As Medidas Provisórias nº 1.300 e nº 1.304, publicadas em maio e julho de 2025, mudam de forma concreta a lógica de planejamento, investimento e financiamento do setor elétrico. De forma coordenada, elas substituem a contratação obrigatória de térmicas a gás natural por leilões de PCHs e impõem um teto para os encargos da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), além de criar um novo encargo específico para quem se beneficia de subsídios.
Essas medidas não são apenas correções técnicas: elas reposicionam o papel do gás natural, apertam o controle sobre subsídios e reorganizam o fluxo de recursos do setor. Para conselheiros e executivos, isso exige atenção redobrada — não apenas na análise regulatória, mas na revisão de portfólios, contratos e estratégias de atuação institucional.
O que dizem as MPs
A MP 1.300/2025 revoga a cláusula da Lei da Eletrobras que obrigava a contratação de 8 GW de térmicas a gás em regiões sem infraestrutura adequada. Em vez disso, prevê até 3 GW em Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs), com leilões a partir de 2025 e entrada em operação até 2032.
Já a MP 1.304/2025 limita o crescimento da CDE — fundo que sustenta os subsídios do setor — e cria um encargo para os próprios beneficiados. Isso inclui geradores com descontos em TUST/TUSD, cooperativas de geração distribuída e projetos incentivados por políticas anteriores.
As duas MPs têm força de lei imediata, mas precisam ser aprovadas pelo Congresso em até 120 dias. Ainda estão em tramitação inicial, com centenas de emendas protocoladas e pressões vindas de vários setores.
Quem Ganha e Quem Perde
As medidas reorganizam forças no setor. A tabela abaixo resume os efeitos diretos para os principais grupos:
Grupo afetado
Impacto principal
Térmicas a gás natural
Perdem contratos garantidos e enfrentam risco de ociosidade
Petroleiras e operadores de gás
Perdem previsibilidade de demanda firme para justificar infraestrutura
PCHs
Ganham espaço nos leilões, mas passam a pagar encargo
Geradores com subsídios
Precisam rever estrutura de retorno diante de nova cobrança
Grandes consumidores (ACL)
Tendem a se beneficiar com menor pressão tarifária e mais previsibilidade
Distribuidoras
Ganham estabilidade na repasse tarifário, mas precisam se adaptar
O que muda no papel do gás natural
Antes das MPs, o gás natural era considerado peça obrigatória no crescimento da geração elétrica. Essa demanda forçada justificava investimentos em usinas, gasodutos e terminais. Agora, o gás passa a ser usado de forma mais flexível — apenas quando necessário — como recurso de apoio ao sistema. Isso muda sua atratividade financeira. Projetos baseados em uso contínuo precisam ser revistos. O foco se desloca para aplicações industriais, cogeração, datacenters e backup de cargas críticas.
Novas Regras para Subsídios e Encargos
A CDE, que bancava os descontos e incentivos para fontes renováveis, passa a ter um teto. Isso significa que seu crescimento será limitado a partir de 2026, o que traz alívio para os consumidores — especialmente os do mercado livre. Em paralelo, os beneficiários desses subsídios passam a ser cobrados por um novo encargo. Isso inclui PCHs, projetos de geração distribuída, eólica offshore e biomassa com incentivo. O objetivo é corrigir distorções e evitar que o peso da conta recaia sobre quem não participa dos benefícios.
Tema
Antes das MPs
Com as MPs 1.300 e 1.304
Térmicas inflexíveis
Obrigatórias por lei, mesmo sem mérito econômico
Substituídas por leilões de PCHs com menor custo global
Gás natural no setor elétrico
Demanda estruturante e inflexível
Uso pontual, como flexibilidade ou backup
Conta CDE
Sem limite real, crescia com cada novo subsídio
Passa a ter teto orçamentário
Subsídios
Custos bancados por todos os consumidores
Encargo específico para os agentes beneficiados
Riscos na Tramitação: Conflitos e Pressões
No Congresso, as MPs enfrentam pressões de vários grupos com interesses distintos. Parlamentares ligados às térmicas, petroleiras, cooperativas de energia e projetos regionais buscam alterar os textos com emendas. Por outro lado, entidades como ABRAGEL, ABRACE, ABRADEE e parte do governo tentam manter o núcleo da proposta — com foco em eficiência econômica, previsibilidade tarifária e transição energética ordenada.
A disputa gira em torno de três pontos principais:
Reintrodução das térmicas por razões regionais ou políticas.
Flexibilização do teto da CDE por meio de exceções.
Redução ou suspensão do encargo para beneficiados por subsídios.
Plano de Ação Recomendado
Para conselheiros e executivos, este é o momento de agir com clareza e visão de médio prazo. As decisões regulatórias estão abertas e podem mudar o equilíbrio do setor nos próximos anos.
Ações recomendadas:
Revisar o portfólio de geração, com atenção especial para ativos térmicos e projetos de gás com demanda inflexível.
Atualizar projeções de retorno de empreendimentos subsidiados, já considerando o novo encargo e o teto da CDE.
Recalibrar estratégias de expansão com foco em fontes híbridas, flexíveis e competitivas no mérito técnico-econômico.
Acompanhar de perto a tramitação no Congresso, inclusive com mapeamento de parlamentares e monitoramento das comissões mistas.
Engajar-se institucionalmente por meio das entidades representativas (ABRAGEL, ABRACE, ABRADEE, ABRAGET, ABEEólica, ABIOGÁS, ABSOLAR), reforçando posicionamentos técnicos baseados em dados e modicidade tarifária.
Reforçar a comunicação com investidores, conselhos e diretoria, destacando riscos regulatórios, transição estratégica e oportunidades de realinhamento de capital.
Conclusão
As MPs 1.300 e 1.304 inauguram uma nova fase de transição regulatória no setor elétrico. Elas colocam fim a obrigações distorcidas, abrem espaço para fontes mais competitivas e trazem mais responsabilidade fiscal para a estrutura de encargos. O momento exige leitura estratégica, agilidade e posicionamento técnico. Quem entender o novo jogo mais cedo poderá realinhar seu portfólio com vantagem — e evitar ser surpreendido por ativos obsoletos ou contratos insustentáveis.
Análise Tática para Gestores Técnicos e Administrativos
Introdução: A Transição de um Setor Regulado para um Setor com Mérito Econômico
O setor elétrico brasileiro vive, em 2025, um dos momentos mais significativos de reorganização institucional desde a reformulação introduzida pela Lei nº 10.848/2004. A publicação das Medidas Provisórias nº 1.300 e nº 1.304, respectivamente em maio e julho deste ano, marca não apenas uma revisão de políticas públicas anteriores, mas um movimento coordenado para redefinir os fundamentos sobre os quais o setor opera — especialmente no que diz respeito à expansão da oferta, à gestão dos encargos setoriais e à previsibilidade dos custos para os consumidores.
As duas MPs atuam em frentes complementares, mas profundamente interligadas. A MP nº 1.300 revoga dispositivos da Lei nº 14.182/2021 (a chamada Lei da Eletrobras), que obrigavam a contratação de 8 GW de usinas termelétricas a gás natural em regiões carentes de infraestrutura, independentemente de critérios técnicos de despacho, localização ou custo marginal. A nova diretriz substitui essa obrigação por leilões de reserva de capacidade baseados em menor custo global, priorizando Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) com entrada em operação prevista a partir de 2032. O objetivo declarado é realinhar o planejamento da expansão à lógica econômica e operacional do Sistema Interligado Nacional (SIN), rompendo com decisões anteriores motivadas por articulações políticas regionais e compromissos orçamentários externos ao setor.
Já a MP nº 1.304 responde à crescente pressão sobre a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), que nos últimos anos passou a abrigar uma série de incentivos, subsídios e compensações para fontes renováveis, consumidores rurais, programas sociais e obrigações setoriais. Ao estabelecer um teto para o crescimento dos encargos e criar um encargo adicional a ser pago pelos próprios agentes beneficiados, essa medida introduz um novo paradigma de responsabilidade fiscal e equilíbrio setorial. A mudança ocorre em meio à controvérsia gerada pela derrubada de vetos à Lei das Eólicas Offshore (Lei nº 14.403/2022), que havia ampliado os subsídios sem o devido ajuste nos mecanismos de financiamento.
Mais do que alterações pontuais, essas MPs representam uma transição clara: o setor elétrico caminha de um modelo em que decisões estratégicas eram condicionadas por imposições regulatórias, obrigações de contratação e incentivos pouco transparentes, para um ambiente no qual o mérito econômico, a previsibilidade tarifária e a disciplina fiscal tornam-se princípios estruturantes. O planejamento deixa de ser orientado por reservas obrigatórias, e passa a considerar critérios de otimização técnica e financeira — abrindo espaço para um mercado mais eficiente, mas também mais exigente em termos de análise de risco, modelagem de investimentos e governança regulatória.
Para os gerentes técnicos e administrativos, essa transição exige não apenas uma atualização do repertório regulatório, mas uma atuação ativa na reestruturação de carteiras de projetos, revisão de contratos de suprimento, recalibragem de projeções de viabilidade e monitoramento sistemático das decisões que virão do Congresso Nacional, da ANEEL, da CCEE e do Ministério de Minas e Energia (MME). Em muitos casos, caberá a essas áreas fornecer o suporte analítico necessário para que diretores e conselheiros compreendam os impactos financeiros, operacionais e reputacionais associados à aprovação — ou eventual modificação — dessas medidas.
O presente artigo, estruturado de forma aplicada, busca apoiar esse trabalho. Ao longo das seções seguintes, abordaremos os efeitos práticos das duas MPs sobre ativos térmicos, contratos de gás natural, projetos com subsídios, modelagem tarifária e estratégias de posicionamento institucional. A ideia central é oferecer um instrumento técnico para diagnóstico interno e planejamento de ações, capaz de fortalecer a capacidade das empresas em navegar um cenário regulatório que, ao mesmo tempo em que se torna mais racional, também se mostra mais competitivo e sujeito a disputas políticas relevantes.
Panorama Geral das MPs e os Efeitos para a Governança Interna
As Medidas Provisórias nº 1.300 e nº 1.304 não operam isoladamente. Elas representam dois movimentos articulados: o primeiro visa corrigir distorções no planejamento da expansão da oferta de energia; o segundo, reequilibrar a base de financiamento do setor elétrico. Combinadas, essas mudanças afetam diretamente o núcleo da governança interna das empresas — do planejamento energético ao compliance regulatório, passando por decisões de CAPEX, renegociação contratual e revisões de modelagem de retorno financeiro.
Para os gerentes das áreas técnicas e administrativas, compreender essas medidas em detalhe é essencial para antecipar riscos, ajustar estratégias de médio prazo e alinhar a empresa a um novo ciclo regulatório mais pautado por eficiência e transparência.
MP 1.300: Fim da Obrigação das Térmicas Inflexíveis e Redefinição da Expansão
A Medida Provisória nº 1.300/2025 revoga o artigo 5º da Lei nº 14.182/2021, que estabelecia a obrigatoriedade de contratação de 8 GW de usinas termelétricas movidas a gás natural, em localizações específicas (Norte, Nordeste, Centro-Oeste, Norte de MG e ES), com operação inflexível e obrigatória até 2036. Essas usinas seriam contratadas fora da lógica de despacho por mérito, o que implicava operação constante, mesmo quando não fossem competitivas economicamente.
Com a MP, essa obrigação é substituída por até 3 GW de PCHs a serem contratadas por leilões na modalidade de reserva de capacidade, orientados por menor custo global — conceito que considera não apenas o preço da energia ofertada, mas também o custo sistêmico de operação, perdas, serviços ancilares e impacto tarifário agregado. A entrada em operação das novas unidades está prevista para o período entre 2032 e 2036, respeitando o horizonte originalmente previsto para as térmicas, mas com uma lógica contratual e operacional distinta.
Conceito chave: O que são térmicas inflexíveis?
São usinas que, por contrato ou por imposição regulatória, devem operar continuamente, independentemente do custo do despacho. Diferem das térmicas por mérito, que só operam quando o preço da energia no mercado justifica sua ativação. A inflexibilidade reduz a eficiência do sistema, aumenta o custo marginal e gera sobrecontratação de energia, impactando diretamente a tarifa.
Implicações operacionais e contratuais para as empresas:
Empresas com projetos térmicos já contratados ou em processo de licenciamento perdem o lastro legal que garantia demanda certa.
Contratos de suprimento de gás natural (sobretudo take-or-pay) perdem sustentação, com risco de judicialização ou renegociação compulsória.
Financiadores e investidores que calcularam retorno com base em PPA garantido precisam revisar premissas de viabilidade.
Empresas integradas verticalmente (gás-geração) enfrentam risco de ociosidade da cadeia de suprimento.
A MP 1.300 reorienta o planejamento da expansão para fontes com menor impacto ambiental, maior competitividade e menor custo sistêmico. Ela também introduz o conceito de leilão por eficiência e, indiretamente, favorece ativos com flexibilidade operacional — como PCHs, usinas híbridas, cogeração e ativos despacháveis sob demanda.
MP 1.304: Teto para a CDE e Novo Encargo para Beneficiários de Subsídios
A Medida Provisória nº 1.304/2025, por sua vez, trata do financiamento do setor. Ela surge após a repercussão da derrubada de vetos à Lei nº 14.403/2022, que aumentou os incentivos à geração eólica offshore e a outras fontes incentivadas, pressionando o orçamento da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE). Com os custos da CDE se aproximando de R$ 35 bilhões ao ano — e crescendo em ritmo superior à inflação —, cresceu a demanda por uma reforma que limitasse sua expansão desordenada e redistribuísse os encargos com mais equidade.
A MP impõe um teto financeiro à CDE a partir de 2026. O valor exato será fixado anualmente na Lei Orçamentária, com base em projeções do Ministério de Minas e Energia e da ANEEL, mas não poderá ultrapassar os limites estabelecidos pela MP. O teto visa trazer previsibilidade tarifária para consumidores e distribuidoras, além de forçar maior disciplina na concessão de novos subsídios.
Mais importante ainda, a MP cria um novo encargo específico a ser pago por agentes que se beneficiam de incentivos custeados pela própria CDE. Entre esses agentes, destacam-se:
Geradores incentivados (com desconto em TUST/TUSD);
Cooperativas e consórcios de geração distribuída;
Produtores independentes com isenções regionais;
Usinas eólicas offshore com tratamento especial.
Implicações diretas para a estrutura financeira das empresas:
Redução da margem líquida de projetos com subsídio, já que parte do benefício será compensado por um novo encargo;
Necessidade de revisão dos fluxos de caixa projetados, sobretudo em modelos que consideram retorno de longo prazo com base em incentivos mantidos indefinidamente;
Risco de mudança na estrutura de PPAs — contratos já assinados poderão sofrer reequilíbrio se a alteração regulatória for considerada relevante;
Impacto na precificação de novos projetos, com necessidade de refletir o encargo nos lances de leilões e nos contratos com consumidores finais.
A proposta atende à demanda histórica de grandes consumidores e associações como a ABRACE por maior justiça tarifária, uma vez que os subsídios antes bancados por toda a coletividade passam a ser parcialmente internalizados pelos próprios beneficiários. Do ponto de vista da política pública, representa uma tentativa de compatibilizar incentivos à transição energética com responsabilidade fiscal e sustentabilidade do modelo setorial.
Tema
Situação anterior às MPs
Situação após as MPs 1.300/1.304
Contratação de térmicas a gás
Obrigatória por lei (8 GW) até 2036, com operação inflexível
Substituída por até 3 GW em PCHs via leilões de reserva de capacidade
Expansão da CDE
Sem teto, com crescimento acelerado e sem correção de origem
Teto financeiro fixado; CDE passa a obedecer a limites orçamentários
Benefício a fontes incentivadas
Benefício líquido garantido, sem contrapartida financeira direta
Novo encargo criado para beneficiados diretos dos subsídios
Papel do gás natural
Central e obrigatório no planejamento de expansão
Reposicionado como fonte de flexibilidade e segurança marginal
Diagnóstico Interno: Quais São os Ativos e Contratos Sensíveis
A reconfiguração regulatória imposta pelas MPs 1.300 e 1.304 exige um movimento interno de reavaliação estratégica nas empresas do setor elétrico, e também naquelas que consomem energia ou mantêm participação em projetos incentivados. Esse diagnóstico não se limita à análise de impacto regulatório genérico, mas deve ser conduzido com profundidade operacional, envolvendo áreas técnicas, regulatórias, financeiras e jurídicas.
Mais do que compreender a mudança, é essencial identificar como ela se reflete nos ativos reais e nas estruturas contratuais da empresa — seja no lado da geração, seja no consumo industrial ou nas operações de autoprodução. Essa etapa é a base para qualquer plano de reestruturação de carteira, revisão de contratos de suprimento, reprecificação de PPAs ou adequação de estruturas societárias.
Avaliação Técnica de Ativos Térmicos e Projetos Gás-dependentes
A MP 1.300 elimina a garantia legal de contratação de térmicas inflexíveis a gás, exigindo uma nova lógica de análise para ativos térmicos — operacionais, em construção ou em fase de estruturação. Isso afeta diretamente a viabilidade econômica de projetos com base em operação contínua, e compromete o racional de investimento de termelétricas localizadas em áreas remotas, antes viabilizadas por imposição legal.
Abaixo, apresentamos um conjunto de perguntas críticas que devem guiar esse diagnóstico técnico:
Checklist de análise operacional – Ativos térmicos e gás
A empresa opera ou possui projetos de térmicas com base em despacho inflexível (obrigatório)?
Os contratos de suprimento de gás natural associados são do tipo take-or-pay (volume mínimo garantido)? Qual é a exposição contratual em termos de volume e tempo?
A usina apresenta competitividade em cenários de despacho por mérito, considerando o custo variável unitário (CVU)?
Há obrigações regionais assumidas por meio de convênios, protocolos de intenção ou contrapartidas vinculadas à operação da térmica (como ICMS, emprego, royalties)?
Essas perguntas ajudam a quantificar o risco de obsolescência contratual e a necessidade de reposicionamento estratégico de ativos. A lógica da expansão muda: térmicas que antes operavam continuamente agora precisam competir com fontes mais baratas e flexíveis. O gás natural, nesse novo contexto, deixa de ser âncora da expansão e passa a ser fonte de flexibilidade — algo que exige outros modelos operacionais e contratuais.
Ação recomendada:
Desenvolver cenários de curto e médio prazo, simulando a viabilidade do ativo em condições reais de despacho por mérito (sazonalidade, pico de carga, resposta à renovável intermitente).
Revisar os contratos de fornecimento de gás, considerando renegociação de cláusulas de volume mínimo, flexibilização de entrega ou transformação em contrato interruptível.
Avaliar a possibilidade de reposicionar a planta como backup ou geração complementar, considerando oportunidades em mercados específicos como datacenters, indústrias eletrointensivas, ou sistemas isolados com carência de capacidade firme.
Revisão de Projetos com Subvenção Cruzada (PCHs, GD, Renováveis)
A MP 1.304 traz uma mudança relevante na forma como os benefícios setoriais são financiados. Até agora, agentes que se beneficiavam de isenções — como descontos em TUST/TUSD, compensação integral de energia ou incentivos regionais — não arcavam diretamente com os custos desses subsídios. Com a introdução de um novo encargo direcionado especificamente aos beneficiários, será necessário recalcular o valor líquido desses incentivos.
Esse impacto é especialmente sensível para PCHs, usinas incentivadas do PROINFA, empreendimentos de geração distribuída sob o modelo de cooperativas e consórcios, além de geradores regionais com tratamento fiscal diferenciado.
O diagnóstico deve começar por responder às seguintes questões:
Itens críticos para avaliação – Projetos incentivados
Qual é a parcela do retorno do projeto que depende do desconto em TUST/TUSD ou de outros subsídios via CDE?
A empresa atua em geração distribuída incentivada (Art. 26 da Lei 14.300)? Está vinculada a cooperativas ou consórcios que operam sob o regime de compensação integral?
Qual o peso efetivo da CDE na estrutura de custos operacionais ou no fluxo de caixa do projeto? Existe uma linha de receita comprometida com isenções?
A empresa ou o projeto estão sujeitos à nova cobrança setorial sobre agentes beneficiados, conforme previsto na MP 1.304?
Projetos com retorno estreito ou alta dependência de incentivos cruzados podem perder viabilidade. A antecipação dessa análise é crítica para empresas que atuam na originação ou comercialização de projetos renováveis, fundos de investimento e integradores de GD. Além disso, a criação do encargo sobre os beneficiários introduz um novo fator de incerteza regulatória nos modelos de precificação de energia e estruturação de PPAs de longo prazo.
Ação recomendada:
Recalcular todos os indicadores financeiros chave (TIR, VPL, payback), incorporando o impacto estimado do novo encargo. Considerar variações por tipo de ativo e faixa de potência.
Reavaliar o pipeline de projetos em desenvolvimento, priorizando empreendimentos com menor dependência de subsídios ou maior margem operacional.
Revisar cláusulas de PPAs já assinados, especialmente aquelas relativas à mudança de legislação e equilíbrio econômico-financeiro.
Considerar modelos híbridos (ex.: PCH + bateria, GD com armazenamento) que possam oferecer maior valor sistêmico e segurança regulatória em leilões futuros.
Cálculos Operacionais para Apoio à Alta Direção
A consolidação das MPs 1.300 e 1.304 no arcabouço regulatório não exige apenas entendimento jurídico ou estratégico. Ela demanda, sobretudo, capacidade de modelar os efeitos reais sobre a tarifa, o fluxo de caixa dos projetos e a competitividade das fontes incentivadas.
As áreas técnicas e administrativas devem se antecipar aos efeitos financeiros, tarifários e regulatórios por meio de simulações paramétricas, ajustando projeções de longo prazo, revisando PPAs e integrando riscos regulatórios à análise de sensibilidade. A seguir, são apresentados dois blocos de cálculo prioritários para apoiar a alta gestão.
Modelagem de Impacto da MP 1.304 sobre a CDE
A criação de um teto financeiro para a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) exige reavaliação das curvas de custo de energia, pois limita o volume de subsídios setoriais repassados aos consumidores. Isso interfere diretamente no valor das tarifas para os consumidores cativos e, indiretamente, no custo de energia de referência do mercado livre.
Embora o valor exato do teto seja definido anualmente, a MP antecipa uma tendência de crescimento nominal moderado, abaixo da inflação e condicionado à capacidade fiscal da União.
Abaixo, uma estrutura simplificada com projeções nominais da CDE para os próximos anos:
Ano
Teto CDE (R$ bilhões)
% Crescimento Máximo
Comentário
2026
35,0
0%
Teto nominal fixo inicial
2027
36,0
2,9%
Correção moderada
2028
37,0
2,8%
Estabilidade gradual
2029
38,1
3,0%
Alinhado à inflação de meta
2030
39,3
3,1%
Projeção com base conservadora
Esses valores devem ser comparados com os cenários pré-MP, em que o crescimento da CDE superava 8% ao ano, em função de novas políticas públicas, incentivos setoriais, compensações sociais e expansão da GD sem cobrança integral de encargos.
Simulação recomendada para as empresas:
Projetar o custo médio da energia (R$/MWh) para consumidores cativos e livres, considerando dois cenários:
(a) manutenção da tendência anterior da CDE (sem teto);
(b) aplicação do novo teto e redistribuição do encargo aos beneficiários.
Avaliar impacto nas tarifas de uso (TUSD/TUST) e nos encargos repassados às comercializadoras e consumidores industriais, especialmente em contratos indexados a custos regulatórios.
Cenário Tarifário – ACL (projeção 2026)
CDE sem teto
CDE com teto (MP 1.304)
Encargo médio estimado (R$/MWh)
47,00
36,00
Redução esperada na tarifa final (%)
–
~5%
Esse tipo de modelagem é essencial para consumidores livres, autoprodutores e comercializadoras, que precisam precificar ofertas futuras e avaliar competitividade frente a PPAs convencionais ou novos modelos híbridos.
Estimativa de Custo Efetivo dos Novos Encargos por Fonte
A outra frente de cálculo prático introduzida pela MP 1.304 diz respeito ao novo encargo aplicado diretamente aos agentes que recebem incentivos da CDE. Essa medida, inédita no setor, rompe com o histórico de subsídios não onerados e estabelece um novo parâmetro: quem recebe, contribui.
Essa lógica exige o recálculo dos benefícios líquidos que justificam projetos em operação e em estruturação. O impacto será diferente conforme a fonte, o volume do subsídio, o porte da planta e o regime tributário envolvido.
Com a criação do novo encargo setorial proposto pela MP 1.304/2025 — a ser aplicado diretamente aos agentes que se beneficiam de subsídios financiados pela Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) — torna-se essencial estimar os impactos líquidos dessa mudança sobre diferentes perfis de projetos incentivados. A tabela a seguir apresenta uma projeção preliminar do efeito econômico esperado por tipo de fonte, comparando o benefício regulatório atualmente usufruído (como isenções de TUST/TUSD e repasses via CDE) com o encargo adicional previsto a partir de 2026. Embora os valores sejam indicativos e sujeitos à regulamentação específica, eles fornecem uma base útil para simulações internas de viabilidade, reprecificação de PPAs e reavaliação do portfólio. Trata-se de um exercício estratégico que visa antecipar a redistribuição de encargos e apoiar a gestão na tomada de decisões alinhadas ao novo equilíbrio regulatório.
Fonte Incentivada
Benefício Atual Estimado
Novo Encargo (2026)
Efeito Líquido Esperado
PCH
R$ 120/MWh (TUST + isenção CDE)
R$ 20/MWh
Redução de margem operacional, mas ainda viável
Eólica offshore
R$ 160/MWh (benefícios específicos)
R$ 30/MWh
Necessidade de reprecificação e revisão de PPAs
GD cooperativa
R$ 100/MWh (compensação integral)
R$ 15/MWh
Risco de retração em regiões com baixa escala
Esses valores são apenas indicativos e variam conforme a localização, arranjo contratual, volume de energia produzida e estrutura societária.
Ação recomendada:
Atualizar planilhas de viabilidade com o encargo incorporado aos custos operacionais. Avaliar impacto no retorno esperado (TIR) e no VPL residual.
Identificar o ponto de equilíbrio econômico após o novo encargo — o que pode afetar decisões de continuidade de projetos, venda de ativos ou realocação de CAPEX.
Incluir margens regulatórias adicionais em novos contratos (PPAs, fornecimento, consórcios) como forma de precaução frente à volatilidade regulatória e à possível judicialização do encargo.
Preparar notas explicativas para os conselhos com a nova estrutura de custos e riscos, acompanhadas de cenários realistas para os próximos cinco anos.
Conclusão
A racionalização da CDE e a redistribuição dos encargos promovem um novo modelo de custos setoriais mais previsível, mas exigem mudança de postura na análise de viabilidade. Projetos que antes eram considerados rentáveis apenas pelo volume de subsídio agora devem sustentar-se com eficiência operacional, flexibilidade e integração tecnológica.
As empresas que anteciparem esses cálculos e incorporarem esses parâmetros aos seus modelos terão vantagem competitiva, evitarão surpresas contratuais e conseguirão apresentar aos seus conselhos um plano estratégico robusto e compatível com o novo marco regulatório.
Monitoramento Político-Regulatório: O que Observar
A aprovação das Medidas Provisórias nº 1.300 e nº 1.304 até novembro de 2025 exigirá não apenas sustentação técnica, mas também articulação política e institucional ativa. Ambas as MPs foram publicadas com força de lei imediata, conforme prevê o artigo 62 da Constituição Federal, mas sua continuidade depende da aprovação pelo Congresso Nacional dentro do prazo de 120 dias — prorrogável automaticamente por mais 60. Findo esse prazo sem deliberação, as MPs perdem eficácia, com risco de retorno automático ao marco anterior ou judicialização.
Neste contexto, o monitoramento político-regulatório passa a ser uma função crítica nas empresas do setor energético — tanto no planejamento estratégico como na atuação tática de curto prazo. Não se trata apenas de acompanhar o processo legislativo, mas de interpretar corretamente as correlações de forças, os riscos de emendas desestruturantes e as oportunidades de alinhamento institucional com agentes favoráveis à modernização do setor.
Pressões em Jogo: Onde Estão os Conflitos?
As MPs tocam em temas sensíveis que mobilizam diferentes frentes parlamentares, setores econômicos e interesses regionais. A seguir, destacam-se os principais grupos que vêm exercendo pressão sobre a tramitação legislativa:
Grupo de Pressão
Motivação Principal
Parlamentares de estados com térmicas
Reação à perda de projetos locais, investimentos esperados e obrigações contratuais associadas ao gás
Frentes cooperativistas e do agro
Defesa da geração distribuída rural com compensação integral e isenção total de encargos
Pressão por manutenção de obras, empregos e ICMS vinculados a térmicas e infraestrutura de gás
Esses grupos tendem a apresentar emendas que reintroduzem obrigações de contratação de térmicas, criam exceções ao teto da CDE, ou atenuam o encargo para beneficiários de subsídios. Algumas dessas propostas possuem forte apelo político regional, mesmo que contrárias à lógica técnica das MPs.
O Que Deve Ser Monitorado Diariamente
Para apoiar a diretoria e os conselhos em decisões oportunas, as áreas técnicas, jurídicas e de relações institucionais devem acompanhar quatro frentes prioritárias no Congresso:
Designação dos relatores das comissões mistas
A escolha dos relatores é crítica, pois define a condução política da tramitação. Relatores alinhados à agenda de modernização tendem a manter o texto original com ajustes pontuais. Já relatores oriundos de estados térmicos ou ligados a cooperativas podem apresentar relatórios substitutivos com alto risco de desconfiguração.
Recomendação: identificar os nomes cotados para relatoria e verificar histórico de votações, discursos públicos e vínculos regionais com os setores afetados.
Número e conteúdo das emendas apresentadas
Mais de 600 emendas já foram protocoladas à MP 1.300, muitas com intuito de reverter o fim da obrigação das térmicas ou preservar regimes de exceção para agentes específicos. Algumas propõem até a criação de novos subsídios.
Recomendação: mapear emendas por tema e impacto potencial, criando uma matriz de risco com base no grau de alteração da MP, apoio parlamentar e efeito tarifário.
Participação da Casa Civil e Ministério da Fazenda nas articulações
A presença ativa do Executivo — especialmente da equipe econômica e da Casa Civil — é decisiva para manter o foco fiscal das MPs. O apoio técnico da ANEEL, da CCEE e do MME também será relevante nas audiências públicas.
Recomendação: acompanhar comunicados oficiais e bastidores de reuniões com lideranças da base governista, entidades do setor e parlamentares estratégicos.
Audiências públicas e posicionamentos das associações técnicas
Associações como ABRAGEL, ABRACE, ABRADEE, ABRAGET, ABEEólica, ABIOGÁS e ABSOLAR desempenham papel relevante na sustentação técnica da MP. Suas manifestações em audiências públicas, notas técnicas e articulações junto ao Congresso ajudam a balizar o debate e contrabalançar pressões setoriais.
Recomendação: participar, acompanhar ou apoiar tecnicamente essas entidades; preparar position papers internos e eventualmente contribuições escritas às comissões.
Sinais de Risco: O Que Pode Desconfigurar a MP
Embora a MP 1.300 traga racionalidade ao planejamento elétrico e a MP 1.304 introduza equilíbrio fiscal, ambas podem ser desfiguradas por dispositivos como:
Reintrodução da obrigatoriedade de contratação de térmicas, sob novo nome (ex: “flexibilidade regional” ou “projetos estruturantes”);
Criação de exceções ao teto da CDE para fontes ou regiões específicas;
Exclusão de certos agentes do novo encargo, enfraquecendo o princípio de equidade;
Inclusão de novas obrigações de compra ou reserva para distribuidoras, desestabilizando o modelo do ACL.
Por isso, o acompanhamento do texto substitutivo do relator é crucial. A aprovação de uma MP alterada pode gerar efeito inverso ao desejado pelo governo — ampliando encargos, criando insegurança jurídica e reduzindo previsibilidade para investidores.
Apoio à Alta Gestão e Conselhos: Como Levar a Discussão
A aprovação ou rejeição das MPs 1.300 e 1.304 não é apenas uma questão legislativa — trata-se de um ponto de inflexão com potencial de afetar diretamente o valor de ativos, a viabilidade de contratos e a lógica de expansão de empresas no setor energético. Nesse contexto, os gerentes técnicos, regulatórios e administrativos assumem um papel central na qualificação do debate interno e na preparação de insumos para conselheiros e executivos seniores.
A atuação dessas áreas não se limita à coleta de dados ou monitoramento regulatório passivo. Pelo contrário: é esperado que funcionem como hubs analíticos e interpretativos, traduzindo o ambiente normativo em cenários comparáveis, planos de ação práticos e recomendações justificadas, alinhadas à estratégia corporativa.
A seguir, organizamos quatro frentes de trabalho fundamentais para levar essa discussão à alta gestão com consistência, clareza e foco em decisão.
Construção de Cenários de Risco Regulatório
Uma das perguntas mais críticas a ser feita em reuniões com conselhos e comitês executivos é:
“O que acontece com o retorno esperado dos nossos projetos se as MPs forem modificadas ou rejeitadas?”
Responder a essa questão exige cenários parametrizados, que considerem:
A permanência ou não da obrigação de contratação de térmicas;
A manutenção, revisão ou exclusão do novo encargo proposto na MP 1.304;
O teto da CDE sendo aprovado, desfigurado ou revertido por pressão parlamentar.
Esses cenários devem ser estruturados com modelagem de impacto nos principais ativos, combinando indicadores financeiros (VPL, TIR, payback) com sensibilidade a custos regulatórios e mudanças contratuais.
Exemplo de cenário
Hipótese-chave
Efeito esperado
Base
MPs aprovadas integralmente
Redução de encargos, viabilidade de novos PPAs
Adverso 1
Rejeição da MP 1.300
Retorno da obrigação de térmicas; reativação de projetos ineficientes
Adverso 2
Teto da CDE desfigurado por exceções
Pressão tarifária contínua e redução de previsibilidade
Adverso 3
Encargo excluído para GD
Reforço de distorções e aumento do subsídio cruzado
Análises de Sensibilidade: Do Custo Regulado à Receita do Projeto
A aplicação do novo encargo setorial proposto pela MP 1.304, combinada ao teto da CDE, exige que gerentes apresentem análises de sensibilidade integradas aos modelos financeiros. Entre os parâmetros que devem ser simulados estão:
Variação do encargo entre R$ 10 e R$ 30/MWh;
Redução gradual da CDE em cenários de crescimento limitado;
Flutuações nos valores de TUST e TUSD para fontes incentivadas;
Exposição por faixas de potência e modalidade de contratação (mercado regulado ou ACL).
Essas análises devem estar ligadas a dashboards de decisão, com visualização clara do ponto de ruptura da viabilidade econômica de cada ativo.
Exemplo: Uma usina incentivada cuja TIR cai de 9,2% para 6,7% com a aplicação do encargo em R$ 25/MWh pode deixar de ser financiável por certos fundos de infraestrutura — esse alerta precisa estar claro para os decisores.
Estruturação de Planos Alternativos por Perfil de Ativo
Dada a incerteza sobre o texto final das MPs, é recomendável apresentar planos contingenciais por tipo de ativo, que permitam realocar esforços, renegociar contratos ou adaptar estratégias comerciais conforme o cenário que se materialize.
Perfil de Ativo
Plano Alternativo Sugerido
Térmica com CVU alto
Reposicionamento como backup ou despacho emergencial no mercado livre
PCH com incentivo
Reestruturação financeira com amortização do encargo via eficiência operacional
GD cooperativa
Avaliação de transição para geração compartilhada por assinatura
Eólica offshore (licenciamento)
Reprecificação e adiamento de PPA até definição final do modelo regulatório
Comercialização com isenção parcial
Precificação de produtos com cláusulas de ajuste tarifário/regulatório
Articulação Institucional e Contribuições Técnicas
Finalmente, os gerentes devem fornecer subsídios técnicos para que a empresa — direta ou indiretamente — participe do debate público e institucional. Isso inclui:
Elaboração de contribuições técnicas para audiências públicas e comissões mistas no Congresso;
Apoio à formulação de posições institucionais coordenadas via entidades como ABRAGEL, ABRACE, ABRAGET, ABRADEE, ABIOGÁS, ABSOLAR, entre outras;
Proposta de posicionamento setorial com base em evidências — como impacto tarifário, atratividade de novos projetos, segurança regulatória.
A ação institucional bem embasada, quando combinada com dados consistentes e cenários robustos, aumenta a legitimidade da empresa no debate e protege seu portfólio contra riscos de regressão normativa ou distorção setorial.
Conclusão: Reagir com Agilidade à Nova Engenharia do Setor
As Medidas Provisórias nº 1.300 e nº 1.304/2025 representam um ponto de virada na trajetória regulatória do setor elétrico brasileiro. Pela primeira vez em muitos anos, temos um movimento consistente em direção a um modelo baseado no mérito econômico, na disciplina fiscal e na eficiência sistêmica — rompendo com a lógica de contratação compulsória, subsídios indiscriminados e expansão orientada por decisões políticas regionais.
Mais do que mudanças pontuais, essas MPs inauguram uma nova engenharia regulatória, que exige das empresas agilidade para interpretar, reagir e se reposicionar estrategicamente. A lógica da contratação passa a obedecer a critérios de custo global. O financiamento do setor deixa de depender apenas da coletividade e passa a incorporar a responsabilidade dos próprios beneficiários. E o gás natural, que antes ocupava um papel estrutural, é reposicionado como fonte de flexibilidade e resposta rápida — exigindo novos modelos operacionais, comerciais e jurídicos.
Para os gestores técnicos e administrativos, essa transição impõe uma mudança de postura organizacional. Não basta monitorar o processo legislativo ou acompanhar publicações da ANEEL e da CCEE. É necessário atuar como ponte entre as áreas operacionais e os níveis estratégicos, traduzindo cenários regulatórios em simulações concretas, avaliando impactos sobre ativos e contratos, e estruturando alternativas de resposta para conselhos e comitês executivos.
A missão agora é transformar esse novo ambiente regulatório em ação concreta. Isso significa:
Mapear riscos regulatórios e financeiros por tipo de projeto e perfil de ativo;
Recalcular fluxos de caixa com os novos encargos e tetos setoriais;
Preparar relatórios executivos com planos de contingência baseados em cenários legislativos possíveis;
Apoiar a atuação institucional com dados técnicos robustos e alinhamento setorial;
Articular operação, regulação, jurídico e finanças em torno de uma agenda única: proteger e reposicionar a empresa na nova lógica do setor.
Empresas que conseguirem responder rapidamente às mudanças regulatórias estarão em posição de vantagem competitiva — seja na reestruturação de portfólios, na adaptação contratual ou na atração de novos investimentos. Já aquelas que esperarem por decisões definitivas sem preparar alternativas estarão mais expostas a riscos de obsolescência, judicialização ou perda de valor.
As MPs 1.300 e 1.304 não apenas reorganizam o setor elétrico. Elas testam a maturidade regulatória, a capacidade de resposta e a qualidade da governança das empresas que nele atuam. E é nesse teste que a liderança técnica e administrativa poderá — ou não — transformar incerteza em vantagem.
O armazenamento de energia desempenha um papel estratégico na transição para matrizes energéticas mais sustentáveis e resilientes. Entre as tecnologias emergentes, o armazenamento gravitacional com blocos de concreto tem se destacado como uma alternativa promissora aos sistemas eletroquímicos, como baterias de íons de lítio. Baseada em princípios físicos elementares, essa tecnologia propõe o uso de massa, altura e gravidade como elementos centrais para a acumulação e liberação de energia, oferecendo eficiência, longevidade e independência de materiais críticos.
O funcionamento da bateria gravitacional é relativamente simples. Em momentos de excesso de geração, como nos períodos de alta produção solar ou eólica, energia elétrica é utilizada para acionar guindastes ou elevadores motorizados que suspendem blocos de concreto de alta massa para alturas determinadas. Essa energia cinética é convertida em energia potencial gravitacional, armazenada pela posição elevada da massa. Quando há demanda por eletricidade, os blocos são descidos de forma controlada, movimentando motores regenerativos que convertem o movimento mecânico de volta em eletricidade. O ciclo é reversível e pode ser repetido milhares de vezes com perdas mínimas.
Diferentemente das baterias químicas, que sofrem degradação com o tempo e dependem de materiais como lítio, cobalto e níquel, o armazenamento gravitacional se apoia em materiais largamente disponíveis e recicláveis. Os principais componentes são concreto, aço e sistemas eletromecânicos. Além disso, a eficiência operacional desses sistemas tem se mostrado competitiva, com valores entre 75% e 90%, dependendo do projeto e da qualidade dos mecanismos de conversão.
Diversos projetos internacionais têm demonstrado a viabilidade técnica e econômica dessa abordagem. Um exemplo notável é a torre EVx desenvolvida pela empresa Energy Vault, que emprega blocos modulares de materiais compostos e opera com capacidade de armazenamento na faixa de 10 a 100 MWh. De acordo com o white paper da empresa, a torre possui eficiência superior a 80%, vida útil estimada em 35 anos e tempo de resposta inferior a dois segundos. Outra iniciativa relevante é a empresa escocesa Gravitricity, que desenvolve sistemas subterrâneos baseados em poços verticais, utilizando minas desativadas como infraestrutura de apoio. Seus estudos de viabilidade, financiados pelo governo britânico, apontam para eficiências superiores a 85% e mais de 25 mil ciclos operacionais.
No contexto brasileiro, o armazenamento gravitacional apresenta vantagens singulares. O país possui um parque hidrelétrico amplo, com diversas usinas em regiões montanhosas ou com infraestrutura vertical significativa. Isso abre a possibilidade de integração de sistemas gravitacionais com usinas hidrelétricas reversíveis, conhecidas como UHRs. Nessas usinas, dois reservatórios em diferentes altitudes são usados para armazenar energia por meio do bombeamento de água. Embora eficazes, as UHRs exigem grandes obras civis, licenciamento ambiental complexo e investimentos elevados.
A solução gravitacional com blocos pode atuar de forma complementar ou mesmo substitutiva em algumas situações, aproveitando estruturas já existentes, como torres de inspeção, casas de força elevadas ou encostas artificiais. Minas desativadas em estados como Minas Gerais, Goiás e Bahia também oferecem potencial de reaproveitamento. O uso dessas estruturas reduz significativamente o custo de implantação e o tempo de licenciamento, promovendo soluções locais de armazenamento que reforçam a estabilidade da rede e facilitam a integração de fontes intermitentes, como a solar e a eólica.
Outro fator positivo é a possibilidade de industrialização nacional da tecnologia. O Brasil possui ampla capacidade instalada na indústria da construção civil, empresas especializadas em estruturas metálicas, guindastes e engenharia mecânica. A fabricação dos blocos, o desenvolvimento de torres e o fornecimento de componentes de automação podem ser realizados com alto grau de conteúdo local, gerando empregos e estimulando cadeias produtivas nacionais. Como não há necessidade de insumos importados ou metais raros, a solução é menos vulnerável a flutuações cambiais e crises geopolíticas.
Do ponto de vista regulatório, a solução também apresenta vantagens. Sistemas de armazenamento mecânico não têm passivos ambientais associados a efluentes químicos ou risco de incêndios, o que facilita a obtenção de licenças. A modularidade permite que sejam instalados em escalas menores, próximas a centros de consumo ou em ambientes industriais com infraestrutura vertical, como silos, chaminés ou galpões.
Apesar de seu alto potencial, é importante ressaltar que a tecnologia ainda se encontra em fase de consolidação. Embora as primeiras torres estejam operacionais, a literatura acadêmica ainda é escassa. Buscas realizadas no Google Scholar indicam que poucos artigos foram publicados sobre o tema, sendo a maioria das referências provenientes de white papers industriais, relatórios técnicos e estudos de viabilidade financiados por órgãos governamentais ou empresas privadas. Portanto, é fundamental que instituições de pesquisa brasileiras passem a se debruçar sobre o tema, desenvolvendo modelos matemáticos, testes experimentais e análises de integração com o sistema elétrico nacional.
O estabelecimento de projetos-piloto em parceria com universidades, empresas de energia e fabricantes de equipamentos é uma etapa essencial para a validação da tecnologia no contexto nacional. Essa abordagem permitiria, por exemplo, comparar o desempenho do armazenamento gravitacional com outras alternativas, como baterias de segunda vida, sistemas hidrelétricos reversíveis de pequeno porte e bancos de baterias de lítio. Também seria possível avaliar o impacto regulatório, tarifário e logístico da adoção dessa tecnologia em regiões de baixa confiabilidade elétrica ou alta penetração de renováveis intermitentes.
Considerando o atual estágio da transição energética brasileira, caracterizada pela necessidade de armazenamento modular, baixo custo e alta durabilidade, o armazenamento gravitacional com blocos de concreto surge como uma solução particularmente adequada. Sua combinação de robustez, escalabilidade, neutralidade ambiental e potencial de nacionalização a coloca como uma tecnologia a ser monitorada de perto por formuladores de políticas públicas, agências reguladoras e empresas do setor elétrico.
À medida que novas instalações forem entrando em operação ao redor do mundo, é esperado que surjam mais dados sobre desempenho em campo, custos de manutenção e retorno sobre investimento. Esses dados serão valiosos para a tomada de decisão e para a promoção de políticas de incentivo. O Brasil, com seu perfil hidrelétrico, base industrial instalada e desafios logísticos regionais, está bem posicionado para liderar a implementação dessa tecnologia na América Latina, contribuindo para um sistema elétrico mais limpo, flexível e resiliente.
A explosão do uso de dados, da inteligência artificial e dos serviços em nuvem tem impulsionado a expansão global dos data centers. Esses centros de processamento deixaram de ser apenas infraestrutura de apoio — são hoje o coração computacional do mundo digital. No contexto do chamado computador-planeta, os data centers formam uma malha neural distribuída, interligando continentes, setores e bilhões de dispositivos. Eles processam, armazenam e movimentam informações em tempo real, sustentando desde plataformas de vídeo até sistemas críticos de energia e defesa.
O volume de dados gerados a cada segundo é tão gigantesco que nenhuma economia moderna pode funcionar sem essa espinha dorsal digital. Estima-se que até 2030, mais de 80% do tráfego da internet envolverá aplicações de inteligência artificial, edge computing e automação. Isso exige uma nova geração de data centers: mais eficientes, inteligentes, resilientes e integrados ao sistema energético.
Mas onde construir um data center? Como operá-lo de forma sustentável e econômica? Que tipo de infraestrutura é necessária para suportar cargas de alto desempenho com segurança e baixa emissão de carbono? Essas perguntas são centrais para empresas, governos e investidores. A resposta não está apenas nos custos de terreno ou conectividade de rede, mas também em fatores como clima, acesso a energia renovável, estabilidade regulatória, segurança geopolítica e capacidade de escalar em um mundo em constante mutação.
Este artigo apresenta uma visão estruturada sobre os critérios técnicos, econômicos e estratégicos para a tomada de decisão em projetos de data centers, explorando desde questões de refrigeração e arquitetura sustentável até conceitos avançados como a computação elástica orientada por energia renovável e o uso da inteligência artificial na alocação dinâmica de cargas.
Nosso objetivo é oferecer um panorama completo e acessível, com tabelas e resumos visuais, para que decisores possam compreender as múltiplas variáveis envolvidas na criação e operação de um data center conectado ao futuro — um nó essencial no computador-planeta.
O Papel dos Data Centers no Computador-Planeta
A metáfora do computador-planeta nos ajuda a compreender como a infraestrutura digital moderna opera como um sistema integrado, global e dinâmico. Não se trata mais de centros isolados processando dados localmente. Vivemos em um mundo em que os dados fluem em tempo real entre servidores interconectados espalhados por diferentes fusos horários, zonas climáticas e jurisdições políticas.
Nesse modelo, os data centers são os neurônios físicos dessa malha planetária. Cada um funciona como um nó que recebe, processa, armazena e redistribui informações. Juntos, formam a base material sobre a qual operam os algoritmos que tomam decisões sobre tráfego urbano, gestão energética, previsão de demanda, diagnósticos médicos e até recomendações de conteúdo em redes sociais.
O computador-planeta, portanto, é uma infraestrutura viva, adaptativa e sensível ao ambiente. Ele depende da estabilidade das redes de comunicação, da disponibilidade de energia elétrica e da confiabilidade jurídica dos territórios onde está fisicamente instalado. Um data center não é um espaço virtual: ele consome eletricidade, precisa de refrigeração e exige segurança física, digital e regulatória.
Essa visão transforma a maneira como pensamos a implantação e a operação de data centers. A localidade deixa de ser apenas um ponto no mapa e passa a ser um fator estratégico com implicações globais. A escolha entre instalar um centro de dados no Nordeste brasileiro, na Patagônia argentina ou no interior da Alemanha não é apenas uma questão de custo de energia ou do clima local — envolve geopolítica, soberania digital, incentivos econômicos e a capacidade de escalar conforme a demanda.
Além disso, essa malha global está se tornando cada vez mais inteligente. Com o avanço da computação elástica, cargas de trabalho como treinamento de modelos de IA, simulações científicas ou renderizações gráficas podem ser distribuídas dinamicamente de acordo com critérios como:
• Custo horário da energia;
• Emissão de carbono por kWh;
• Capacidade ociosa da infraestrutura;
• Disponibilidade de fontes renováveis;
• Condições climáticas locais.
Esse processo de alocação inteligente e autoadaptativa de cargas computacionais representa o futuro da operação eficiente de data centers. Ele permite que os dados “sigam o sol” ou “sigam o vento”, aproveitando ao máximo os períodos de geração renovável e evitando horários de pico de consumo da rede elétrica. Tudo isso exige uma camada de orquestração computacional baseada em inteligência artificial.
Em síntese, os data centers são a base física da inteligência digital global. Sua implantação e operação precisam considerar não apenas critérios técnicos e financeiros, mas também a inserção estratégica em um ecossistema maior — o do computador-planeta.
Critérios Técnicos e Estratégicos para Instalação de um Data Center
Implantar um data center envolve uma combinação complexa de fatores técnicos, econômicos e regulatórios. A escolha do local e o desenho da operação não podem ser guiados apenas por custo de terreno ou proximidade de grandes centros urbanos. É preciso integrar energia, clima, conectividade, regulação, geopolítica e estratégia digital em uma decisão coerente, robusta e de longo prazo.
A seguir, reunimos os oito critérios essenciais que orientam essa tomada de decisão:
Energia e Eficiência
O consumo energético é o principal custo operacional de um data center. Por isso, a escolha do local deve considerar:
A disponibilidade de energia elétrica em alta tensão;
O custo por megawatt-hora (MWh), incluindo acesso ao mercado livre e possibilidade de contratos de longo prazo (PPAs);
A infraestrutura de resiliência elétrica, como linhas redundantes, subestações dedicadas e sistemas de backup (UPS, geradores);
E a eficiência energética do projeto, expressa por indicadores como o PUE (Power Usage Effectiveness) e o CEE (Compute Energy Efficiency).
Locais com alta penetração de energia renovável, como o Nordeste brasileiro, podem oferecer grandes vantagens — desde que superem os desafios associados ao clima quente.
Clima e Refrigeração
A temperatura média local influencia diretamente o consumo energético com sistemas de refrigeração. Regiões frias permitem o uso de técnicas como free cooling, que aproveitam o ar externo para resfriar os equipamentos, reduzindo drasticamente o uso de compressores.
Além disso, a eficiência térmica dos prédios e a adoção de tecnologias como rear-door cooling, direct-to-chip e até immersion cooling podem reduzir o impacto climático do projeto. Em climas quentes, a escolha de locais em altitude elevada (como áreas do interior do Ceará) pode oferecer uma vantagem natural.
Localização Geográfica
A localização é estratégica não apenas pela infraestrutura existente, mas também pelo risco ambiental e geopolítico. Devem ser avaliados:
A proximidade de centros de consumo e rede de distribuição de dados;
A exposição a eventos climáticos extremos, como enchentes, secas ou tempestades;
A qualidade e redundância das conexões com backbones de fibra ótica, cabos submarinos e pontos de troca de tráfego (IXPs).
Regiões com forte conectividade e clima ameno são geralmente mais atrativas para projetos de hiperescala.
Aspectos Econômicos
A análise econômica envolve tanto os custos de implantação (CAPEX) quanto os custos de operação (OPEX). Itens como:
Custo do terreno, impostos e encargos locais;
Incentivos fiscais, subsídios à energia ou políticas públicas de fomento tecnológico;
Previsão de retorno do investimento (payback) e margem operacional.
Cidades que criam zonas especiais para data centers — como acontece na Patagônia argentina — conseguem atrair grandes investimentos mesmo em regiões remotas, desde que ofereçam energia barata e clima favorável.
Infraestrutura de Rede
A conectividade é a razão de ser de qualquer data center. Por isso, é essencial:
Ter acesso a múltiplos provedores de fibra (carrier-neutral);
Garantir latência baixa e redundância física dos enlaces;
Assegurar a escalabilidade da capacidade de rede, acompanhando o crescimento do tráfego digital.
A falta de rotas alternativas pode comprometer a disponibilidade e aumentar o risco de interrupções.
Regulação, ESG e Compliance
A operação de um data center exige conformidade com uma série de normas legais e ambientais.
É necessário garantir:
Licenciamento ambiental e urbano adequado ao porte do empreendimento;
Conformidade com leis de proteção de dados (LGPD, GDPR, HIPAA etc.);
Métricas e metas de sustentabilidade, como CUE (Carbon Usage Effectiveness), WUE (Water Usage Effectiveness) e % de uso de energia renovável.
Empresas globais, cada vez mais pressionadas por seus investidores e clientes, exigem que seus fornecedores digitais estejam alinhados com boas práticas ESG.
Escalabilidade e Estratégia Digital
Um data center não deve ser projetado apenas para a carga atual, mas para os próximos 10 ou 15 anos. Isso significa pensar em:
Crescimento modular da infraestrutura, com espaço físico e potência elétrica disponíveis;
Flexibilidade para suportar cargas de IA, edge computing, metaverso e high performance computing (HPC);
Integração com a estratégia digital da empresa ou do país — incluindo planos de soberania digital e inovação.
Geopolítica e Segurança Jurídica
Por fim, uma decisão de infraestrutura crítica como essa não pode ignorar o cenário político. Deve-se avaliar:
O grau de estabilidade institucional e previsibilidade regulatória;
A segurança jurídica para contratos de longo prazo e operações cross-border;
Riscos geopolíticos como sanções, nacionalizações ou instabilidade cambial;
O nível de soberania digital e controle local sobre dados sensíveis.
Critério
Parâmetros-Chave
Energia e Eficiência
Disponibilidade de energia, custo do MWh, PUE, CEE, redundância elétrica
Clima e Refrigeração
Temperatura média, potencial de free cooling, tecnologias de refrigeração, altitude
Localização Geográfica
Proximidade de mercado, risco climático, conectividade internacional
Aspectos Econômicos
Custo do terreno, impostos, subsídios, CAPEX/OPEX, payback
Infraestrutura de Rede
Carrier-neutral, latência, redundância física da fibra
Regulação, ESG e Compliance
Licenciamento, LGPD/GDPR, metas ambientais (CUE/WUE), energia renovável
Escalabilidade e Estratégia Digital
Modularidade, suporte a IA/Edge/HPC, alinhamento estratégico
Geopolítica e Segurança Jurídica
Estabilidade institucional, contratos, riscos geopolíticos, soberania digital
Refrigeração: O Desafio Oculto
Se energia é o maior custo de operação de um data center, a refrigeração é, muitas vezes, a principal responsável por esse consumo. Estima-se que entre 30% e 40% da energia elétrica de um data center típico seja usada exclusivamente para resfriar os equipamentos — e esse número pode ser ainda maior em regiões de clima quente, úmido ou com alta densidade computacional.
Esse desafio é, portanto, tão técnico quanto estratégico. A refrigeração influencia diretamente o consumo de energia (e, portanto, o custo operacional), as emissões de carbono, a necessidade de infraestrutura auxiliar (como sistemas de backup e linhas redundantes) e até a escolha do local do data center. O que parece um aspecto puramente de engenharia se revela, na prática, uma das decisões mais impactantes do ponto de vista econômico e ambiental.
A escolha da tecnologia de refrigeração ideal depende de três variáveis principais:
1. O clima da região (temperatura e umidade médias)
2. A densidade térmica dos racks (quantidade de calor gerado por m² ou por rack)
3. A disponibilidade e o custo de recursos como água, energia elétrica e espaço físico
Abaixo, exploramos as principais tecnologias atualmente utilizadas e suas implicações operacionais:
CRAC e In-Row Cooling (Ar Condicionado Tradicional)
A tecnologia mais tradicional ainda usada em muitos data centers é o CRAC (Computer Room Air Conditioning). Esses sistemas funcionam como grandes aparelhos de ar condicionado dedicados ao ambiente técnico, normalmente com circulação de ar sob pisos elevados.
O modelo in-row, por sua vez, posiciona as unidades refrigerantes entre os racks, oferecendo maior proximidade às fontes de calor. Essa abordagem melhora a eficiência térmica ao reduzir o desperdício de ar frio e aumentar o controle local da temperatura.
Vantagens:
• Baixo custo de implantação
• Familiaridade técnica
• Funciona em ambientes moderadamente densos
Desvantagens:
• Menor eficiência energética
• Dificuldade de escalar para cargas densas de IA ou HPC
• Dependência de grandes volumes de ar e espaço físico
Rear Door e Direct-to-Chip Cooling
Essas tecnologias se concentram em retirar o calor diretamente da fonte, antes que ele se espalhe no ambiente. No modelo rear-door, trocadores de calor são instalados na parte traseira dos racks, onde o ar quente é dissipado de forma imediata por meio de circuitos com água ou outro líquido refrigerante.
Já no modelo direct-to-chip, o fluido refrigerante é canalizado diretamente até os dissipadores de calor dos processadores, oferecendo altíssima eficiência em ambientes de alta densidade computacional.
Vantagens:
• Alta eficiência térmica
• Redução do consumo energético com refrigeração
• Ideal para cargas de IA, renderização e HPC
Desvantagens:
• Requer rede hidráulica sofisticada
• Maior custo e complexidade de manutenção
• Pode exigir projeto arquitetônico específico
Immersion Cooling (Imersão Total)
A refrigeração por imersão consiste em submergir os componentes eletrônicos em fluidos dielétricos, que não conduzem eletricidade, mas absorvem calor com extrema eficiência. Essa técnica permite que os servidores operem em contato direto com o refrigerante, eliminando ventiladores, dutos de ar e parte da infraestrutura térmica convencional.
Vantagens:
• Eficiência térmica incomparável
• Redução drástica de ruído, poeira e vibração
• Ideal para operações de alta densidade com footprint reduzido
Desvantagens:
• Custo inicial elevado
• Requer arquitetura e manutenção especializadas
• Pouco padronizada no mercado (ainda)
Free Cooling (Direto e Indireto)
O free cooling utiliza o próprio ar externo como meio de resfriamento — uma solução altamente eficiente em regiões com clima ameno. No modelo direto, o ar externo é filtrado e introduzido diretamente nas salas técnicas. Já no modelo indireto, ele apenas resfria um fluido que circula internamente, sem entrar em contato com os equipamentos.
Vantagens:
• Economia de energia substancial
• Baixa pegada de carbono
• Redução do uso de compressores e gases refrigerantes
Desvantagens:
• Ineficiente em climas quentes ou úmidos
• Pode exigir grandes volumes de ar e sistemas de filtragem complexos
• Sensível a variações climáticas
Resfriamento Evaporativo (Adiabático)
No sistema evaporativo, a refrigeração ocorre com a evaporação controlada da água, resfriando o ar antes de sua entrada nos equipamentos. É especialmente eficiente em climas secos, onde a umidade relativa do ar é baixa.
Vantagens:
• Alta eficiência energética
• Custo operacional reduzido
• Tecnologias maduras no setor industrial
Desvantagens:
• Consumo elevado de água
• Menor eficiência em ambientes úmidos
• Pode exigir sistemas auxiliares de tratamento de água
Comparativo Resumido
Tecnologia
Eficiência
Clima Ideal
Custo Inicial
Consumo de Água
Densidade Suportada
CRAC / In-Row
Média
Moderado
Baixo
Baixo
Média
Rear Door / Direct-to-Chip
Alta
Qualquer
Médio-Alto
Médio
Alta
Immersion Cooling
Muito Alta
Controlado
Alto
Baixo
Muito Alta
Free Cooling
Alta
Frio/Seco
Médio
Baixo
Média
Evaporativo
Alta
Seco
Médio
Alto
Média
A refrigeração deixou de ser um detalhe técnico. Hoje, ela está no centro das decisões de viabilidade econômica, impacto ambiental e escalabilidade dos data centers. Escolher a tecnologia certa — de acordo com o clima local, os requisitos computacionais e a estratégia energética — é uma das decisões mais importantes de toda a jornada do data center.
A Curva do Pato e o Roteamento Inteligente de Cargas
A chamada curva do pato (duck curve, em inglês) é um dos conceitos mais importantes da transição energética — e um dos menos compreendidos fora do setor elétrico. Ela representa, de forma gráfica, a diferença entre a geração de energia solar ao longo do dia e o consumo de eletricidade pela população.
Durante o meio-dia, quando o sol está em seu pico, a geração solar é muito alta. Em algumas regiões, chega a exceder a demanda real da rede. À medida que o sol se põe e os painéis solares deixam de gerar energia, o consumo residencial e comercial aumenta rapidamente, principalmente por conta de iluminação, ar condicionado, eletrodomésticos e mobilidade elétrica. Isso obriga o sistema elétrico a “ligar” rapidamente outras fontes, como usinas a gás ou hidrelétricas, para atender a esse pico.
A curva formada por esse comportamento diário lembra o perfil de um pato: barriga funda ao meio-dia (excesso solar) e pescoço alto no fim da tarde (pico de consumo). Daí o nome.
O gráfico apresentado mostra três curvas principais ao longo das 24 horas do dia:
Demanda Total (cinza tracejado): representa o consumo geral de eletricidade na rede.
Geração Solar (amarelo): mostra a produção de energia fotovoltaica ao longo do dia, com pico por volta do meio-dia.
Demanda Líquida (verde): é a diferença entre a demanda total e a geração solar, ou seja:
Demanda líquida = Demanda total – Geração solar
Essa curva verde é chamada de Curva do Pato devido à sua forma característica — barriga funda ao meio-dia e pico no início da noite.
O que significa a parte negativa da curva?
Observe que por volta das 9h até cerca de 14h, a curva verde desce bastante. Em alguns pontos, ela pode até assumir valores negativos. Isso acontece quando a geração solar excede a demanda total naquele momento.
Em termos simples:
Há mais energia sendo gerada do que sendo consumida.
O sistema entra em excesso de geração.
O operador da rede precisa intervir — reduzindo a geração de outras fontes (hidrelétrica, gás etc.) ou até desligando parte da geração solar (curtailment).
Esse cenário já é uma realidade em países como Alemanha, Chile e até mesmo no Brasil, especialmente no Nordeste, onde a geração solar e eólica tem crescido muito rapidamente.
O pico da noite
À medida que o sol se põe, a geração solar cai rapidamente (curva amarela), mas a demanda por eletricidade aumenta — especialmente entre 17h e 21h, quando as pessoas chegam em casa, ligam luzes, TVs, ar-condicionado e carregam seus dispositivos.
Esse aumento abrupto na demanda líquida forma o “pescoço” da curva do pato. Para atendê-lo, o sistema precisa acionar rapidamente usinas térmicas, que são mais caras e poluentes.
O papel dos data centers nesse cenário
O gráfico da Curva do Pato não mostra apenas dados — ele revela um desafio e uma oportunidade:
Quem souber alinhar consumo computacional com a dinâmica da geração renovável, terá custos mais baixos, menor pegada de carbono e maior resiliência no longo prazo.
Data centers são consumidores intensivos e estáveis de energia. Mas justamente por sua flexibilidade computacional, eles têm potencial para atuar como aliados do sistema elétrico, ajustando suas cargas conforme a disponibilidade e o custo da energia.
Três oportunidades emergem dessa lógica:
Consumir mais energia durante o “fundo da curva”: Ao programar cargas pesadas (como treinamento de IA, backups, simulações) para os horários de maior geração solar, os data centers ajudam a absorver o excedente da rede, com energia mais barata e limpa.
Evitar operar no pico da noite: Ao reduzir sua demanda durante os momentos de maior tensão da rede (como no início da noite), os operadores evitam sobrecarregar o sistema e se protegem contra tarifas elevadas ou interrupções.
Integrar armazenamento e contratos flexíveis: Combinando sistemas de baterias (BESS) e acordos flexíveis de fornecimento, os data centers podem armazenar energia barata durante o dia e usá-la à noite, evitando picos e estabilizando seu perfil de consumo.
O papel da Inteligência Artificial
Para que essa operação seja possível em grande escala, entra em cena a inteligência artificial (IA). Ela é essencial para:
Prever a disponibilidade e o preço da energia com base em variáveis meteorológicas, demanda da rede e contratos vigentes;
Alocar dinamicamente as cargas computacionais para locais e horários mais vantajosos, respeitando critérios técnicos e operacionais;
Negociar em tempo real os contratos de fornecimento, utilizando modelos que otimizam o custo e a pegada de carbono do consumo.
Essa lógica abre caminho para um novo paradigma: o data center como consumidor inteligente, flexível e sustentável, que não apenas consome energia, mas interage ativamente com a rede elétrica, como parte da solução para seus desafios.
MW x MWh: Capacidade vs. Consumo
No mundo da energia, duas unidades fundamentais ajudam a entender o comportamento dos data centers: megawatts (MW) e megawatt-hora (MWh). Apesar de frequentemente confundidas, elas dizem respeito a aspectos diferentes — e complementares — da operação energética. Dominar essa diferença é essencial para projetar e operar centros de dados com eficiência técnica, econômica e ambiental.
Os megawatts (MW) representam a potência máxima que o data center pode consumir em um determinado instante. É como a vazão de um cano: quanto maior o diâmetro, maior o volume que passa por segundo. No contexto elétrico, esse valor precisa estar disponível o tempo todo, mesmo que nem sempre seja utilizado, pois garante que o centro terá capacidade para suportar momentos de pico — como o disparo simultâneo de milhares de processos de inteligência artificial, backups noturnos em massa ou o processamento de simulações em tempo real. A falta de potência contratada pode levar a quedas, instabilidade ou até danos operacionais. Por isso, o planejamento da infraestrutura elétrica exige que os MW estejam adequadamente provisionados, com margem de segurança.
Já os megawatt-hora (MWh) indicam o volume total de energia consumido ao longo de um período. É a variável que aparece na fatura de energia: o quanto efetivamente foi utilizado ao longo das horas, dias ou meses. Se os MW são o “teto” de capacidade, os MWh são o que realmente se usa dentro desse teto. Controlar os MWh com inteligência é o que permite economizar, reduzir emissões e até participar ativamente da estabilização do sistema elétrico.
Um exemplo ajuda a visualizar essa diferença. Imagine um data center com capacidade contratada de 10 MW. Isso significa que ele pode consumir até esse limite em qualquer momento, garantindo potência para lidar com picos de carga. No entanto, se sua média de consumo ao longo do dia for de 6 MW, isso equivale a 144 MWh por dia (6 MW × 24 horas). Agora imagine que esse centro tenha flexibilidade para realocar parte das cargas computacionais — como tarefas não urgentes ou treinamentos de modelos — para o início da tarde, quando há geração solar abundante e tarifas mais baixas. Ao reduzir o consumo durante o pico da noite (quando o custo por MWh aumenta), ele não altera a potência contratada, mas reduz o custo e a pegada de carbono do seu consumo diário.
Essa inteligência operacional depende de planejamento, mas também de automação. Algoritmos que monitoram o custo horário da energia, o perfil de demanda da rede e a criticidade das cargas computacionais são hoje parte integrante da operação moderna dos data centers.
O equilíbrio entre MW e MWh, portanto, está no centro do planejamento energético. A potência contratada garante a robustez da operação, enquanto o consumo ao longo do tempo define sua eficiência econômica e seu impacto ambiental. Operar com inteligência é justamente saber dimensionar bem os dois — e, mais ainda, usá-los a favor da estratégia do negócio, da sustentabilidade e da estabilidade da rede elétrica.
Computação Elástica e o Futuro da Autonomia Digital
No modelo tradicional, data centers eram vistos como instalações fixas, com localização rígida, carga constante e consumo previsível. Essa abordagem está rapidamente se tornando obsoleta diante de dois movimentos simultâneos: o crescimento explosivo da demanda computacional — impulsionada por inteligência artificial, automação e big data — e a transição para uma matriz energética mais descentralizada, intermitente e renovável.
É nesse novo contexto que surge a computação elástica orientada por energia renovável. Data centers deixam de ser centros isolados e passam a atuar como nós inteligentes de uma rede global, capazes de realocar suas cargas computacionais com base em critérios energéticos, climáticos, regulatórios e estratégicos.
Essa nova lógica permite, por exemplo, que cargas mais pesadas — como o treinamento de modelos de IA ou a execução de simulações — sejam transferidas para regiões onde há excesso de energia solar durante o dia ou ventos fortes à noite, aproveitando ao máximo a geração renovável e reduzindo custos operacionais. Não se trata apenas de economia: trata-se de harmonizar o consumo digital com o ritmo da natureza.
Essa abordagem é chamada de “seguir o sol” (follow the sun) ou “seguir o vento” (follow the wind). A cada momento do dia, diferentes regiões do planeta oferecem condições mais favoráveis para a execução de tarefas computacionais — seja por preço da energia, temperatura ambiente, capacidade ociosa ou até segurança jurídica. Ao se tornarem responsivos a essas variáveis, os data centers evoluem de consumidores passivos para agentes dinâmicos da inteligência planetária.
Com isso, abre-se um novo horizonte:
A orquestração planetária de workloads, onde os dados são processados nos locais mais eficientes, seguros e sustentáveis;
A integração profunda entre energia e algoritmos, em que a computação se adapta à dinâmica do sistema elétrico, não o contrário;
E o uso do planejamento de infraestrutura digital como ferramenta de soberania, onde países e regiões buscam garantir não apenas conectividade, mas também controle, autonomia e relevância no ecossistema global de dados.
Neste cenário, os data centers do futuro serão nômades em lógica, mas resilientes em estrutura. Serão flexíveis o suficiente para se adaptar às flutuações energéticas e computacionais, mas firmemente ancorados em critérios de eficiência, segurança e governança.
Não é exagero dizer que essa transformação define os contornos da próxima década. A forma como os dados serão processados — quando, onde e com que energia — impactará não apenas o custo das operações, mas também a competitividade tecnológica, a estabilidade energética e a soberania informacional dos países. É a infraestrutura invisível moldando o destino visível das sociedades conectadas.
Conclusão
A infraestrutura digital global está passando por uma transformação silenciosa, porém profunda. O que antes era apenas uma rede de servidores funcionando em prédios técnicos se tornou uma malha neural planetária — um computador-planeta, interligando bilhões de dispositivos, decisões e dados em tempo real. Nesse novo ecossistema, os data centers são os órgãos vitais dessa inteligência distribuída, responsáveis por processar, armazenar e direcionar os fluxos que movem a economia digital.
Investir em um data center, portanto, não é mais apenas uma questão técnica ou financeira. É uma decisão estratégica, energética, ambiental e geopolítica. Envolve avaliar com precisão onde estão as melhores condições de infraestrutura, conectividade e energia; quais as tecnologias de refrigeração mais eficientes para o clima local; que tipos de contratos de fornecimento elétrico oferecem flexibilidade e segurança; e como se preparar para um mundo onde o consumo computacional será dinâmico, escalável e cada vez mais interligado à variabilidade da geração renovável.
Com a adoção de computação elástica, orquestração inteligente de cargas e uso preditivo de dados energéticos, os data centers podem deixar de ser vilões do consumo e se tornarem aliados da transição energética. Ao consumir nos momentos certos, nos lugares certos, com as fontes certas, eles não apenas reduzem custos, mas ajudam a estabilizar sistemas elétricos e a mitigar o desperdício de energia limpa.
Mais do que isso: os data centers podem — e devem — ser tratados como ativos de soberania digital, fundamentais para a autonomia de países e regiões na era da inteligência artificial e da hiperconectividade. Ao planejar sua localização, capacidade, resiliência e integração energética, governos e empresas definem não apenas o desempenho de suas operações, mas também seu grau de dependência externa, sua segurança informacional e sua capacidade de competir num mundo cada vez mais orientado por dados.
Em resumo, o futuro dos data centers não está apenas nos cabos, nos chips ou nos algoritmos. Está na capacidade de pensar infraestrutura como estratégia. E de transformar consumo computacional em poder distribuído.
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