inevitável; o gás naturalcontinua sendo combustível de transição; o armazenamento é um pilar emergente; e o financiamento/regulaçãopermanecem como gargalos.


    Conclusão: um fio condutor comum

    O segundo dia da X Semana de la Energía deixou claro que a América Latina vive um paradoxo: é a região com maior potencial de renováveis do mundo, mas ainda precisa superar barreiras institucionais, financeiras e técnicas para transformar esse potencial em realidade.

    A narrativa mostrou que hidroeletricidade, geopolítica, armazenamento e perspectivas regionais não são capítulos isolados, mas peças de um mesmo quebra-cabeça. O futuro energético latino-americano dependerá da capacidade de construir pontes — entre países, entre setores e entre tecnologias.

    Se a transição é global, a América Latina e o Caribe têm a chance de liderá-la, desde que alinhem visão de longo prazo, estabilidade regulatória e cooperação regional. O Chile mostrou sua ambição, o Brasil reforçou sua escala, e os demais países trouxeram desafios que precisam de soluções conjuntas. Mais do que um debate técnico, o que se viu foi um debate sobre futuro, soberania e integração.

  • X Semana de la Energía em Santiago do Chile: Reflexões e Desafios do Primeiro Dia

    X Semana de la Energía em Santiago do Chile: Reflexões e Desafios do Primeiro Dia

    O primeiro dia da X Semana de la Energía, realizada em Santiago do Chile, marcou o início de uma jornada intensa de debates estratégicos sobre o futuro do setor energético na América Latina e no Caribe. Estar presente nesse encontro significa testemunhar não apenas a troca de experiências entre líderes regionais, mas também a construção de uma agenda concreta para enfrentar os desafios da transição energética, da integração regional e da segurança dos sistemas elétricos.

    A narrativa que segue busca registrar em detalhes as discussões de cada sessão, organizadas na cronologia em que ocorreram.


    Sessão Magistral – Conectando América Latina e o Caribe: Como Lograr um Mercado Energético Regional?

    O evento começou com uma sessão de peso, reunindo autoridades como Andrés Rebolledo, secretário executivo da OLADE, Andrés Villegas Ramelli (ISA), Johanna Monteiro (Ministério de Energia do Chile), Marcelino Madrigal(BID) e  Michael Mechlinski (Coordinador Regional – GET.transform) .

    A tônica foi clara: a integração energética regional deixou de ser apenas um ideal político e tornou-se uma necessidade estratégica. A experiência histórica das grandes interconexões — Itaipu, Salto Grande, Colômbia–Panamá — foi lembrada como prova de que ganhos de resiliência e redução de custos são possíveis quando países somam esforços.

    Rebolledo destacou que sem coordenação política e convergência regulatória, a integração corre o risco de se perder em intenções não materializadas. Madrigal reforçou que a confiança mútua entre países é o verdadeiro ativo de longo prazo para avançar na construção de um mercado regional robusto.

    Outro ponto relevante foi o papel das renováveis na transição energética. Monteiro lembrou que a região tem abundância de recursos hídricos e solares, mas sofre com a intermitência. “A interconexão é a chave para transformar excedentes locais em segurança regional”, disse.

    O financiamento, inevitavelmente, entrou no debate. Madrigal ressaltou que sem institucionalidade forte não há investimento sustentável. O BID e outros multilaterais, segundo ele, estão dispostos a apoiar, mas exigem regras claras e previsibilidade.


    Segundo Painel – Integração Energética Regional e o Papel Estratégico do Gás Natural

    A segunda sessão trouxe um debate mais pragmático, conectando a integração elétrica ao papel do gás natural como combustível de transição .

    Carlos Cortés Simon, presidente executivo da AGN, defendeu que o gás precisa ser visto além do tradicional, pois sua função será tripla: garantir segurança elétricaviabilizar a descarbonização de setores difíceis de eletrificar e estimular desenvolvimento econômico regional.

    Na visão brasileira, Heloisa Borges, diretora da EPE, trouxe clareza estratégica. O Brasil está finalizando seu Plano Nacional Integrado de Gás Natural e Biometano, que contempla interconexões com a Argentina e soluções híbridas para sistemas isolados. Borges reforçou que o gás não é um freio à transição, mas um pilar de estabilidade, essencial para complementar a expansão renovável. Ela lembrou um episódio emblemático: “a mera ameaça de importação de gás argentino já foi suficiente para reduzir preços no Brasil”, mostrando como a integração pode funcionar como instrumento competitivo.

    Christian Asinelli, da CAF, reforçou que a região deve ser vista como “provedora de soluções” no contexto global, graças à riqueza de recursos críticos — do lítio ao próprio gás. Para ele, o financiamento só terá sentido se vinculado a objetivos sociais e climáticos, conectando transição energética a inclusão.

    O mediador, Guido Maiulini, da OLADE, foi incisivo: não basta ter projetos técnicos, é preciso alinhar decisões políticas e superar barreiras tributárias. E lembrou: “somos uma região de paz, e isso nos dá uma vantagem competitiva para avançar na cooperação energética”.


    Construyendo un Sistema Eléctrico Resiliente y Seguro: Un Marco Regulatorio a Medida

    O terceiro painel trouxe uma perspectiva acadêmica, com a exposição do professor Michael Pollitt (Cambridge Judge Business School) . Ele revisitou 40 anos de reformas dos mercados elétricos e mostrou como a regulação precisa mudar para suportar a transição energética marcada por solar, eólica, storage e geração distribuída.

    Pollitt foi enfático: “sem transmissão, não há Net Zero”. O gargalo da infraestrutura de redes foi identificado como o grande limitador global. Ele sugeriu reformas nas filas de conexão, priorizando projetos prontos em vez de apenas os primeiros a chegar (“first-ready” versus “first-come”), além de tarifas locacionais e mercados locais de flexibilidade.

    A lição prática para a América Latina foi clara: sem instituições independentes e previsíveis, os cabos sozinhos não entregam transição energética.


    A Palestra de Luiz Barroso

    A apresentação de Luiz Barroso, presidente da PSR, trouxe um olhar agudo sobre os desafios atuais do Brasil — que, em muitos aspectos, são os mesmos da região. Ele resumiu em uma frase central: “sem evolução rápida da regulação e dos mercados, corremos o risco de ter excesso de energia de dia e escassez à noite, com custos ocultos e mais curtailment”.

    Brasil como Estudo de Caso

    Barroso usou o Brasil como vitrine de aprendizados. Destacou a explosão da geração distribuída solar, que passou de quase nada a dezenas de gigawatts em poucos anos, impulsionada por isenções tarifárias. Isso trouxe benefícios, mas também distorções e custos repassados ao sistema.

    Mostrou como a curva do pato brasileira já se torna um problema estrutural: picos de geração solar durante o dia sem flexibilidade suficiente para atender a demanda da noite. Ele ressaltou que a “flexibilidade infinita” das hidrelétricas já não é garantida, por conta de restrições ambientais e hidrológicas.

    Onde Funcionou e Onde Travou

    Nos avanços, Barroso destacou os leilões de energia e transmissão, que garantiram novos projetos a custos baixos, além dos contratos de longo prazo, que reduziram riscos e atraíram investimentos.

    Nas travas, apontou o uso inadequado da rede de distribuição pela GD, a ausência de produtos padronizados de flexibilidade e a lentidão da governança da fila de conexão. Também criticou a falta de clareza na comunicação pública, lembrando que distorções em redes sociais dificultam reformas técnicas necessárias.

    A Agenda de Correções

    Sua agenda de “como fazer” foi pragmática:

    1. Reformar a conexão e uso da rede, com critérios de prontidão e tarifas locacionais.
    2. Criar mercados de flexibilidade, remunerando baterias e resposta da demanda.
    3. Planejar a transmissão para o Net Zero, com zonas de renováveis e obras estruturantes.
    4. Revisar subsídios da GD, preservando seu valor sem transferir custos ao resto do sistema.
    5. Aprofundar o mercado financeiro, com PPAs padronizados e instrumentos de hedge.
    6. Adotar regulação adaptativa, com ciclos mais curtos, sandboxes e métricas de desempenho.

    Implicações Regionais

    Barroso foi além: “muitos países estão vivendo o mesmo filme”. A entrada acelerada de renováveis sem rede e regras adequadas gera riscos semelhantes em toda a América Latina. Para ele, harmonizar critérios de conexão, planejamento de transmissão e contratos transfronteiriços é prioridade regional.


    Painel – Um Marco Regulatório a Medida

    O último painel do dia reuniu Andrés Romero CeledónChristian Jaramillo H.Lucía Spinelli (mediadora) e Ramón Méndez .

    Romero lembrou que o Chile foi pioneiro em mercados liberalizados, mas alertou que os modelos originais já não respondem à realidade da transição. “Não há como dissociar liberalização de planejamento de longo prazo”, disse.

    Jaramillo destacou os riscos de depender quase exclusivamente de renováveis intermitentes. Para ele, usinas fósseis ainda são fundamentais como lastro, mesmo que operem apenas 1–3% do tempo.

    Spinelli reforçou que os reguladores enfrentam pressão em várias frentes: integrar DERs, regular armazenamento, incluir renováveis e evitar subsídios distorcidos. Méndez completou com uma visão sistêmica: mercados precisam de instrumentos que financiem capacidade e inovação, com modelagens realistas em diferentes horizontes temporais.

    A mensagem final foi clara: a regulação é, ao mesmo tempo, ferramenta técnica e soberana.


    Conclusão do Primeiro Dia

    O primeiro dia da X Semana de la Energía em Santiago foi um mergulho profundo nos dilemas e oportunidades da região.

    • Integração regional apareceu como solução estrutural para preços e segurança.
    • O gás natural foi reposicionado como vetor de transição, com papel estratégico para Brasil e Argentina.
    • A regulação da transmissão se mostrou o gargalo central da transição energética.
    • Luiz Barroso trouxe a fala mais impactante, ao traduzir problemas complexos do setor elétrico brasileiro em mensagens claras e acionáveis, com lições aplicáveis a toda a região.
    • O marco regulatório foi reafirmado como elemento-chave: flexível, adaptável e capaz de unir eficiência econômica com justiça social.

    Participar deste primeiro dia reforça a sensação de que a América Latina e o Caribe estão diante de uma oportunidade histórica. O caminho da transição não é linear, mas o evento mostrou que, com coordenação, financiamento e regulação adequada, é possível transformar desafios em liderança global.

  • Agentic AI no Setor Energético: O Futuro da Transição Digital

    Agentic AI no Setor Energético: O Futuro da Transição Digital

    adoção de Agentic AI no setor energético representa mais do que um avanço tecnológico — trata-se de um divisor de águas estratégico. O Brasil e o mundo já vivenciam a pressão por descarbonização, integração acelerada de renováveis e fortalecimento da confiabilidade das redes. Nesse cenário, os agentes digitais autônomos surgem como protagonistas de uma nova etapa da digitalização, capazes de transformar dados em decisões e decisões em ação em tempo real.

    Enquanto a Inteligência Artificial Generativa já trouxe ganhos em produtividade e análise de informações, a Agentic AI inaugura um novo paradigma: sistemas que não apenas respondem a comandos, mas atuam de forma independente, aprendendo continuamente e interagindo em ecossistemas distribuídos.


    O que é Agentic AI e por que importa para o setor energético?

    Agentic AI refere-se a arquiteturas de agentes digitais autônomos que simulam a tomada de decisão humana em sistemas complexos. Diferente de soluções tradicionais de automação, esses agentes:

    • Monitoram processos em tempo real;
    • Tomam decisões autônomas com base em aprendizado contínuo;
    • Interagem com outros agentes e plataformas críticas;
    • Explicam suas escolhas, aumentando a transparência e a confiança.

    Essa lógica, já aplicada em setores como finanças e saúde, começa a se consolidar também na infraestrutura energética, onde a confiabilidade e a resiliência são ativos estratégicos.


    Tendências globais e lições para o Brasil

    Estudos recentes, como o KPMG Futures Report (2025), destacam que o valor da IA migra rapidamente de experimentos isolados para implantações corporativas em larga escala. O setor energético não é exceção. Empresas líderes já testam arquiteturas agentic em smart grids, plantas industriais e operações de trading de energia.

    No Brasil, a oportunidade é ainda maior. Com uma matriz elétrica majoritariamente renovável, mas marcada por gargalos como curtailment em parques solares e eólicos e sobrecarga em linhas de transmissão, a digitalização pode ser o elo que conecta regulação, operação e sustentabilidade.

    👉 Leitura complementar: Transição Energética no Brasil e Oportunidades Estratégicas.


    Aplicações da Agentic AI no setor energético

    A seguir, alguns campos em que a Agentic AI no setor energético já mostra resultados tangíveis:

    1. Óleo e Gás

    • Otimização preditiva de refino e exploração, ajustando parâmetros em tempo real.
    • Monitoramento ambiental contínuo, reduzindo riscos de não conformidade regulatória.
    • Segurança offshore, com agentes monitorando corrosão, pressão e vibração em plataformas.

    2. Smart Grids

    • Balanceamento dinâmico da rede, com agentes atuando em pontos distribuídos.
    • Resposta ativa da demanda, integrando sinais de mercado e consumo local.
    • Resiliência contra falhas e ciberataques, reduzindo a dependência de centros de controle centralizados.

    3. Eletrificação Industrial

    • Planejamento energético em tempo real em setores eletrointensivos.
    • Digital twins para simulação da substituição de combustíveis fósseis por eletrificação.
    • Coordenação autônoma de contratos de energia renovável (PPAs).

    4. Eficiência Energética e ESG

    • Monitoramento contínuo de consumo em edifícios e fábricas.
    • Consolidação de indicadores de carbono e energia em tempo real.
    • Ação como “auditores digitais”, garantindo transparência e reduzindo riscos de greenwashing.

    5. Cibersegurança e Governança

    • Implementação de modelos Zero Trust para ativos críticos.
    • Monitoramento autônomo de tráfego em redes OT (Operational Technology).
    • Justificativa de decisões com mecanismos de Explainable AI (XAI).

    Desafios de implementação no Brasil

    Apesar do potencial, a adoção da Agentic AI no setor energético enfrenta obstáculos relevantes:

    • Integração com sistemas legados (SCADA, EMS, OT), ainda centralizados e pouco flexíveis.
    • Lacunas regulatórias, já que a ANEEL e o ONS ainda não dispõem de frameworks específicos para agentes autônomos.
    • Segurança cibernética ampliada, dado que agentes autônomos aumentam a superfície de ataque.
    • Governança e auditoria, com a necessidade de explicabilidade e métricas claras.
    • Políticas públicas e incentivos, como sandboxes regulatórios e linhas de financiamento, essenciais para acelerar a adoção.

    Métricas de impacto: o que realmente importa

    Para consolidar confiança, é fundamental medir impactos em quatro dimensões:

    • Operacional: redução de OPEX, antecipação de falhas, eficiência de processos.
    • Sustentabilidade: menor curtailment, maior integração de renováveis, redução de emissões.
    • Financeiro: aumento do ROI em PPAs e projetos de hidrogênio verde.
    • Resiliência: maior robustez diante de eventos climáticos e ciberataques.

    Essas métricas transformam a narrativa tecnológica em valor concreto para conselhos e investidores.


    Competências e talentos necessários

    A adoção de Agentic AI no setor energético exige perfis híbridos:

    • IA e sistemas multiagentes: aprendizado por reforço, coordenação de DERs e integração com IA generativa.
    • Engenharia de software: arquiteturas distribuídas, APIs e edge computing.
    • Modelagem energética: digital twins, séries temporais e otimização matemática.
    • DevOps de IA: MLOps e AIOps para manter agentes atualizados e escaláveis.
    • Cibersegurança e governança: Zero Trust, XAI e aderência regulatória.

    Conclusão: um divisor de águas estratégico

    Mais do que uma inovação, a Agentic AI no setor energético é uma transformação estrutural. Ela redefine como empresas operam, como reguladores acompanham e como a sociedade se beneficia de redes mais limpas, confiáveis e inteligentes.

    Executivos e conselhos que anteciparem essa agenda poderão capturar valor não apenas na eficiência operacional, mas também em novos modelos de negócio, transparência regulatória e confiança social. O desafio não é apenas tecnológico: trata-se de construir as bases de governança e competências para que a Agentic AI se torne um pilar da transição energética.

    Leia o artigo técnico completo:

  • Agentic AI e Transição Energética no Brasil

    Agentic AI e Transição Energética no Brasil

    Introdução

    A adoção de Agentic AI no setor energético marca um ponto de inflexão na transição energética em curso no Brasil e no mundo. O setor energético, historicamente caracterizado por infraestruturas pesadas, ativos de longa duração e forte regulação, encontra-se hoje em um ponto de inflexão: de um lado, a pressão por descarbonização e integração acelerada de renováveis; de outro, a necessidade de garantir segurança, confiabilidade e competitividade em ambientes cada vez mais complexos. Nesse contexto, a Inteligência Artificial Generativa representou um primeiro salto, trazendo ganhos em produtividade, personalização de serviços e eficiência operacional. Contudo, a fronteira seguinte começa a se desenhar com clareza: a ascensão da Agentic AI, agentes digitais autônomos capazes de orquestrar processos, tomar decisões em tempo real e interagir com sistemas críticos de forma distribuída. Essa lógica está alinhada ao conceito de ecossistemas de agentes interconectados já discutido pela literatura internacional (Olujimi et al., 2025).

    Fagundes (2025) evidencia que o Brasil já dispõe de uma matriz majoritariamente renovável, mas enfrenta gargalos importantes, como o curtailment em usinas eólicas e solares, a sobrecarga em linhas de transmissão e a falta de flexibilidade nos sistemas de armazenamento. São dilemas que não se resolvem apenas com novos ativos físicos, mas que exigem inteligência digital para integrar, em tempo real, múltiplas variáveis de operação. É exatamente nesse espaço que os agentes autônomos se destacam: ao permitir, por exemplo, que sistemas de baterias (BESS) decidam de forma independente quando armazenar ou liberar energia; que plantas de hidrogênio verde (H2V) coordenem de modo adaptativo seus processos de eletrólise, armazenamento e exportação; ou que microgrids comunitários operem em modo ilhado sem intervenção humana, ajustando geração e consumo de forma autônoma.

    As tendências globais captadas no KPMG Futures Report (2025) reforçam esse movimento. Empresas líderes já perceberam que o valor da IA não está mais apenas na experimentação individual, mas na capacidade de estruturar implantações corporativas, alinhadas à estratégia de negócio e suportadas por dados confiáveis. O passo seguinte, portanto, é preparar terreno para sistemas que vão além do suporte cognitivo e passam a assumir funções decisórias e operacionais. Estudos recentes também destacam que essa mudança exige novas práticas de governança, métricas de avaliação e salvaguardas éticas e regulatórias, sob pena de gerar riscos de confiança, accountability e integração organizacional (Taylor & Francis, 2025; ScienceDirect, 2025).

    No caso brasileiro, esse debate ganha contornos ainda mais relevantes. A agenda de inovação regulatória da ANEEL abre espaço para que o país se torne referência global em soluções de energia digitalizada. O potencial não está apenas na integração de renováveis em larga escala, mas também na eletrificação industrial, na expansão de smart grids e em programas de eficiência energética. Ao incorporar agentes digitais autônomos, esses programas podem alcançar novos patamares de resiliência, reduzindo vulnerabilidades diante de eventos climáticos extremos e ataques cibernéticos, ao mesmo tempo em que abrem caminho para modelos descentralizados de negociação de energia e carbono.

    Mais do que uma evolução tecnológica, a Agentic AI representa um divisor de águas estratégico. Ela cria oportunidades para empresas que desejam capturar valor da transição energética não apenas como fornecedoras de infraestrutura, mas como protagonistas de uma nova era em que dados, algoritmos e governança digital se tornam tão importantes quanto turbinas, linhas de transmissão ou eletrolisadores. Estudos de universidades europeias, como Aalto University (2025) e TU Wien (2025), destacam que se trata de uma mudança estrutural na relação entre humanos e sistemas digitais críticos, com implicações diretas em políticas públicas e estratégias empresariais. O desafio – e a oportunidade – para executivos e conselhos do setor energético é compreender essa mudança e estruturar desde já as competências, arquiteturas e regulações necessárias para uma adoção responsável e escalável.

    Tendências Globais e Insights para o Brasil

    O cenário internacional evidencia uma rápida evolução da inteligência artificial aplicada à energia, migrando de usos pontuais de IA generativa para arquiteturas baseadas em agentes autônomos. Estudos recentes destacam que esses sistemas trazem ganhos de produtividade pela execução paralela de tarefas, maior agilidade organizacional pela implantação flexível de agentes e mitigação de riscos por meio de responsabilidade distribuída (Olujimi et al., 2025; Aalto University, 2025). Ao mesmo tempo, reconhecem os desafios de integração com sistemas legados, sobrecarga de comunicação e implicações de segurança em ambientes críticos (TU Wien, 2025).

    Essa transformação não é apenas técnica, mas estrutural. A literatura sobre governança em ambientes agentic enfatiza a necessidade de regras claras de gestão, métricas de desempenho consistentes e salvaguardas éticas e regulatórias. Esses elementos são fundamentais para evitar vieses, dependência excessiva e decisões opacas, especialmente quando agentes digitais atuam em processos de negócio ou operações críticas (Taylor & Francis, 2025; ScienceDirect, 2025). Relatórios de tendências internacionais também apontam para a emergência de uma “economia agentic”, em que plataformas de agentes autônomos começam a interagir diretamente com mercados e cadeias de valor, dentro de um contexto marcado pelo aumento dos riscos climáticos e pela necessidade de resiliência sistêmica (KPMG, 2025).

    No Brasil, o ponto de partida é singular. O país conta com uma matriz elétrica majoritariamente renovável, mas enfrenta gargalos importantes: o curtailment crescente em parques solares e eólicos, a sobrecarga em linhas de transmissão e a ausência de flexibilidade sistêmica para integrar armazenamento em larga escala (Fagundes, 2025). A digitalização das distribuidoras, com a expansão da medição inteligente e a incorporação de soluções de edge computing, abre espaço para que agentes autônomos atuem em tempo real, otimizando fluxos de potência, reduzindo perdas técnicas e antecipando falhas operacionais.

    As oportunidades estratégicas para o Brasil convergem em quatro direções centrais:

    1. Ampliação da geração renovável (solar e eólica): com suporte de ferramentas digitais de alto valor agregado, capazes de transformar dados em análises operacionais e novos modelos de receita para distribuidoras e comercializadoras (Fagundes, 2025).
    2. Gestão de integração e curtailment: além da expansão física da rede, agentes autônomos em BESS e microgrids podem coordenar despacho ótimo, resposta dinâmica e arbitragem de energia, aumentando a flexibilidade e a confiabilidade do sistema (Olujimi et al., 2025).
    3. Regulação como indutor de inovação: no Brasil, mecanismos de incentivo regulatório — como programas de P&D e ambientes de experimentação — podem acelerar a adoção de agentes autônomos. A atuação de órgãos como ANEEL e ONS será decisiva para garantir interoperabilidade e previsibilidade (KPMG, 2025).
    4. Conexão entre metas nacionais e execução autônoma: a Agentic AI pode transformar compromissos regulatórios em rotinas operacionais auditáveis, encurtando o ciclo entre detecção, decisão e ação, seja em balanceamento de rede, gestão de baterias ou operação de microgrids (Aalto University, 2025; TU Wien, 2025).

    Em síntese, as tendências globais de IA generativa e agentes autônomos se alinham aos vetores estratégicos do setor energético brasileiro. O país reúne condições para capturar valor rapidamente ao combinar dados em tempo real, arquiteturas distribuídas e governança digital. Esse tripé pode encurtar o caminho entre diretrizes regulatórias, metas de política pública e resultados concretos em eficiência, confiabilidade e sustentabilidade (Fagundes, 2025).

    Aplicações da Agentic AI no Setor Energético

    Óleo e Gás

    O setor de óleo e gás, tradicionalmente marcado por operações intensivas em capital e pela exposição a riscos elevados, encontra na Agentic AI uma oportunidade singular de transformação estrutural. Diferentemente das soluções clássicas de automação, os agentes digitais autônomos possuem a capacidade de aprender continuamente, adaptar-se a contextos dinâmicos e tomar decisões em tempo real. Essa autonomia cria novas camadas de resiliência operacional, especialmente em um segmento onde eficiência de margens, segurança e sustentabilidade precisam avançar em paralelo (Olujimi et al., 2025; TU Wien, 2025).

    Um dos campos mais promissores é a otimização preditiva de refino e exploração. Com a crescente digitalização de plantas, agentes podem analisar séries temporais de produção, qualidade de insumos e padrões de demanda para ajustar parâmetros de refino de forma dinâmica, reduzindo desperdícios e maximizando rendimento. Em operações de exploração, agentes autônomos podem integrar dados sísmicos, geológicos e de sensores de perfuração para propor rotas mais seguras e economicamente viáveis. Essa capacidade de interpretar fluxos massivos de dados, aliada à autonomia decisória, encurta o ciclo de planejamento e resposta, ampliando a competitividade em mercados voláteis (KPMG, 2025).

    Outro vetor crítico é o monitoramento ambiental e a conformidade regulatória. À medida que pressões ESG se intensificam e regulações ambientais se tornam mais rigorosas, agentes autônomos podem atuar como “fiscais digitais” permanentes. Esses sistemas processam dados de sensores atmosféricos, marítimos e de efluentes para identificar desvios de conformidade em tempo real, acionando protocolos automáticos de correção ou alertando equipes de campo. Essa abordagem reduz riscos de multas e sanções, ao mesmo tempo em que fortalece a reputação corporativa em um setor constantemente pressionado por questões socioambientais (Fagundes, 2025).

    Por fim, a redução de riscos em operações offshore é talvez o campo mais emblemático. Plataformas marítimas concentram ativos de altíssimo valor, operando em ambientes hostis e com condições variáveis. Agentes digitais podem monitorar continuamente variáveis críticas — vibração, pressão, corrosão e integridade estrutural — para antecipar falhas, recomendar intervenções ou até mesmo acionar sistemas de desligamento preventivo. Além disso, ao operar em rede, múltiplos agentes podem coordenar atividades de manutenção, logística de suprimentos e resposta a emergências, reduzindo a exposição humana a cenários de alto risco (Aalto University, 2025; ScienceDirect, 2025).

    Esses três eixos — otimização preditiva, monitoramento ambiental e mitigação de riscos offshore — evidenciam como a Agentic AI deixa de ser apenas uma promessa tecnológica para se tornar um diferencial estratégico no setor de óleo e gás. Trata-se de criar operações mais seguras, eficientes e alinhadas às pressões regulatórias e ambientais, ao mesmo tempo em que se abrem oportunidades para ganhos financeiros e reputacionais sustentáveis.

    Smart Grids e Eletrificação Industrial

    A transformação das redes elétricas em smart grids constitui um dos pilares mais relevantes da transição energética contemporânea. A penetração crescente de fontes renováveis intermitentes, somada à descentralização da geração, impõe a necessidade de mecanismos sofisticados de balanceamento dinâmico da rede e de resposta ativa da demanda. Nesse cenário, os agentes digitais autônomos emergem como elementos centrais, atuando como controladores distribuídos capazes de processar dados locais, interagir com múltiplos nós da rede e coordenar ajustes quase em tempo real. Essa lógica de funcionamento, já apontada pela literatura recente sobre arquiteturas agentic, combina execução paralela, aprendizado contínuo e governança distribuída — atributos fundamentais para garantir eficiência e resiliência em sistemas complexos (Zhou et al., 2025; Aalto University, 2025).

    O uso de agentes em smart grids vai além do simples despacho. Esses sistemas podem, por exemplo, receber sinais de preço ou instruções de operadores, analisar fluxos locais de carga e geração e decidir instantaneamente se devem acionar cargas flexíveis, ativar baterias distribuídas ou ajustar tarifas dinâmicas para estimular resposta da demanda. Essa inteligência distribuída reduz a dependência de centros de controle centralizados, aumentando a robustez da rede contra falhas técnicas ou ataques cibernéticos. Estudos recentes reforçam que essa descentralização digitalizada é crucial para lidar com riscos climáticos e para ampliar a confiabilidade em sistemas com alta penetração de renováveis (Taylor & Francis, 2025; ScienceDirect, 2025).

    Já a eletrificação industrial representa um desafio distinto, mas complementar. Setores eletrointensivos — como siderurgia, mineração, papel e celulose ou química — passam por forte pressão para reduzir emissões e migrar para processos mais limpos. Nesses ambientes, agentes autônomos podem atuar no planejamento energético em tempo real, avaliando continuamente a demanda de processos, a disponibilidade de contratos de energia renovável (Power Purchase Agreements – PPAs) e o preço horário da eletricidade. Essa coordenação autônoma viabiliza a substituição gradual de combustíveis fósseis por eletrificação, sem comprometer competitividade ou segurança operacional (Fagundes, 2025; KPMG, 2025).

    Um recurso crítico nesse processo é o uso de digital twins industriais, que possibilitam a criação de ambientes de simulação para testar cenários de substituição de combustíveis fósseis por eletrificação. Nesses gêmeos digitais, agentes autônomos podem avaliar impactos sobre eficiência, custos e emissões antes da implementação em campo. Esse mecanismo reduz riscos, acelera a tomada de decisão e permite que empresas ajustem suas estratégias de eletrificação com maior agilidade. A literatura sobre governança em sistemas agentic ressalta, contudo, que tais aplicações só atingem seu pleno potencial quando acompanhadas de métricas de desempenho bem definidas e salvaguardas regulatórias capazes de auditar as decisões tomadas pelos agentes (Aalto University, 2025; Zhou et al., 2025).

    Assim, tanto nas smart grids quanto na eletrificação industrial, a Agentic AI deixa de ser apenas um facilitador tecnológico e assume o papel de orquestrador estratégico, capaz de alinhar operação, sustentabilidade e competitividade. No Brasil, onde a modernização das redes de distribuição e a expansão da eletrificação industrial estão diretamente ligadas às metas regulatórias, a adoção de agentes digitais autônomos pode acelerar o cumprimento de compromissos nacionais de descarbonização e consolidar novas oportunidades de negócio para os setores elétrico e industrial.

    Eficiência Energética e ESG

    A eficiência energética sempre se destacou como um dos caminhos mais imediatos e custo-efetivos para reduzir emissões e ampliar a competitividade industrial. Com a incorporação da Agentic AI, esse campo atinge uma nova dimensão: torna-se possível realizar diagnósticos contínuos em indústrias e edifícios, com agentes digitais autônomos monitorando o consumo em tempo real, identificando padrões anômalos e propondo ajustes automáticos. Diferentemente de auditorias energéticas pontuais, essa abordagem estabelece um processo dinâmico de eficiência, no qual algoritmos de aprendizado por reforço ajustam continuamente equipamentos e sistemas para otimizar o uso de energia (Zhou et al., 2025; Olujimi et al., 2025).

    Além do monitoramento em tempo real, a Agentic AI amplia a capacidade de acompanhamento de KPIs de carbono e energia. Agentes podem consolidar dados dispersos de medidores inteligentes, sensores industriais e sistemas de gestão para gerar relatórios contínuos de indicadores críticos — como intensidade de carbono por unidade de produção, consumo energético por linha de processo ou nível de perdas em sistemas prediais. Esse acompanhamento permanente confere maior robustez às práticas de gestão e permite correções rápidas diante de desvios, aumentando a confiabilidade dos dados reportados a investidores e reguladores (KPMG, 2025).

    Esse aspecto torna-se particularmente relevante no contexto das metas ESG e dos compromissos de descarbonização. Empresas, cada vez mais pressionadas por stakeholders e por marcos regulatórios, necessitam não apenas de objetivos declarados, mas de sistemas de governança digital que garantam rastreabilidade e transparência. Nesse papel, agentes autônomos podem atuar como verdadeiros “auditores digitais”, coletando, verificando e consolidando dados de forma contínua. Essa confiabilidade reduz o risco de greenwashing e fortalece a posição das organizações em mercados cada vez mais sensíveis a critérios ambientais, sociais e de governança (Aalto University, 2025; Fagundes, 2025).

    No caso brasileiro, a combinação de regulação indutora e alta participação de renováveis na matriz cria um cenário especialmente fértil para que a eficiência energética seja um vetor de inovação em ESG. Ao conectar metas regulatórias nacionais com rotinas operacionais automatizadas, a Agentic AI transforma compromissos de descarbonização em resultados tangíveis, oferecendo às empresas um diferencial competitivo frente a investidores globais e cadeias de valor que exigem transparência climática (TU Wien, 2025).

    Assim, a eficiência energética deixa de ser apenas um exercício de redução de custos para se tornar uma estratégia de sustentabilidade corporativa integrada, em que dados, algoritmos e compromissos ESG se unem para fortalecer tanto a performance operacional quanto a reputação empresarial.

    Cibersegurança e Governança

    A crescente digitalização do setor energético expande exponencialmente a superfície de ataque das infraestruturas críticas, tornando a cibersegurança um eixo estratégico tão relevante quanto a própria expansão da geração renovável. Nesse contexto, a Agentic AI pode atuar como camada adicional de defesa, com agentes digitais autônomos capazes de monitorar, detectar e responder a ameaças em tempo quase real. Diferentemente de sistemas tradicionais baseados em assinaturas, agentes treinados em aprendizado contínuo conseguem identificar padrões anômalos de tráfego, acessos suspeitos ou tentativas de intrusão em redes OT (Operational Technology), acionando protocolos de mitigação antes que incidentes se transformem em crises (Zhou et al., 2025).

    Uma das contribuições mais promissoras está na aplicação do conceito de Zero Trust para ambientes energéticos. Agentes autônomos podem executar verificações constantes de identidade, autenticação e autorização em cada interação entre ativos — desde sensores em campo até sistemas SCADA e plataformas de trading. Essa vigilância permanente reduz a probabilidade de ataques laterais e aumenta a resiliência das infraestruturas críticas, especialmente em operações distribuídas, como microgrids e plantas de hidrogênio verde (KPMG, 2025).

    Além da defesa ativa, a Agentic AI abre espaço para governança digital avançada. Ao integrar mecanismos de explainable AI (XAI), agentes podem justificar suas decisões em auditorias, criando um rastro verificável de ações, alertas e respostas. Esse ponto é vital em um setor onde regulação e conformidade são determinantes. Estudos recentes sobre governança em sistemas agentic destacam que auditoria contínua e métricas explícitas de desempenho são essenciais para mitigar riscos de vieses, decisões não transparentes ou falhas de coordenação entre múltiplos agentes (Aalto University, 2025; Olujimi et al., 2025).

    O caso brasileiro reforça essa urgência. A expansão de ativos digitais em distribuidoras e a crescente interconexão entre sistemas elétricos e plataformas de dados criam vulnerabilidades que não podem ser ignoradas. Ao mesmo tempo, a regulação nacional tem buscado induzir a adoção de boas práticas de segurança digital e interoperabilidade, criando uma janela para que agentes autônomos sejam incorporados como instrumentos de conformidade e proteção em ambientes críticos (Fagundes, 2025).

    Em síntese, a Agentic AI não deve ser vista apenas como tecnologia de eficiência operacional, mas também como infraestrutura de confiança, capaz de proteger dados, processos e ativos estratégicos. Ao combinar defesa ativa, zero trust e governança auditável, os agentes autônomos posicionam-se como aliados essenciais na proteção do setor energético contra ameaças cibernéticas e riscos regulatórios.

    AplicaçãoFunção do Agente AutônomoBenefício Estratégico
    Monitoramento de redes OTDetectar padrões anômalos em tráfego de dados e acessos suspeitos em tempo quase real; acionar protocolos automáticos de mitigaçãoRedução do tempo de resposta a incidentes; menor risco de interrupções críticas
    Zero Trust dinâmicoVerificar continuamente identidade, autenticação e autorização em interações entre ativos (sensores, SCADA, trading)Prevenção de ataques laterais; aumento da resiliência em operações distribuídas
    Defesa contra ataques cibernéticos avançadosAprender continuamente novos vetores de ataque e adaptar contramedidas sem necessidade de intervenção manualProteção contra ameaças emergentes; maior confiabilidade da infraestrutura
    Governança auditável com XAIJustificar decisões, registrar logs de ações e criar trilhas verificáveis para auditoria regulatóriaTransparência e rastreabilidade; conformidade com marcos regulatórios
    Supervisão em conformidade ESGConsolidar e validar dados de energia e carbono para auditorias de sustentabilidadeRedução de riscos de greenwashing; fortalecimento da reputação corporativa
    Tabela – Aplicações da Agentic AI no Setor Energético

    Desafios de Implementação no Brasil

    Apesar do enorme potencial da Agentic AI para transformar o setor energético, sua implementação no Brasil enfrenta barreiras estruturais, tecnológicas e regulatórias que precisam ser cuidadosamente endereçadas. Esses obstáculos não anulam a oportunidade, mas indicam que a adoção dependerá de planejamento detalhado, governança robusta e incentivos adequados.

    O primeiro desafio é a integração com sistemas legados, como SCADA, EMS e plataformas OT que sustentam a operação de distribuidoras, transmissoras e plantas industriais. Concebidos em arquiteturas centralizadas e pouco flexíveis, esses sistemas dificultam a conexão com agentes autônomos orientados a eventos e distribuídos. A literatura recente alerta que a sobrecarga de comunicação entre agentes e sistemas existentes pode gerar gargalos, sendo necessário o uso de camadas de middleware e APIs interoperáveis para viabilizar a adoção em larga escala (Olujimi et al., 2025).

    Outro ponto crítico são as lacunas regulatórias. O setor elétrico brasileiro ainda carece de frameworks específicos para agentes autônomos em ambientes críticos, como redes de distribuição, mercados de energia e plantas de hidrogênio verde. Embora haja avanços em frentes como P&D regulado e digitalização, a regulação atual permanece genérica quanto à governança de sistemas agentic. Essa ausência de clareza cria incertezas jurídicas e operacionais, reduzindo a disposição de investidores em financiar soluções digitais de maior complexidade (KPMG, 2025).

    A questão da governança e auditoria de decisões é igualmente central. Como agentes digitais assumem funções críticas, cada ação precisa ser explicável, rastreável e auditável. Sem mecanismos de explainable AI (XAI), há o risco de decisões opacas afetarem a segurança de abastecimento e a confiabilidade do sistema. Estudos destacam a necessidade de objetivos explícitos, métricas de desempenho claras e salvaguardas regulatórias desde o design das soluções para garantir accountability e confiança organizacional (Taylor & Francis, 2025).

    A cibersegurança em ambientes OT constitui outro vetor sensível. A introdução de agentes autônomos expande a superfície de ataque, exigindo novos modelos de defesa digital. Conceitos como Zero Trust, monitoramento contínuo e agentes defensivos especializados tornam-se indispensáveis. Sem essas camadas adicionais, a digitalização pode ampliar a vulnerabilidade das infraestruturas críticas a ataques avançados, um ponto crucial para a resiliência do setor energético brasileiro (ScienceDirect, 2025).

    Por fim, há a necessidade de modelos de incentivo e políticas públicas que viabilizem a adoção em escala. O histórico brasileiro mostra que programas de P&D regulado foram decisivos para a inovação em distribuidoras e geradoras. De forma semelhante, a criação de linhas de financiamento, sandboxes regulatórios e estímulos fiscais pode acelerar a adoção da Agentic AI, posicionando o Brasil como referência internacional em digitalização energética (Fagundes, 2025).

    Em síntese, os desafios de implementação no Brasil não se restringem à tecnologia. Eles envolvem interoperabilidade, regulação clara, governança robusta, segurança cibernética e incentivos adequados. Superá-los é condição necessária para que a Agentic AI se traduza em ganhos reais de eficiência, confiabilidade e sustentabilidade no setor energético.

    Métricas e Impacto Esperado

    A adoção de agentes digitais autônomos no setor energético não deve ser analisada apenas sob a ótica da inovação tecnológica, mas sobretudo pelos resultados concretos que esses sistemas são capazes de entregar. Para consolidar confiança, atrair investimentos e justificar políticas de incentivo, torna-se essencial estabelecer métricas claras e monitorar os impactos em quatro dimensões centrais: operacional, sustentabilidade, financeiro e resiliência.

    Operacional

    Do ponto de vista operacional, agentes autônomos promovem ganhos expressivos de eficiência ao reduzir tempos de resposta, otimizar processos e diminuir custos recorrentes de manutenção. Em distribuidoras e plantas industriais, agentes com aprendizado por reforço podem antecipar falhas em ativos, acionar protocolos preventivos e reduzir o OPEX associado a paradas não programadas. A literatura sobre sistemas multiagentes enfatiza exatamente essa capacidade de encurtar o ciclo detectar–decidir–agir, transformando a gestão reativa em gestão preditiva (Wooldridge, 2021; Rana et al., 2020).

    Sustentabilidade

    Na dimensão da sustentabilidade, os impactos são ainda mais evidentes. Ao coordenar em tempo real o despacho de BESS, plantas de hidrogênio verde (H2V) e microgrids, agentes autônomos viabilizam maior inserção de renováveis na matriz elétrica, reduzindo o curtailment e maximizando o aproveitamento de energia limpa. Isso se traduz diretamente em menores emissões de gases de efeito estufa e em avanços no cumprimento de compromissos de descarbonização. Relatórios recentes já destacam que a adoção de agentes em sistemas energéticos melhora tanto a estabilidade da rede quanto a previsibilidade da integração renovável (KPMG, 2025; Fagundes, 2025).

    Financeiro

    Sob a ótica financeira, a Agentic AI pode ampliar o retorno sobre investimentos (ROI) em contratos de energia renovável e em projetos de hidrogênio verde. Em PPAs, agentes digitais são capazes de avaliar continuamente condições de mercado, ajustando estratégias de arbitragem e reduzindo riscos de exposição. Já em projetos de H2V, os agentes otimizam a cadeia eletrólise–armazenamento–exportação, diminuindo perdas e elevando margens operacionais. Essa capacidade não apenas aumenta a atratividade de projetos em fase inicial, como também reduz barreiras de entrada para financiadores e investidores institucionais (Taylor & Francis, 2025; Fagundes, 2025).

    Resiliência

    Por fim, a resiliência ganha relevância em um cenário marcado por eventos climáticos extremos, oscilações de demanda e riscos cibernéticos. Agentes digitais, ao operarem em rede e de forma distribuída, oferecem robustez adicional contra choques externos, redistribuindo cargas, isolando falhas e reorganizando fluxos energéticos em tempo quase real. Esse atributo é particularmente estratégico no Brasil, onde gargalos de transmissão e vulnerabilidades climáticas exigem soluções digitais que complementem investimentos em infraestrutura física (Olujimi et al., 2025; Fagundes, 2025).

    Em conjunto, essas quatro dimensões — operacional, sustentabilidade, financeiro e resiliência — delineiam o verdadeiro valor da Agentic AI. Mais do que uma evolução tecnológica, trata-se de um novo paradigma de gestão energética, no qual eficiência, competitividade e sustentabilidade convergem, alinhando os interesses de empresas, reguladores e sociedade.

    DimensãoMétricas de AvaliaçãoImpacto Esperado
    OperacionalTempo médio de resposta; Taxa de falhas evitadas; Redução de OPEX em manutençãoGestão preditiva em vez de reativa; redução de paradas não programadas; maior eficiência de processos
    SustentabilidadeCurtailment evitado (%); Participação renovável (%); Redução de emissões (tCO₂eq)Maior inserção de renováveis; menor emissão de GEE; cumprimento de metas de descarbonização
    FinanceiroROI em PPAs (%); Margem operacional em H2V (%); Redução de riscos de exposiçãoOtimização da arbitragem; ganhos em projetos de H2V; maior atratividade para investidores
    ResiliênciaTempo de recuperação (MTTR); Eventos críticos mitigados; Índice de continuidade do fornecimentoRobustez contra choques climáticos e cibernéticos; redistribuição autônoma de cargas; confiabilidade ampliada
    Tabela – Métricas e Impacto Esperado da Agentic AI no Setor Energético

    Competências Híbridas para a Adoção da Agentic AI no Setor Energético

    A adoção da Agentic AI no setor energético exige competências híbridas, combinando profundidade técnica em inteligência artificial, engenharia de software e modelagem energética, com domínio de cibersegurança e governança. Esse perfil multidisciplinar deve ser capaz de transitar entre sistemas críticos, modelos matemáticos, ferramentas digitais e estruturas regulatórias, garantindo que a tecnologia seja aplicada de forma segura, escalável e orientada a resultados.

    Inteligência Artificial e Sistemas Multiagentes

    Profissionais precisam dominar técnicas de aprendizado por reforço, aplicadas ao balanceamento dinâmico da rede elétrica e ao controle de sistemas de armazenamento (BESS). Além disso, arquiteturas de sistemas multiagentes são fundamentais para a coordenação de recursos energéticos distribuídos (DERs) em microgrids. A integração com agentes cognitivos baseados em IA generativa representa um diferencial adicional, permitindo interpretar relatórios técnicos, alarmes e logs operacionais em tempo real (Olujimi et al., 2025; Wooldridge, 2021).

    Engenharia de Software e Arquiteturas Digitais

    É essencial compreender arquiteturas distribuídas e orientadas a eventos, capazes de operar em tempo real, bem como o uso de edge computing para reduzir latência em ativos de campo. A integração via APIs e middleware com sistemas SCADA, EMS e ERPs é um ponto crítico para viabilizar a adoção em larga escala, garantindo interoperabilidade e resiliência (KPMG, 2025).

    Modelagem Energética e Digital Twins

    O domínio de séries temporais é chave para prever demanda e geração renovável, enquanto o uso de digital twins de plantas e redes permite treinar agentes em ambientes simulados antes da aplicação em campo, reduzindo riscos. Além disso, ferramentas de otimização matemática — como programação linear, heurísticas e metaheurísticas — sustentam decisões de despacho ótimo, precificação e operação de contratos (Fagundes, 2025).

    Infraestrutura e DevOps de IA

    A maturidade em MLOps e AIOps torna-se necessária para automatizar o ciclo de vida dos modelos, garantindo atualização contínua em campo. Pipelines energéticos permitem ingestão e curadoria de dados massivos, enquanto o uso de containers e orquestração (Docker, Kubernetes) assegura escalabilidade e confiabilidade dos agentes em operações críticas (Taylor & Francis, 2025).

    Cibersegurança e Governança Digital

    A implementação segura requer adoção de princípios de Zero Trust, com autenticação contínua entre agentes e sistemas críticos, além da incorporação de mecanismos de IA explicável (XAI) para rastrear decisões autônomas. A aderência à conformidade regulatória é indispensável para mitigar riscos em ambientes altamente auditados como o setor elétrico, evitando vulnerabilidades que poderiam comprometer a resiliência nacional (KPMG, 2025).

    CompetênciaFerramentas / TécnicasAplicações no Setor Energético
    IA e MultiagentesAprendizado por reforço; arquiteturas multiagentes; agentes cognitivosBalanceamento de rede; coordenação de DERs; interpretação de relatórios e logs
    Engenharia de SoftwareEdge computing; APIs; middleware; arquiteturas orientadas a eventosIntegração SCADA–EMS–ERP; redução de latência em ativos de campo
    Modelagem EnergéticaSéries temporais; digital twins; programação linear; heurísticasPrevisão de demanda; simulação de eletrificação industrial; despacho ótimo
    Infraestrutura e DevOpsMLOps; AIOps; pipelines de dados; Docker; KubernetesAutomação do ciclo de modelos; escalabilidade de agentes; curadoria de dados massivos
    Cibersegurança e GovernançaZero Trust; XAI; compliance regulatórioProteção de redes OT; auditoria de decisões; conformidade com normas
    Quadro – Ferramentas e Aplicações Práticas

    Checklist de Competências para Adoção da Agentic AI no Setor Energético

    IA e Multiagentes

    ▢ Domínio de aprendizado por reforço para balanceamento de rede e BESS;

    ▢ Conhecimento em arquiteturas multiagentes para coordenação de DERs e microgrids;

    ▢ Integração de agentes cognitivos baseados em IA generativa.

    Engenharia de Software

    ▢ Experiência em arquiteturas distribuídas e orientadas a eventos;

    ▢ Aplicação de edge computing para reduzir latência em campo;

    ▢ Integração via APIs e middleware com SCADA, EMS e ERP.

    Modelagem Energética

    ▢ Capacidade de trabalhar com séries temporais para prever demanda e geração;

    ▢ Uso de digital twins para simulação antes da aplicação em campo;

    ▢ Aplicação de técnicas de otimização (programação linear, heurísticas).

    Infraestrutura e DevOps de IA

    ▢ Maturidade em MLOps e AIOps para atualização contínua de modelos;

    ▢ Construção de pipelines de dados massivos para ingestão e curadoria;

    ▢ Uso de containers e orquestração (Docker, Kubernetes) para escalabilidade.

    Cibersegurança e Governança

    ▢ Adoção de princípios de Zero Trust em ambientes críticos;

    ▢ Implementação de IA explicável (XAI) para auditoria de decisões;

    ▢ Aderência a requisitos regulatórios e de compliance.

    Conclusão

    A ascensão da Agentic AI marca um ponto de inflexão na digitalização do setor energético. Se a inteligência artificial generativa já havia demonstrado ganhos em produtividade e suporte cognitivo, os agentes autônomos vão além: transformam dados em decisões e decisões em ações, operando de forma distribuída, adaptativa e auditável. Para o Brasil, esse avanço não é opcional, mas uma ferramenta crítica para a transição energética, especialmente diante dos desafios de integração de renováveis, curtailment e vulnerabilidades crescentes da rede elétrica (Fagundes, 2025; KPMG, 2025).

    A vantagem competitiva será conquistada por empresas que souberem antecipar a adoção desses sistemas, indo além de pilotos experimentais e investindo na formação de competências internas multidisciplinares. O domínio de aprendizado por reforço, arquiteturas distribuídas, digital twins, MLOps e segurança cibernética tende a ser tão determinante para a operação quanto turbinas, transformadores ou linhas de transmissão (Olujimi et al., 2025; ScienceDirect, 2025).

    Nesse cenário, o Brasil reúne condições únicas para se tornar um laboratório global de inovação em energia digitalizada. A matriz elétrica predominantemente limpa, a experiência regulatória com programas de P&D e a urgência de soluções para transmissão, armazenamento e eficiência energética criam um terreno fértil para a adoção de agentes autônomos. Mais do que acompanhar tendências internacionais, o país pode assumir protagonismo ao demonstrar como inteligência artificial distribuída pode ser integrada a infraestruturas críticas com segurança, eficiência e sustentabilidade (Aalto University, 2025; TU Wien, 2025).

    Em síntese, a Agentic AI não deve ser vista apenas como promessa tecnológica, mas como um divisor de águas estratégico: alinha transição energética, inovação digital e compromissos de descarbonização em uma mesma trajetória. O desafio imediato é transformar essa visão em política pública, estratégia empresarial e competência organizacional — porque, na nova economia da energia, serão os agentes digitais autônomos que orquestrarão a próxima fase da transformação.

    Referências

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    FAGUNDES, Eduardo M. CITEENEL 2025: Transição Energética no Brasil e Oportunidades Estratégicas. São Paulo: efagundes.com, 2025. Disponível em: https://efagundes.com/blog/citeenel-2025-transicao-energetica-no-brasil-e-oportunidades-estrategicas/. Acesso em: 25 set. 2025.

    KPMG. Futures Report 2025: Digital Transformation and Energy Systems. Londres: KPMG International, 2025.

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    RANA, O.; PERERA, S.; CHEN, L. Trust and Accountability in Multi-Agent Energy Systems. Journal of Autonomous Agents and Multi-Agent Systems, v. 34, p. 450-468, 2020.

    SCIENCEDIRECT. Special Issue: Governance and Ethics in Agentic AI for Energy. Elsevier, 2025.

    TAYLOR & FRANCIS. Agentic AI in Critical Infrastructures: Risks and Opportunities. Energy Policy Review, v. 52, p. 88-104, 2025.

    TU WIEN. Digital Resilience and Agentic AI for Energy Systems. Vienna: Technical University of Vienna, 2025.

    WOOLDRIDGE, Michael. Multi-Agent Systems. 2. ed. Oxford: Oxford University Press, 2021.

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